Ceará tem 156 praias e monitora balneabilidade em 67 pontos; saiba como são feitas as análises

O alto custo do processo, assim como a baixa movimentação em muitas delas, fazem com que as análises não ocorram em toda a orla

Escrito por André Costa , andre.costa@svm.com.br
Legenda: As amostras são coletadas semanalmente, a 1 metro de profundidade, que representa a região mais utilizada para recreação dos banhistas
Foto: Diário do Nordeste

"Praia imprópria para o banho?". Quem mora em cidade litorânea, ou próximo a ela, certamente já ouviu essa frase. Mas, como é feito esse laudo que atesta se a praia está apta ao banho? Como é o processo, quantas praias são monitoradas e qual material é coletado?

Periodicamente a Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace) emite parecer técnicos sobre a qualidade da água de determinado ponto do litoral. Para chegar a esta conclusão, amostras da água são coletadas e levadas a um laboratório específico. 

O gestor ambiental da Semace, Linconl Davi, explica em entrevista ao Diário do Nordeste que, ao todo, o Ceará tem 67 pontos em praias cuja balneabilidade é averiguada periodicamente. Destes, 32 estão em Fortaleza, sendo 17 no litoral Leste e 18 no litoral Oeste. Nestas praias, o monitoramento é feito semanalmente. Nas demais - fora da Capital -, a análise ocorre mensalmente. 

Balneabilidade é a medida das condições sanitárias das águas destinadas à recreação de contato primário, isto é, dos banhistas.

A reportagem questionou quantas praias englobam esses 67 pontos, mas a Semace não respondeu. Já em relação ao número de praias existentes em todo o Ceará, a pasta disse que são 156.

A professora de Microbiologia Ambiental Oscarina de Sousa, coordenadora do Laboratório de Estudos do Mar (Labomar) da UFC, explica que dois fatores justificam o não monitoramento em 100% das praias cearenses. O primeiro deles é o alto custo do processo, que demanda "equipe especializada e recursos".

Segundo, devido ao baixo fluxo de banhistas nas demais praias cearenses. A especialista detalha que em praias com pouca demanda, raramente elas ficam impróprias ao banho. "Esse número [de 67 pontos] é satisfatório. Nas principais praias, há monitoramento regular e o órgão [Semace] consegue atender bem o objetivo de fornecer informações sobre a balneabilidade daquele local", avalia.

Balneabilidade
Infogram

Praias fora de Fortaleza que são monitoradas:

  • Icaraí, Tabuba, Cambuco, Lagamar do Cauípe, Pecém, Taíba, Paracuru, Lagoinha, Flecheiras, Mundaú, Baleia, Icaraí de Amontada, Arpoeiras, Jericoacoara, Camocim, Bitupitá, Cruz, Porto das Dunas, Prainha, Presídio, Iguape, Barro Preto, Batoque, Barra Nova, Tabubinha, Morro Branco Velho, Praia das Fontes, Canto Verde, Pontal de Maceió, Canoa Quebrada, Majorlândia, Quixaba, Redonda

Amostras do mar

A cada semana, explica Lincoln, técnicos da Semace colhem amostras de distintos pontos do mar para serem feitas análises microbiológicas. Essas coletas geralmente são realizadas em dias e locais com maior afluência de banhistas.

"Utilizamos o indicador enterococos (bactérias) para identificar a qualidade daquele trecho e apontar se a praia está apta ao banho", ilustra o gestor da Semace.

Legenda: A cada semana técnicos da Semace colhem amostras de distintos pontos do mar para serem feitas análises microbiológicas.
Foto: Divulgação/Semace

A verificação de agentes patogênicos causadores de doenças em amostras de água marinha é difícil devido às baixas concentrações. Por isso, a Semace utiliza-se da análise de bactérias indicadoras da contaminação fecal, os enterococos.

Para a microbiologista Oscarina de Sousa, esse trabalho é fundamental no aspecto da saúde pública. "O Ceará tem praias lindíssimas e que atrai um grande contingente de pessoas. Então é necessário um trabalho muito rigoroso para identificar os locais impróprios. É preciso fomentar esse turismo, mas com saúde e responsabilidade", diz. 

Processo

Após a coleta do material, inicia-se um processo que tem que ser, obrigatoriamente, finalizado em 24 horas. Essa é a janela máxima entre as amostras serem levadas ao laboratório da Semace, onde o material é analisado, e a conclusão da análise. Após este prazo, o material coletado perde a eficiência de determinar a qualidade da água.

