Covid já matou 2,3 mil pessoas a mais que AVC, infarto e doenças cardíacas em 2021 no Ceará

O número supera em 94,62% os óbitos relacionados às doenças consideradas causas históricas comuns de morte no Estado

Escrito por Redação ,
Enterro no cemitério do Bom Jardim
Legenda: O vírus Sars-Cov-2 levou 4.745 pessoas a óbito somente neste ano no Estado
Foto: Thiago Gadelha

A Covid-19 já matou 2,3 mil pessoas a mais do que os acidentes vasculares cerebrais (AVC), os infartos e as doenças cardíacas em 2021 no Ceará. O vírus Sars-Cov-2 levou 4.745 pessoas a óbito somente neste ano no Estado, 94,62% a mais que outras causas históricas comuns de morte no Estado. Os dados são do portal da transparência do Registro Civil.

O levantamento baseia-se nas estatísticas de Declarações de Óbito registradas nos Cartórios das cinco regiões do País, sendo considerada apenas uma única causa de falecimento para cada documento. Segundo os dados, as pessoas mais afetadas com a letalidade do vírus são os idosos do sexo masculino de 70 a 79 anos, contabilizando 618 mortes.

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No caso das doenças cardiovasculares, a faixa etária soma 306 mortes. Já entre as mulheres, a maior incidência da Covid-19 também está entre os 70 a 79 anos, com 540 mortes. Esse grupo etário soma 247 óbitos em decorrência de AVCs, infartos e demais doenças cardiovasculares.

Doença altamente transmissível

De acordo com a médica clínica Taís Matos, especialista em Saúde da Família pela Universidade Federal do Ceará (UFC), a diferença entre os óbitos ocorre devido à alta transmissibilidade do coronavírus e, consequentemente, ao aumento do número de casos nesta segunda onda da doença no Estado.

Ela é uma doença altamente transmissível, o que justifica a contaminação tão rápida e exorbitante de casos. As pessoas acabam pensando que o uso de máscaras e de álcool em gel por si só é suficiente, mas muitas vezes somente isso não é. Por esse motivo há a necessidade do isolamento social”
Taís Matos
Médica clínica

A médica relata ainda que as doenças cardiovasculares são grandes causadoras de mortes no mundo todo há anos.

“Isso torna-se ainda mais preocupante se o paciente precisar de um leito de UTI, visto que ele provavelmente não vai conseguir em razão da alta taxa de ocupação desses locais por pessoas contaminadas com Covid-19. É triste, mas é uma realidade cruel”.

Situação no Ceará

Até esta quarta-feira (8), o Ceará contabilizou 1.115 internações por doenças cardiovasculares em 2021. Os dados do Ministério da Saúde mostram ainda que no ano passado esse número foi de 15.967, com 6.580 internações ocasionadas apenas em decorrência de acidentes vasculares cerebrais e outras 6.234 devido a insuficiências cardíacas, transtornos de condução e arritmias.

De acordo com o IntegraSUS - portal de transparência do Governo do Estado sobre a área da saúde -, a maior taxa de ocupação de leitos registrada neste ano foi no Hospital de Messejana Dr. Carlos Alberto Studart Gomes, com 88,26% em janeiro. Logo atrás, no mesmo mês, estão o Hospital Geral de Fortaleza (88,16%) e o Hospital Geral Dr. César Cals (84,71%).

Consequência indireta

Um dos fatores que tem agravado toda essa situação pandêmica, conforme pontua a especialista, é o forte negacionismo em relação ao vírus.

Eu tenho dez anos atuando na atenção básica como médica e nunca vivenciei um número tão alto de mortos em um período tão curto de tempo. Isso é muito difícil para um profissional de saúde”
Taís Matos
Médica clínica

Para Taís, o risco de letalidade é ainda maior na população em vulnerabilidade social. “Quando você faz um recorte, você analisa que a população com menos renda é a que está sendo mais afetada nessa questão, porque eles não têm os recursos financeiros para tomar todos os cuidados e também não têm como fazer o distanciamento adequado”.

A médica explica, além disso, que o coronavírus pode ocasionar outras doenças, como a trombose (formação de coágulos sanguíneos nas veias do corpo), sendo comum que a evolução desses trombos cardiovasculares ocasionem infartos e AVCs. Essas situações embora não sejam contabilizadas nos dados de óbitos do vírus, segundo a médica, é uma consequência indireta da Covid-19.

Adeus inesperado

Antonio Bandeira Bezerra de 61 anos estava caminhando quando passou mal e desmaiou. A filha, a empresária Nayá Perdigão, estava trabalhando quando ligaram avisando que seu pai havia dado entrada na emergência do hospital. Imediatamente ela se dirigiu ao local.

Cheguei lá no exato momento em que a ambulância chegou. Eu fui a última pessoa que meu pai viu"
Nayá Perdigão
Empresária

Segundo a empresária, ele descobrira recentemente que tinha arritmia cardíaca, mas que a dor constante que sentia no peito, segundo o médico, era devido a uma hérnia de disco na coluna, e que ele precisava perder peso. "Ele perdeu 10kg caminhando. Era isso que ele estava fazendo quando morreu. Foi tudo uma surpresa muita grande e dolorosa", explicou.

O pai de Nayá faleceu no dia 25 de março, a causa foi infarto fulminante. "Fizeram de tudo mas ele não resistiu", conclui.

A dor da perda

Uma das vidas que infelizmente entrou para essa triste estatística de óbitos por Covid-19 foi a mãe de Márcio Elandi. Às 17h43 deste sábado (3), Helena Campos de 76 anos, deu seu último suspiro no Hospital Leonardo da Vinci.

helena
Legenda: Helena e a família, em seu aniversário.
Foto: Arquivo pessoal

"Eu estou com um pouquinho de febre", avisou a idosa ao filho quando começou a sentir os primeiros sintomas da doença. Embora Márcio tenha insistido para que ela fosse imediatamente ao posto de saúde, ela se manteve descrente, afirmando que não podia ser coronavírus.

Com a piora dos sintomas após sete dias, ela procurou ajuda médica. "Ela não aguentou mais e pediu para a minha irmã leva-la para a UPA (Unidade de Pronto Atendimento) da Pajuçara. Lá fizeram o teste que deu positivo para coronavírus. Deram medicação, oxigênio, ela apresentou melhora e liberaram ela para casa", explica.

Em menos de 24h, Helena apresentou piora e teve que retornar à UPA. Em seguida foi encaminhada para a entubação no Hospital Leonardo da Vinci. Diariamente os médicos ligavam para Márcio, para explicar como estava sua mãe. As ligações oscilavam em "ela está melhor" ou "hoje ela não está bem".

Na sexta-feira o médico ligou dizendo que ela teve piora, que mesmo com a medicação ela não estava ficando boa e que nós devíamos nos preparar [para o falecimento"
Márcio Elandi
Vendedor varejista

No outro dia, de caixão fechado, Helena foi enterrada. 

 

 

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