Apuração Eleições 2024 Legislativo Judiciário Executivo

Como o caso Lázaro Barbosa virou palanque para a defesa de armamento no Brasil

Desde que o caso ganhou repercussão, Bolsonaro e aliados vêm defendendo o porte de armas. Especialistas divergem sobre efeitos

Escrito por Letícia Lima , leticia.lima@svm.com.br
Legenda: Lázaro Barbosa foi capturado e morto pela Polícia nesta segunda (28)
Foto: Divulgação

O caso Lázaro Barbosa, que teve seu desfecho nesta segunda-feira (28), também virou, entre políticos, palanque para levantar a bandeira do armamento da população. Ao ser trazida à tona nos últimos dias, a pauta, defendida pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e apoiadores, reacendeu o debate sobre os efeitos da política armamentista no combate à violência.

Especialistas em segurança pública entrevistados pelo Diário do Nordeste avaliam que a condução do caso fortaleceu a ideia de Polícia "caçadora", que pode oferecer riscos à população, e serviu para turbinar discurso de defensores da liberação de armas de fogo, de olho nas eleições de 2022.  

Após 20 dias de uma megaoperação em Goiás, Lázaro Barbosa, foi capturado e morto, nesta segunda (28), em uma troca de tiros com a Polícia.

Veja também

O homem era acusado de cometer uma série de crimes, entre eles o assassinato de quatro pessoas de uma mesma família em Ceilândia, no Distrito Federal, no último dia 9 de junho, além de roubos e invasões a propriedades enquanto fugia. 

Discurso armamentista

Desde que o caso ganhou repercussão, Jair Bolsonaro e aliados voltaram a defender o porte de arma, uma das principais bandeiras do presidente da República na campanha eleitoral de 2018.

Em uma "live" no dia 17 de junho, Bolsonaro destacou medidas implementadas no seu Governo que facilitaram o acesso às armas de fogo e incentivou o armamento da população.

Tem mulher aqui, né? Vocês queriam ter uma arma? Arma deixa você dormir em paz em casa. Apesar da segurança enorme que tem aqui, eu não consigo dormir sem ter uma arma do meu lado. E outra coisa: quem não quer ter arma é só não comprar, não tem problema nenhum.
Jair Bolsonaro (sem partido)
Presidente da República

Quando foi confirmada a captura e morte de Lázaro, o presidente comemorou: "CPF cancelado".

Durante as buscas, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do chefe do Palácio do Planalto, também defendeu, nas suas redes sociais, o porte de armas.

"Mesmo com o crime de homicídio previsto no Código Penal, Lei do Feminicídio e Estatuto do Desarmamento, o tal do Lázaro tentou invadir uma casa e não conseguiu. Sabe por quê? Porque o homem na casa estava armado e o botou para correr. Polícia não é guarda costas, defenda-se!", disse.

O vice-líder do Governo no Congresso Nacional, deputado federal Rogério Peninha (MDB-SC), aproveitou o caso para defender a revogação do Estatuto do Desarmamento.

"O único que botou o Lázaro para correr foi aquele caseiro. Ele estava armado e é um caso bem prático da importância da necessidade do cidadão de bem ter o direito de defender a sua propriedade e, principalmente, a sua família. É por isso que eu luto tanto pela revogação do Estatuto do Desarmamento", sustentou.

Política de Segurança

Para o pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV-UFC), Ricardo Moura, esse tipo de discurso fortalece ações violentas do Estado e prejudica a própria Polícia.  

A ideia de uma Polícia caçadora é reforçada e o populismo na área da segurança também. Isso, para o País, é um retrocesso, porque se investe energia, esforço em ações que não repercutem de forma positiva para os órgãos de segurança e a valorização dos profissionais.
Ricardo Moura
pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará (UFC)

Ricardo Moura acredita que o caso envolvendo Lázaro Barbosa pode ser utilizado na campanha de futuros candidatos às eleições de 2022 que tenham o armamento como bandeira.

"Um mote que poderá ser usado nos discursos é, justamente, o de que, com a população armada, a possibilidade de Lázaros circularem por aí diminui, o que é uma mentira", refuta.

Veja também

Perigo à sociedade

Mais do que prejuízos a políticas de segurança, o coordenador do Laboratório de Estudos sobre Conflitualidade e Violência da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Geovani Jacó, avalia que a agenda armamentista incentivada pela atual gestão federal é um risco à sociedade e politiza a morte.

As pessoas não podem legitimar a ideia de autorizar a Polícia ou qualquer outro ente de matar alguém. Na hora que um presidente festeja o rito sumário da morte de alguém efetuado pela Polícia, ele está quebrando o próprio monopólio da violência, que é o Estado, e politizando a morte.
Geovani Jacó
coordenador do Laboratório de Estudos sobre Conflitualidade e Violência da Universidade Estadual do Ceará (Uece)

Agenda do Governo 

Em abril deste ano, entraram em vigor quatro decretos assinados por Bolsonaro, que mudaram várias regras sobre o tema, como o Estatuto do Desarmamento. 

Uma das principais alterações aumentou de quatro para seis a quantidade de armas que uma pessoa com registro pode comprar e aumentou de mil para dois mil a quantidade de munição que atiradores e caçadores podem comprar por ano.

Além disso, os decretos facilitaram o porte de arma, o direito de circular e carregar a arma fora de casa. 

Quem tiver o porte poderá ter até duas armas em trânsito ao mesmo tempo. O presidente da República atribui queda no número de homicídios no Brasil a essas flexibilizações das regras de armamento.