Morte de piloto ameaçado pelo PCC: Justiça manda reabrir caso contra PM segurança de Pablo Marçal
O piloto era acusado de participar das mortes de dois líderes do PCC, 'Gegê do Mangue' e 'Paca', no Ceará
Mais de um ano e meio depois da morte do piloto Felipe Ramos Morais, o caso pode ter uma reviravolta: a Justiça de Goiás decidiu reabrir o processo sobre a morte dele e de outros dois homens, naquele Estado, em uma ação policial. Um dos policiais militares investigados pelo triplo homicídio é o comandante da ação, o tenente-coronel Edson Luis Souza Melo, conhecido como Edson Raiado - que participa da segurança do candidato a prefeito por São Paulo, Pablo Marçal (PRTB).
Felipe Morais havia revelado que era ameaçado pela organização criminosa paulista Primeiro Comando da Capital (PCC). Ele era acusado pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) de participar das mortes de dois líderes da facção, Rogério Jeremias de Simone, o 'Gegê do Mangue', e Fabiano Alves de Sousa, o 'Paca', no Ceará, em fevereiro de 2018, ao levar as vítimas e os executores, em um helicóptero, para uma emboscada fatal.
A 1ª Vara das Garantias, da Justiça de Goiás, determinou, nesta segunda-feira (2), que um laudo pericial, que pode "conter novos elementos investigativos", seja redistribuído à 3ª Vara dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribunal do Júri da comarca de Goiânia - que já tinha arquivado o processo da morte dos três homens na ação policial.
O laudo pericial, elaborado pelo Instituto Nacional de Criminalística (INC), da Polícia Federal (PF), no dia 31 de maio de 2023, concluiu que não havia resíduos de disparos de arma de fogo nas mãos de Felipe Ramos Morais. O Ministério Público de Goiás (MPGO) pediu a reabertura do caso.
Troca de tiros?
A versão divulgada pela Polícia Militar de Goiás (PMGO) foi de que Felipe Morais, Nathan Moreira Cavalcante e Paulo Ricardo Pereira Bueno foram mortos em uma troca de tiros com policiais do Comando de Operações de Divisas (COD), em uma fazenda que seria utilizada para o transporte de drogas, em Goiás, no dia 17 de fevereiro de 2023. Três aeronaves, drogas e armas foram apreendidas com os suspeitos mortos.
No entanto, desde o fato, a morte de Felipe e dos funcionários dele sempre estiveram cercadas de irregularidades. As cápsulas das munições das armas dos PMs foram removidas do local do crime.
As pistolas supostamente usadas pelos três mortos também foram retiradas da cena das mortes e encontradas em uma caminhonete, que estava dentro da casa. Os PMs não explicaram em depoimento como as armas foram parar no veículo.
Outro indício de irregularidades existente na investigação foi a retirada dos corpos da cena do crime. Os laudos cadavéricos indicaram que Felipe e os outros dois homens já estavam mortos após a ação policial e não precisavam de atendimento médico.
Apesar das irregularidades, na época, a Promotoria arquivou o caso ao alegar falta de provas.
Entretanto, anos depois, o Ministério Público encontrou provas contraditórias à versão oficial, e o tenente-coronel Edson Luís Souza Melo e o major Renyson Castanheira Silva passaram a ser investigados pelas três mortes.
Serial Killer
O tenente-coronel Edson Luís Souza Melo ficou mais conhecido por comandar a operação policial que terminou com a morte do "serial killer" Lázaro Barbosa, em 2021. Ele se candidatou a deputado federal por Goiás no ano seguinte, mas não foi eleito.
Em 2024, Edson Raiado se licenciou da Polícia Militar de Goiás e virou segurança particular do candidato à Prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal (PRTB). A assessoria de comunicação do candidato não foi localizada pela reportagem para comentar a investigação contra o segurança do político.
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Ameaçado de morte e delator
Felipe disse ter sido ameaçado de morte, caso não continuasse pilotando para a facção paulista. Na versão dele, foi sequestrado semanas antes do duplo homicídio da cúpula do grupo criminoso.
Conforme a defesa do piloto, ele não sabia que 'Gegê' e 'Paca' seriam executados e só participou do voo para Fortaleza depois de ser sequestrado e torturado um mês antes das mortes por homens subordinados a Wagner Ferreira da Silva, o 'Cabelo Duro', um dos executores do duplo homicídio.
O caso foi registrado em Boletim de Ocorrência (B.O.), na Delegacia de Polícia de Guarujá, em São Paulo, em 13 de janeiro de 2018. Considerado o principal articular do plano criminoso, 'Cabelo Duro' também foi executado, em São Paulo, poucos dias após o crime ocorrido no Ceará.
Em 2021, um atestado médico obtido pela reportagem do Diário do Nordeste apontou que Felipe foi diagnosticado com “ansiedade generalizada” e “estado de stress pós-traumático”.
O piloto foi preso em um condomínio de luxo no Município de Caldas Novas, em Goiás, em 14 de maio de 2018, três meses após os assassinatos de 'Gegê do Mangue' e 'Paca', em uma reserva indígena em Aquiraz.
Felipe firmou delação premiada com a Polícia Federal (PF), que auxiliou em outras investigações contra a mesma facção criminosa paulista a qual pertenciam 'Gegê do Mangue' e 'Paca'.
O piloto pediu por liberdade à Justiça várias vezes e pela anulação dos atos processuais, com a alegação de que também selou acordo de delação premiada com o Ministério Público do Ceará (MPCE), o que foi negado pelo Órgão.
Ele só conseguiu a soltura em abril de 2021, por decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE). Na época, o Tribunal considerou o quadro de saúde debilitado do acusado - que utilizava um balão intragástrico que já havia explodido.
No mesmo dia que ele foi solto pelo TJCE, o colegiado de juízes da Comarca de Aquiraz negou a anulação dos atos processuais e pedidos de relaxamento das prisões dos outros réus.
Conforme as investigações da Polícia Civil do Ceará (PCCE), Felipe teria levado vítimas e assassinos para uma emboscada, motivada por um racha na facção. A liderança do PCC não aceitava a vida de luxo que a dupla levava em terras cearenses e suspeitava de desvios financeiros.