Casal é suspeito de praticar 'golpe da construção' na venda de casas de alto padrão no Eusébio
Empresas que venderam e alugaram materiais para a construtora também denunciaram os crimes à Polícia Civil, que investiga as denúncias

Compradores de casas de alto padrão que seriam construídas em um condomínio no Eusébio, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), denunciaram para a Polícia Civil do Ceará (PCCE) ter sofrido um golpe de uma empresa construtora, que tem um casal como responsável. Empresas que venderam e alugaram materiais para a construtora também denunciaram os crimes à Polícia.
A Polícia Civil confirmou, por nota, que "apura as circunstâncias de crimes de estelionatos ocorridos em Fortaleza e na Região Metropolitana. Boletins de Ocorrências (BOs) já foram registrados. Diligências e oitivas estão em andamento. Mais detalhes serão repassados em momento oportuno para não comprometer as investigações".
Os nomes dos suspeitos não serão publicados porque eles não foram indiciados pela Polícia Civil nem denunciados pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) pelos supostos casos de estelionato, até a publicação desta matéria.
O Diário do Nordeste recebeu cinco Boletins de Ocorrência (BO) registrados contra o casal. Uma vítima afirmou ao 13º Distrito Policial (13º DP) que pagou um total de R$ 222 mil para a empresa construtora, entre novembro de 2022 e janeiro de 2024, quando denunciou o caso.
Entretanto, a obra não avançou. O cliente informou à Polícia que pagou um valor referente a 35% do valor total, mas a obra não passou de 20%. Ao visitar as obras, ele descobriu que o mestre de obras e os pedreiros estavam parados, por falta de material para trabalhar; e, depois, recebeu a informação que os funcionários iam sair do trabalho, por falta de pagamentos.
foram pagos por outro cliente da construtora, para ter uma casa de alto padrão no mesmo condomínio, no Eusébio. Ele relatou à Delegacia de Defraudações e Falsificações (DDF), em abril do ano passado, que pagou 62% do valor da obra, que era prometida para ser entregue em 12 meses, a partir de maio de 2022.
Um terceiro cliente pagou um total R$ 150 mil, em três parcelas. Ao registrar o BO na DDF, em dezembro do ano passado, a vítima disse que "até a presente data ele (responsável pela obra) não fez nada". Segundo o Boletim, ao questionar o empresário proprietário da construtora, "ele sempre (reage) com respostas evasivas, com as mais variadas desculpas".
Um empresário também denunciou a empresa construtora para a Polícia Civil pelo crime de apropriação indébita. Segundo o BO, registrado em fevereiro do ano passado, a vítima alugou equipamentos como andaimes, pisos e escora. "Por falta de pagamento, fomos recolher (o material) e o cliente não libera a entrada e não se propõe a devolver. Ele não deixa recolher os equipamentos", informou.
Outro empresário vendeu granitos para a empresa construtora por R$ 5 mil, para serem utilizados na construção de uma casa no Eusébio, em julho de 2024. Entretanto, passados 4 meses, o valor não foi pago, o que motivou a denúncia à Delegacia Metropolitana do Eusébio.
A Polícia Civil ressaltou que "a população pode contribuir com as investigações repassando informações que auxiliem os trabalhos policiais. As informações podem ser direcionadas para o número 181, o Disque-Denúncia da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), ou para o (85) 3101-3360, que é o número de WhatsApp, pelo qual podem ser feitas denúncias via mensagem, áudio, vídeo e fotografia ou ainda via 'e-denúncia', o site do serviço 181, por meio do endereço eletrônico: https://disquedenuncia181.sspds.ce.gov.br/."
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Indenizações por danos morais e materiais
O advogado Alaôr Bettega, que representa vítimas da empresa construtora, conta que já recebeu informações de pelo menos 11 vítimas do suposto golpe. "A construtora oferecia seus serviços de construção, que incluía projetos e administração, e prometia entregar as obras em 12 meses. Apresentavam projetos maravilhosos. Começavam a obra com um valor de entrada à vista, alguns financiados", relata.
Começavam as obras com parte do dinheiro da entrada, e a obra ia se estendendo, até fecharem outro contrato. Davam a largada da outra obra e, assim, foram fazendo sem terminar nenhuma. Compravam material e ficavam devendo os fornecedores, como uma empresa de granito e outra de poços artesianos."
Segundo o advogado, o casal responsável pela empresa construtora deixou de responder aos clientes e sumiu. "O escritório da construtora está fechado e ninguém sabe o paradeiro deles. Em boa parte das ações, ainda não foram citados", afirma.
Bettega ingressou com Ações de Rescisão Contratual com pedido de Indenização na Justiça Estadual, pelos dois clientes. O advogado pediu R$ 700 mil e R$ 300 mil de indenização, por danos morais e materiais.
Segundo o advogado, um dos clientes entregou um apartamento que era proprietário e que morava como parte do pagamento para a construção da casa de alto padrão, no Eusébio. Em razão disso, além do prejuízo financeiro, esse cliente teve que arcar com o valor de um aluguel de uma nova moradia, há 16 meses.
Indiciamento por outro caso de estelionato
A reportagem apurou que o homem e a mulher responsáveis pela empresa construtora já foram indiciados pela Polícia Civil do Ceará por outro suposto caso de estelionato, em setembro de 2024.
Conforme as investigações policiais, o casal vendeu uma casa no valor de R$ 480 mil para uma pessoa, que, depois de três anos, recebeu uma notificação extrajudicial de uma empresa que se apresentou como proprietária do terreno onde foi construída a casa.
Segundo a notificação extrajudicial, a empresa fez um contrato de compra e venda com uma mulher (que foi indiciada), mas ela nunca passou a escritura do terreno para o nome dela. E, mesmo assim, a suspeita vendeu a casa para a vítima.
Apesar do indiciamento da Polícia Civil, em março deste ano, o Ministério Público do Ceará pediu informações ao Poder Judiciário se o casal já tinha sido beneficiado com Transação Penal ou Suspensão Condicional do Processo nos últimos cinco anos, para verificar a possibilidade de oferecimento de um Acordo de Não Persecução Penal (ANPP).
A Lei nº 13.964/2019 (conhecida como Pacote Anticrime) prevê que, "não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime".
As condições para cumprir o ANPP são:
- I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;
- II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;
- III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);
- IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito;
- ou V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.