Caso Jamile: TJCE vai decidir se advogado responderá por feminicídio

Após segundo parecer do Ministério Público, ontem, o juiz da 15ª Vara Criminal decidiu pelo conflito negativo de competência e determinou o envio do caso para a 2ª Instância do Poder Judiciário, que definirá o rumo do processo

Escrito por Emanoela Campelo de Melo / Emerson Rodrigues , segurança@svm.com.br
Legenda: Jamile foi atingida com um tiro no peito dentro do closet do apartamento dela
Foto: Thiago Gadelha

Caberá ao Tribunal de Justiça decidir se o advogado Aldemir Pessoa Júnior, indiciado pela morte da empresária cearense Jamile de Oliveira Correia, deve responder ao processo pelo crime de feminicídio. Ontem, o juiz da 15ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza tomou decisão diferente do magistrado da 4ª Vara do Júri, que havia declarado não haver indícios suficientes para comprovar que o fato se tratou de um crime de homicídio. A discordância só pode ser resolvida pela 2ª Instância do Poder Judiciário estadual.

O juiz Fabrício Vasconcelos Mazza remeteu os autos ao Tribunal de Justiça Estadual ao declarar incompetência absoluta da 15ª Vara e suscitar o devido conflito negativo de competência. Antes de chegar à 15ª Vara, o caso havia sido distribuído para a 4ª Vara do Júri da Comarca de Fortaleza, quando a Polícia Civil do Ceará concluiu o inquérito e indiciou o advogado e então namorado de Jamile, pela morte.

Representando a família da empresária, o advogado Flávio Jacinto, disse que a decisão é sensata e, a partir dela, se espera que seja feita a verdadeira Justiça. "A família vê que se está corrigindo um erro da primeira decisão. Eles estão esperançosos e acreditando que ele deve ser julgado como autor do crime de feminicídio", declarou Jacinto.

Desde a morte de Jamile, em agosto do ano passado, Aldemir alega que o fato se tratou de um suicídio. O advogado passou à posição de suspeito a partir do momento que a Polícia Civil tomou conhecimento do caso. Com a conclusão da investigação, amparados por laudos periciais e testemunhos, os delegados Socorro Portela e Felipe Porto indiciaram Aldemir Pessoa Júnior por feminicídio, fraude processual e lesão corporal.

Divergências

No início do último mês de abril, o Ministério Público do Ceará (MPCE) se posicionou pela primeira vez sobre o caso. Os promotores Oscar Stefano Fioravanti Junior e Márcia Lopes Pereira consideraram não poder denunciar Aldemir por feminicídio, porque "tais elementos, em síntese, em que pese os valorosos esforços da autoridade policial, não são minimamente suficientes para o oferecimento de denúncia por crime doloso contra vida", disseram.

O juiz Edson Feitosa dos Santos Filho, da 4ª Vara do Júri da Comarca de Fortaleza, concordou com o parecer do órgão acusatório e declinou da competência para uma vara criminal por considerar a existência dos crimes de porte ilegal de arma de fogo, fraude processual e lesão corporal.

Quando o processo foi redistribuído, a família de Jamile deu entrada em petição pedindo que a Justiça reconsiderasse e tratasse o caso como um feminicídio. "Não se espera que a morte de Jamile de Oliveira Correia caia nos dados de casos sem resolução", destacou o advogado Flávio Jacinto no documento.

Na última sexta-feira (29), o caso passou por uma reviravolta a partir de um novo parecer de outros promotores que atuam na 15ª Vara. Grecianny Carvalho Cordeiro e Marcelo Gomes Pires Maia, da 94ª Promotoria de Justiça de Fortaleza, discordaram da opinião anterior e se posicionaram pelo conflito negativo de competência. No novo parecer foi dada razão à conclusão do inquérito "reconhecendo, assim como fez a autoridade policial, que o caso é mesmo de atribuição das Varas do Júri".

"A conta não fecha. Acaso realmente fosse verdade que Aldemir tentou impedir a vítima de cometer suicídio, puxando-lhe o cabelo enquanto a mesma tinha uma arma apontada para si, seria, no mínimo, dolo eventual, posto que se traduz um comportamento que é indiferente à previsibilidade objetiva do resultado fatal de tal atitude", disseram os promotores.

Ainda conforme o segundo parecer, os promotores disseram não se mostrar razoável a tese de suicídio, quando os médicos que atenderam a vitima no IJF disseram em depoimento à Polícia Civil sobre estranhar a possibilidade de Jamile ter atirado em si mesma devido à posição do ferimento: "O comportamento de Aldemir no dia do crime é, em tudo, compatível, com o comportamento de quem praticou um crime".

Repercussão

Consta no inquérito que Jamile e Aldemir mantinham relação conturbada e protagonizaram diversas discussões dias antes da empresária morrer. Imagens das câmeras de segurança mostraram o advogado agredindo a namorada horas antes dela ser atingida com um disparo fatal.

Conforme a Polícia, o suspeito quis atrapalhar a investigação, ao tentar persuadir o adolescente filho de Jamile a testemunhar a favor dele, ao limpar a cena do crime e a arma utilizada. A reportagem tentou entrar em contato com os advogados de Aldemir, mas as ligações não foram atendidas.