Grupo de extermínio: empresária, PMs e matador contratado vão a júri popular por assassinato de advogada no Ceará

Um quarto policial militar também acusado pelo crime entrou com pedido de insanidade mental e teve o processo contra ele suspenso temporariamente

Escrito por
Emanoela Campelo de Melo emanoela.campelo@svm.com.br
adv e mae
Legenda: O crime aconteceu em março de 2023
Foto: Reprodução

Cinco acusados pelas mortes da advogada Rafaela Vasconcelos de Maria e da mãe dela, Maria Socorro de Vasconcelos, em Morrinhos, no Interior do Ceará, devem se sentar no banco dos réus. A Justiça decidiu pronunciar o grupo composto por uma empresária, acusada como mandante do crime, policiais militares e um matador profissional. As defesas pedem absolvições.

Com a decisão de pronúncia, devem ser julgados pelo Tribunal do Júri: Maria Ediane da Mota Oliveira, os PMs Daniel Medeiros de Siqueira, Edílson Barbosa da Luz e Reginaldo Cavalcante dos Santos, além de José Elton Cavalcante Mano da Silva. A morte da advogada teria sido encomendada por Maria Ediane, pelo valor de R$ 70 mil. Ainda não há data para o júri acontecer.

Edilane é uma das pessoas mais procuradas do Estado. Ela aparece na lista divulgada no site da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS). 

Outro policial militar denunciado pelo crime, Francisco Amaury da Silva Araújo deu entrada em pedido de insanidade mental. O Ministério Público do Ceará (MPCE) pediu a pronúncia de todos os acusados, incluindo Amaury, mas sobre este agente a Justiça disse ter verificado "que foram levantadas dúvidas razoáveis quanto à sanidade mental".

A defesa de Amaury apresentou relatórios médicos alegando que o PM tem alienação mental, com surtos de alucinações e ideação delirante. Com isso, o processo contra Amaury está temporariamente suspenso, enquanto ele não passar por perícia médica.

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"Com a última decisão proferida no processo, a Justiça, de forma acertada, acatou o pedido feito pela Defesa, para determinar que seja instaurado um procedimento para avaliar a condição mental de Amaury, em razão dos vários elementos que colocam em dúvida sua sanidade. O pedido foi feito considerando a vasta documentação médica juntada ao processo desde o início, que dão conta, através de atestados, receituários, laudos e declarações, do severo e já antigo quadro psicótico a que padece Amaury, anterior, inclusive, aos fatos que estão sendo apurados no processo do qual é acusado", disse o advogado Marcus André Viana Cavalcante.

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O juiz da 1ª Vara da Comarca de Marco também decidiu manter a prisão preventiva de todos os acusados, incluindo a ida do PM Amaury para hospital de saúde mental: "deverão aguardar seu julgamento pelo Tribunal do Júri privados de liberdade, para a garantia da ordem pública, conveniência da instrução processual e garantia da aplicação da lei penal, negando, em consequência, o direito dos réus de recorrerem em liberdade".

Maria Socorro não era alvo da ação criminosa, mas também foi assassinada a tiros por estar na companhia da filha, trafegando em uma moto.

A reportagem entrou em contato com as defesas dos pronunciados Daniel Medeiros, Edílson Barbosa, Reginaldo Cavalcante e José Elton. A defesa da empresária não foi localizada. 

Por nota, os advogados Ricardo Queiroz e Andrea Vidal, que representam Edilson, disseram que o PM "nega veementemente as imputações que lhe foram feitas e reitera sua confiança na Justiça, que, ao final, comprovará sua inocência. A defesa já está adotando todas as medidas legais cabíveis para recorrer da sentença de pronúncia de modo a demonstrar que ele não cometeu os atos que lhe são injustamente atribuídos". As demais defesas contactadas não responderam até a edição desta matéria.

CRIME PREMEDITADO 

Conforme a sentença de pronúncia, "as evidências apontam a existência de indícios suficientes de autoria ou de participação dos acusados Maria Ediane da Mota Oliveira, Daniel Medeiros de Siqueira, José Elton Cavalcante Mano da Silva, Edílson Barbosa da Luz e Reginaldo Cavalcante dos Santos, no crime de duplo homicídio".

"Todos esses indícios de prova de autoria, foram plenamente confirmados pelas testemunhas ouvidas na fase de instrução, ao crivo do contraditório e da ampla defesa"
Juiz da Comarca de Marco

A investigação apontou que o crime foi motivado por ciúmes, "consistente no inconformismo da ré Maria Ediane, com o relacionamento amoroso da vítima Rafaela de Maria com um tenente-coronel, com quem nutria um sentimento amoroso. Assim, com relação a Maria Ediane, o móvel do ilícito foi motivado por ciúmes, o que, em tese, pode a vir constituir motivo torpe e não motivo fútil".

