Moradoras de Nova Olinda transformam suas casas em pousadas

O projeto, criado há mais de duas décadas, além de possibilitar a interação entre os nativos da cidade caririense e os turistas, também gera renda e potencializa o turismo da região. As diárias custam R$ 70, com café incluso

Escrito por
Antonio Rodrigues regiao@verdesmares.com.br
(Atualizado às 23:13)
Legenda: Os quartos que recebem os hóspedes são exclusivos para esta finalidade
Foto: FOTOS: ANTÔNIO RODRIGUES

Há 20 anos, um grupo de mães dos jovens que participam da Fundação Casa Grande - Memorial Homem Kariri, em Nova Olinda, começou a abrigar os primeiros visitantes que chegavam ao Município como forma de suprir a carência de hotéis e pousadas existentes na localidade. O trabalho foi dando certo e se tornou uma rede de turismo comunitária que inclui roteiros para pontos importantes como Geossítios, Ponte de Pedra, Pedra Kariri, Parque dos Pterossauros, Pontal da Santa Cruz e o ateliê do artesão de couro Espedito Seleiro.

Ao todo, 12 domicílios se revezam para receber turistas do Brasil e do mundo no aconchego de casa, vivendo a rotina de seus moradores. Italianos, franceses, norte-americanos, canadenses, portugueses são só alguns dos visitantes que já se hospedaram nas pousadas domiciliares. O valor da diária custa R$ 70 e inclui o café da manhã feito pela receptora. "Com a vinda das pessoas para a cidade, sentimos a necessidade de criar um lugar para elas ficarem", detalha a professora aposentada Maria Macêdo, que adaptou sua casa para receber os turistas.

Surgimento

Tudo começou por acaso, quando um grupo de 10 crianças, da cidade de Caldeirão Grande (PI), foi premiado com uma visita a Nova Olinda e não tinha onde se hospedar. A ideia foi colocar os filhos para dormir nas casas de parentes e receber os meninos piauienses. "Colocamos os de dentro para fora e os de fora para dentro", brincou Maria. A ideia evoluiu e este grupo de mulheres recebeu capacitação ao longo do trabalho de implantação. "Não senti nenhuma dificuldade. Eu, como educadora, sou acostumada. Mas a gente não recebe todo mundo, só recebe quem tem a ver com a Fundação Casa de Grande", pondera.

Relevância

As pousadas domiciliares entram como um "turismo de conteúdo", como define o coordenador do projeto, Júnior do Santos, em que o visitante tem acesso ao acervo cultural e interage com as atividades desenvolvidas nestes espaços. "É um meio de hospedagem que o turista está mais voltado a ter experiência, contato com a cultura, a vida tradicional de cada lugar. Ele vem para agregar a uma formação que já existe com os filhos dessas famílias. As crianças e os jovens estão inseridos numa formação inclusiva de gestão social", explica Santos.

Em formato de rodízio, a rede oferece mais de 50 leitos. Porém, em meses como julho, nas férias, e dezembro, quando acontece a renovação da Fundação Casa Grande, evento que marca o aniversário da Instituição, as casas ficam lotadas. "É uma extensão da casa deles. Tradições como alimentação e saberes acabam sendo socializadas. Há muitas mães que são bonequeiras, fabricam bonecas. Acaba havendo um resgate. Se torna um produto. As coisas foram surgindo de acordo com a necessidade. Ampliar a memória sobre Espedito Seleiro, mostrar o ciclo do couro foi uma delas", completa.

Laços

No aconchego da casa de Maria, que é muito receptiva e prepara café com bolo para os visitantes, vínculos foram criados. Antigamente, o almoço também era oferecido nos domicílios, mas, agora acontece na sede da Casa Grande. "Ficou até melhor para não preencher muito a casa e ficar cansada ou até estressada para receber as pessoas", acredita a moradora.

Ao longo destes 20 anos, com a diversidade de turistas de outros países, claro, sempre houve obstáculos na comunicação entre a família acolhedora e os hóspedes, mas sempre se deu um jeito. "De primeiro, os meninos falavam alto. Eu dizia: "eles não são 'mouco', só não entendem o que a gente diz", brinca.

Um hóspede canadense, por exemplo, quando não entendia, desenhava para Maria. Outra mulher da Califórnia (EUA) passou quase uma semana com o cabelo assanhado, amarrado na cabeça, porque não conseguia pedir uma escova ou um pente. Resultado: teve que usar o mesmo recurso. O convívio, embora com algumas dificuldades, criou afetividade entre os pares. "As pessoas sempre voltam. O bom é isso. Se voltam, é porque gostaram", exalta a professora.

Legenda: odas as pousadas recebem uma placa padronizada na frente da casa

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