'Fico dirigindo e pensando em sequestrar alguém', disse PM apontada como líder de milícia no CE

A policial chegou a ser presa preventivamente, mas responde ao processo criminal em prisão domiciliar

Escrito por Messias Borges , messias.borges@svm.com.br
Relatório enviado pela CGD à Justiça Estadual revela conversas entre policiais acusados de homicídio em Maracanaú
Legenda: Relatório enviado pela CGD à Justiça Estadual revela conversas entre policiais acusados de homicídio em Maracanaú
Foto: Fabiane de Paula

Apontada como líder de uma milícia que sequestrou e matou um agiota, em Maracanaú, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), a sargenta da Polícia Militar do Ceará (PMCE) Maria Aline do Nascimento Rodrigues teve conversas interceptadas pelas autoridades, em que planeja ações criminosas com outros policiais. A policial chegou a ser presa preventivamente, mas responde ao processo criminal em prisão domiciliar.

Um relatório da Delegacia de Assuntos Internos (DAI), da Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário do Ceará (CGD), com a extração de dados do celular da PM, autorizada pela Justiça Estadual, detalhou conversas entre Maria Aline e outros policiais acusados de participar do assassinato do agiota Clézio Nascimento de Oliveira, no dia 7 de novembro de 2022. O corpo da vítima nunca foi encontrado.

Também acusado de participar do crime, o ex-policial militar Francisco Danis de Oliveira Nascimento, conhecido como 'Combate', solto em maio de 2022, o que foi comemorado pelo grupo criminoso. "Eita que agora vamos pra cima dos corre", disse outro réu no processo criminal, o soldado da Polícia Militar Francisco Ronaldo Sales, no dia 12 daquele mês.

No dia 23 seguinte, Sales enviou a fotografia de um alvo de extorsão para Aline. "A gente vai comer ele lá? Pra mim dá certo. Cuida! Tô na abstinência", disse a sargenta. "Fico dirigindo e pensando em sequestrar alguém", complementou a policial militar, em conversa pelo aplicativo WhatsApp.

Sales afirmou, em seguida, que "esse da foto, dando certo, é coisa para nós parar por uns dez anos (sic)", referindo-se a um alto valor esperado na extorsão. Aline, então, sugeriu: "A gente pode ir praticando outros só para não perder o costume. Porque eu tô triste triste".

Conversas entre os dois policiais relacionadas ao planejamento de ações criminosas eram quase diárias, segundo o relatório investigativo. O diálogo revelou para a CGD que a suposta milícia planejava extorquir um estrangeiro que foi preso em Fortaleza por tráfico de drogas, mas foi solto pela Justiça Estadual após três meses. 

Em outra conversa, a policial militar envia uma foto da mão machucada com calos para a companheira e conta que "a capivara tentou fugir" e que "Dra Solange entrou em ação". "Capivara" é como os investigados chamavam as vítimas das extorsões. A outra frase indica que a PM e os comparsas precisaram agir com violência, para alcançar o seu objetivo.

Prisão domiciliar é contestada

Maria Aline do Nascimento Rodrigues foi presa em flagrante no dia 11 de novembro de 2022, quatro dias após o crime, e teve a prisão preventiva decretada, na audiência de custódia. No dia 9 de março de 2023, a 1ª Vara Criminal da Comarca de Maracanaú concedeu a prisão domiciliar para a acusada, com monitoramento por tornozeleira eletrônica.

Veja vídeo do crime:

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O juiz da Vara acatou a tese da defesa que "a requerente faz jus ao benefício da prisão domiciliar, tendo em vista ser mãe de um filho menor de 12 anos de idade", como entendeu o Supremo Tribunal Federal (STF).

A Coordenadoria de Inteligência (Coin), da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS), emitiu relatório, em 5 de março do ano passado, em que contesta a decisão de prisão domiciliar da sargenta Maria Aline.

Segundo as investigações da Coin, o advogado e a companheira da policial militar, com o apoio do ex-marido da servidora, se utilizaram de "um artifício" para obter a prisão domiciliar para a ré, na Justiça Estadual. O grupo teria decidido matricular o filho de Aline com o ex-marido em uma escola próxima da residência da policial militar apenas para provar ao Poder Judiciário que o menino morava com a mãe, quando na verdade ele morava com o pai e era matriculado em um colégio próximo.

O Ministério Público do Ceará (MPCE) denunciou os cinco suspeitos por homicídio duplamente qualificado (por motivo torpe e mediante recurso que dificultou a defesa da vítima) e ocultação de cadáver, no dia 13 de abril deste ano, pelo crime que vitimou Clézio Nascimento de Oliveira, em Maracanaú, no dia 7 de novembro de 2022.

Seguem presos o soldado da Polícia Militar Gabriel Neves Cabral e o ex-policial militar Francisco Danis de Oliveira Nascimento. Já a sargenta Maria Aline do Nascimento Rodrigues e o soldado Francisco Ronaldo Sales também estiveram no Presídio Militar, mas tiveram a prisão domiciliar acatada pela Justiça, em razão da mulher ter um filho menor de 12 anos e do homem precisar tratar de uma doença. As defesas dos policiais não foram localizadas pela reportagem.

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