GDE lava dinheiro de compra de drogas do Cartel de Cali em outros estados brasileiros

Informações obtidas pela Polícia Civil dão conta de esquema internacional de tráfico de drogas e depósito em empresas fictícias

Escrito por Cadu Freitas , cadu.freitas@svm.com.br
Legenda: A Guardiões do Estado domina a maioria dos territórios de Fortaleza, conforme a Draco
Foto: JL Rosa

O dinheiro utilizado para pagar a cocaína que vem da Colômbia e da Bolívia em direção ao Ceará, por meio da facção Guardiões do Estado (GDE), é lavado em outros estados do Brasil, como Rondônia e Minas Gerais. A organização criminosa negocia e comercializa a droga com o Cartel de Cali, conforme aponta um relatório da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco).

Segundo as investigações, os pagamentos são realizados por meio de depósitos bancários em contas de “laranjas”, abertas em cidades principalmente do Norte do País. A intermediadora principal atende pelo nome de Elena Souza Azevedo, conhecida por Helena ou Tama; ela é boliviana e responsável pelo envio da droga do cartel ao Ceará.

Legenda: Rota do tráfico da GDE

A prova das compras ilegais foi obtida a partir de conversas entre membros da GDE em um aplicativo de mensagens. Nela, um dos faccionados envia uma imagem com cocaína embalada com seu nome e a marca de um golfinho. A indicação do animal marinho esculpido em alto relevo na droga é marca registrada do Cartel de Cali, grupo criminoso, cujo auge se deu no fim dos anos 1970 na América Latina.

Foram identificados depósitos em dezenas de contas bancárias de titulares moradores da cidade de Guajará-Mirim, em Rondônia - o município brasileiro faz fronteira com a Bolívia. Nessas contas, conforme a Draco, durante os 36 dias de conversas aos quais houve o acesso ao aplicativo de mensagens, o montante repassado por apenas um dos líderes da facção foi de quase R$ 1 milhão. Em um mês, quando acrescidos os demais investigados, a facção teria movimentado valor superior a R$ 2 milhões.

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“Neste sentido, fica claro que há a participação de diversas pessoas de outros Estados na comercialização da droga, por meio da cessão de contas bancárias para realizar depósitos para pagamento de entorpecentes”, escreveram os delegados no relatório final da apuração.

A Draco indiciou 31 integrantes da GDE, incluindo a alta cúpula, líderes, membros e esposas de investigados, além de ter encaminhado um relatório à Polícia Federal, a fim de que continuem as investigações sobre as pessoas identificadas em outros estados e países. 

Lavagem de dinheiro

A apuração do crime de lavagem de dinheiro patrocinado por integrantes do grupo criminoso cearense só foi possível após a expedição do Relatório de Informações Financeiras (RIF), elaborado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), do Governo Federal.

Com os dados em mãos, a investigação observou que os possíveis "laranjas" identificados movimentavam valores incompatíveis com a renda declarada ou com a estrutura das empresas investigadas. O montante ultrapassa R$ 7,9 milhões entre janeiro de 2016 e agosto de 2019, mas pode ser maior, de acordo com o Coaf.

As contas foram extraídas do aplicativo de mensagens de Yago Steferson Alves dos Santos, o “Yago Gordão” ou “Supremo”. Ele é um dos integrantes da Sétima Coluna, grupo de fundadores e principais líderes da GDE, que possuem anéis templários para se distinguir aos demais chefes da organização.

Legenda: Sétima Coluna da GDE

O relatório que investiga a conexão interestadual do tráfico de drogas com lavagem de dinheiro por meio de empresas fictícias e "laranjas" indexou 11 nomes entre pessoas físicas e jurídicas. Eles são considerados investigados por serem titulares de contas vinculadas à GDE. A partir deles, descobriu-se uma teia de 65 pessoas que realizavam supostas atividades ilícitas, cedendo suas contas bancárias para intermediação de compra e venda de psicoativos ilegais.

Casos

Uma empresa de construção com sede na cidade de Contagem (MG), por exemplo, foi apontada pelo Coaf como uma das que estavam apresentando movimentação na conta de forma suspeita desde a abertura, em fevereiro de 2019. O negócio, embora tivesse afirmado às autoridades que tinha faturamento de R$ 120 mil anual, movimentou, em seis meses, R$ 7,5 milhões, com recebimento de depósitos online em conta de diversos locais do Brasil. 

Outro exemplo de indício de lavagem de dinheiro é o caso de um homem rondonense. Ele é cadastrado como trabalhador informal, cuja renda é de R$ 1,8 mil. Contudo, em seis meses, a sua conta bancária apresentou movimentação de R$ 3,4 milhões. Segundo o RIF, o cliente trabalha com câmbio clandestino e "utiliza a conta para receber depósitos de terceiros para ser enviado para os estudantes de medicina na Bolívia, sem informar a Receita Federal". 

 

 

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