"Pelas circunstâncias relatadas nos autos, o homicídio foi cometido mediante recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa das vítimas, as quais foram surpreendidas, alvejadas pelas costas, de modo que, pelas circunstâncias, não pôde oferecer resistência alguma e/ou esboçar qualquer reação", de acordo com o magistrado, na sentença proferida no último mês de dezembro.

empresaria ficha
Legenda: A empresária teria encomendado o crime por motivo torpe
Foto: Reprodução

EMBOSCADA E PROMESSA DE PAGAMENTO

Os PMs Daniel Medeiros e Francisco Amaury foram os primeiros a serem denunciados pelo crime. Conforme o inquérito, os agentes, "mediante promessa de pagamento e emboscada, mataram Rafaela Vasconcelos de Maria e Maria Socorro de Vasconcelos de Maria, assumindo o risco na morte desta e desejando a morte daquela, agindo todos de forma livre e consciente, com unidade de desígnios e comunhão de vontades".

Com o fim das investigações, a Polícia chegou a autoria dos demais, tendo a empresária Maria Ediane chegado a entrar para a lista dos Mais Procurados da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS), em outubro de 2023.

"As vítimas trafegavam em uma Honda Biz 125, branca, quando foram perseguidas por um atirador que dirigia uma motocicleta preta, modelo CB 300, sem placa. O atirador usava uma camisa preta de manga longa e luvas cirúrgicas azuis. Na perseguição, o executor desferiu disparos de arma de fogo contra as vítimas, que não tiveram qualquer chance de defesa e, em razão das lesões sofridas, não resistiram e vieram a óbito (dinâmica captada por câmeras de monitoramento de segurança). Posteriormente, Daniel Medeiros de Siqueira e Francisco Amaury da Silva Araújo foram presos em flagrante delito no dia seguinte ao cometimento do crime, também na cidade de Morrinhos/CE, haja vista que os autuados foram encontrados, poucas horas depois do crime, em situação que fazia presumir suas participações no delito"
Denúncia do MPCE

Com a quebra de sigilo dos aparelhos celulares apreendidos com a dupla, foi representada pela busca e apreensão e pela prisão preventiva de José Elton Cavalcante Mano da Silva, apontado como executor contratado para o crime.

"Conforme Relatório Técnico, Ediane teria pago o valor de R$ 70 mil para a consumação do delito. Diante dessa demanda de Ediane, Siqueira incluiu em sua equipe, ao menos, Amaury, Neto (assassinado antes de concluir o serviço) e Elton, pessoas estas encarregadas da execução do crime contratado. A partir de então, os contratados iniciaram uma série de diligências para fins de execução do delito, tais como reuniões, viagens à cidade de Morrinhos/CE para acompanhar o cotidiano das vítimas e aquisições de veículos (motocicleta e carro), a serem usados no dia da execução do delito, tudo isso financiado por Ediane, como mandante. Da análise dos fatos, vislumbrou Daniel Medeiros de Siqueira e Francisco Amaury da Silva Araújo como os principais planejadores do crime de homicídio de Rafaela, ainda, comprova também que ambos assumiram o risco da morte da Sra. Maria Socorro, visto que, conforme mensagens trocadas com Ediane, no dia dos fatos, os policiais estavam decididos a se livrarem da “S13” (Ocorrência), a qualquer custo, pois decidiram que aquele seria o dia que matariam Rafaela, não importando quem estava em sua companhia no momento do crime", conforme o MPCE, no aditamento da primeira denúncia, em novembro de 2023.

A Delegacia de Assuntos Internos (DAI), da CGD, analisou conversas em aparelhos celulares, autorizada pela Justiça, e realizou outros levantamentos de inteligência, para chegar à teia criminosa. A investigação foi dificultada pela participação de PMs no crime, segundo investigadores.

VEJA NOTA NA ÍNTEGRA DA DEFESA DO PM EDILSON

"A defesa do Sr. Edilson Barbosa da Luz vem a público esclarecer que ele se encontra atualmente privado de sua liberdade em razão de acusações que serão devidamente combatidas nos autos do processo judicial em andamento.

O Sr. Edilson Barbosa da Luz nega veementemente as imputações que lhe foram feitas e reitera sua confiança na Justiça, que, ao final, comprovará sua inocência. A defesa já está adotando todas as medidas legais cabíveis para recorrer da sentença de pronúncia de modo a demonstrar que ele não cometeu os atos que lhe são injustamente atribuídos.

Vale destacar que o Sr. Edilson Barbosa da Luz possui conduta ilibada, com sua ficha funcional junto a Polícia Militar do estado do Ceará sem qualquer registro de ato ilícito, sendo um homem dedicado à sua família.

Reiteramos o compromisso com a transparência, a ética e o devido processo legal, confiando que a verdade prevalecerá. Pedimos, ainda, que a imprensa e a sociedade respeitem o direito constitucional à presunção de inocência, evitando julgamentos precipitados.

A defesa permanecerá à disposição para esclarecer os fatos sempre que necessário, mantendo o respeito às autoridades competentes e ao curso do processo judicial".

Advogados Ricardo Queiroz e Andrea Vidal.

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