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Juristas criticam 'autoperdão' de irregularidades eleitorais de partidos com PEC da Anistia

A proposta prevê a remissão de sanções às legendas que não seguiram as regras das cotas de gênero e raça nas eleições de 2022

Escrito por Ingrid Campos , ingrid.campos@svm.com.br
Câmara dos Deputados, PEC da Anistia, cota de gênero, eleições
Legenda: Esse tipo de anistia vem ocorrendo com frequência nos últimos anos, a exemplo das minirreformas eleitorais que passaram pelo Congresso no ano de véspera das eleições.
Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados

Está prevista para esta terça-feira (16) a votação da chamada “PEC da Anistia” na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. Apesar da forte adesão no Congresso – agregando base e oposição ao governo petista –, a proposta de emenda constitucional desperta a antipatia de juristas.

O texto prevê a remissão de sanções aos partidos que não seguiram as regras das cotas de gênero e raça nas eleições de 2022. 

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Esse tipo de anistia vem ocorrendo com frequência nos últimos anos, a exemplo das minirreformas eleitorais que passaram pelo Congresso no ano de véspera das eleições. Aliado a isso, para especialistas em direito eleitoral, a iniciativa atual pode abrir margem para o enfraquecimento de dispositivos de participação política e um favorecimento financeiro desmedido aos partidos.

Juristas reprovam a PEC da Anistia

A iniciativa é repudiada por juristas e organizações da sociedade civil. Na última semana, o Movimento Voto Consciente divulgou uma carta aberta contra a PEC da Anistia, assinada por diversos movimentos. 

Entre eles, o Instituto Brasileiro de Direito Parlamentar (Parla), o Grupo Ágora da Universidade Federal do Ceará (UFC) e a Associação Brasileira de Mulheres de Carreiras Jurídicas (ABMCJ).

"A proposta em questão coloca em jogo milhões de reais de dinheiro público que foram usados indevidamente por partidos políticos, quase metade dos quais não destinaram os valores proporcionais para candidaturas de mulheres e pessoas negras nas eleições de 2022", lembra o Voto Consciente.

É, também, o que diz o presidente da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Ceará (OAB-CE), Fernandes Neto. Ele observa que os congressistas elaboram uma espécie de "autoperdão" enquanto o País vive um momento de "muita dificuldade".

“Já há um acúmulo muito grande dos valores públicos para o pagamento de despesas eleitorais, mesmo assim os partidos não cumpriram suas obrigações legais para o pagamento desse dinheiro e, agora, se ‘autoanistiam’”, diz.

Em 2022, o Fundo Eleitoral e o Fundo Partidário somaram R$ 6 bilhões, usados para reforçar as atividades internas das legendas e as campanhas dos candidatos. A lei diz que 30% desse valor deve ser voltado para a promoção da participação feminina na vida pública.

Para ele, “à medida que as conquistas democráticas são inseridas na sociedade e as penalidades decorrentes do descumprimento dessas conquistas são isentadas, estimula-se cada vez mais a prática do ilícito”. 

Por sua vez, a professora de Direito Eleitoral da UFC Raquel Machado aponta, ainda, que a PEC mostra um descomprometimento dos dirigentes partidários com os dispositivos de integração política.

“A PEC representa um retrocesso nos valores da sociedade. [...] Revela um desprezo pela jurisprudência, pelo que o tribunal que é responsável pela interpretação da Constituição já disse”, afirma.

Além disso, acredita que a medida evidencia um cenário de constante vigilância pela manutenção dos direitos políticos femininos “porque mostra que elas têm que lutar muito para conseguir alguma coisa”. 

Entenda a discussão

No ano passado, ainda em abril, o Legislativo Nacional promulgou uma emenda que consolidou a aplicação de percentuais mínimos de recursos do fundo partidário nas campanhas de mulheres e em medidas para ampliar a participação feminina na política.

A legislação já previa essa obrigação desde 2018. Naquele ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu a proporcionalidade de acordo com o gênero na distribuição do financiamento de campanhas eleitorais.

Mas o texto parlamentar trazia outra previsão: os partidos que não destinaram os valores mínimos para as cotas de sexo e raça em eleições ocorridas antes da promulgação, em 5 de abril de 2022, seriam anistiados. Ou seja, não sofreriam sanções como devolução de valores, multa ou suspensão do Fundo Partidário, e poderiam usar os valores nas eleições subsequentes.

Agora, a PEC da Anistia quer ampliar esse período de remissão por alguns meses, até abarcar o pleito do ano passado. Além disso, permite a arrecadação de recursos de pessoas jurídicas para quitar dívidas com fornecedores contraídas ou assumidas até agosto de 2015. 

Esta data marca o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade 4650, que trata sobre o financiamento de campanhas por empresas privadas. 

À época, o STF acatou a tese da OAB, autora da ação, e derrubou o mecanismo, que deixou de valer já na eleição seguinte. A decisão buscou impedir, entre outros problemas, a normalização do poder econômico como ponto central para campanhas vitoriosas e a inviabilização de investidas de candidatos menos favorecidos financeiramente.

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