"A água passa por um rigoroso processo de inspeção e, em até 24 horas, estamos em posse do resultado. Ao identificarmos as amostras fora do padrão de enterococos, emitimos o alerta de que aquela faixa é imprópria, ou própria, ao banho", detalha Davi.

Todo esse processo é repetido semanalmente em 32 praias. "Essa periodicidade é necessária pois cada praia pode vir a mudar nesse resultado de uma semana para outra. São diversos fatores que influenciam na qualidade da água, por isso, esse monitoramento é frequente", explica.

Os critérios de balneabilidade utilizados:

  • Própria para banho: Quando em 80% ou mais de um conjunto de amostras obtidas em cada uma das cinco semanas anteriores, colhidas no mesmo local, houver no máximo 100 Enterococos por 100 mL da amostra.
  • Imprópria para banho: Quando o valor obtido na última amostragem for superior a 400 Enterococos por 100 mL da amostra, ou quando existirem ocorrências que possam ocasionar risco à saúde do banhista, tais como, presença de resíduos sólidos ou animais no entorno da área de banho.

Entre os fatores que influenciam negativamente na qualidade das águas, estão o aumento populacional e as chuvas, pois incrementam o lançamento direto ou indireto de esgotos.

Já nas praias fora de Fortaleza, a coleta é feita mensalmente. A periodicidade é reduzida devido às poucas mudanças observadas na água dessas praias.

"Quando saímos de Fortaleza já identificamos uma redução populacional importante, o que significa menor quantidade de esgotos e, nestes locais, quando chove, a água tende a infiltrar, diferente da Capital em que há uma impermeabilização e e essa água da chuva acaba escorrendo aos esgotos e depois ao mar", ilustra Lincoln. 

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Desta forma, o resultado obtido em um mês, ainda segundo o especialista da Semace, pouco se altera nos meses seguintes. 

"É natural encontrarmos resultados diversos nas praias de Fortaleza. Uma semana pode está imprópria e na outra já [está] apta ao banho. Já nas praias fora da Capital, é raro uma balneabilidade imprópria ao banho", acrescenta Davi.

Legenda: O resultado das análises sai em até 24 horas
Foto: Divulgação/Semace

Ir além do monitoramento 

Ao identificar esses pontos, a Semace informa à Prefeitura e à Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) sobre os relatórios das coletas e estes órgãos se encarregam de criar diretrizes para, nos casos das redes de esgotos, solucionarem o problema.

Legenda: Em locais com manchas de coloração vermelha, marrom ou azul-esverdeada recomenda-se evitar nadar ou praticar outros esportes
Foto: Semace/Divulgação

"É um trabalho conjunto. A Semace identifica os pontos e Prefeitura e Cagece executam ações para que possam reverter esses pontos impróprios ao banho", destaca o especialista Linconl Davi.

É nesse quesito que a coordenadora do Labomar, Oscarina de Sousa, avalia ser preciso avançar. Ela reconhece que, "nos últimos anos, as diversas ações realizadas já conferiram grande avanço nesta área, mas, além de monitorar, precisamos intensificar as ações que sanem esses problemas".

Em sua avaliação, o número médio de praias com parecer impróprio para o banho é considerado baixo levando em consideração a quantidade de praias cearenses, mas, "poderia ser ainda menor".

"O objetivo é sempre zerar [as áreas impróprias]. Investir em saneamento, redes pluviais e de esgoto para que nossas praias fiquem totalmente limpas e conquistem selos de reconhecimento internacional", completa. 

Uma dessas certificações é a Bandeira Azul, prêmio internacional que comprova que naquele local há turismo sustentável, educação ambiental e boa qualidade da água. Atualmente o Ceará não conta com nenhuma praia certificada, mas o Cumbuco pode ser a primeira no Estado a receber.

O processo de obtenção do Prêmio Bandeira Azul para a temporada 2021/2022 está sendo conduzido em parceria entre a Prefeitura de Caucaia e o movimento Winds for Future, com o apoio da APSV Advogados. Uma equipe avaliadora deve vir até o Ceará para analisar o cumprimento dos critérios no primeiro semestre de 2022.

"Quando olhamos para o passado, notamos um grande avanço. O monitoramento da balneabilidade é um dos pontos de destaques que nos levaram a avançar. Mas, não somente Fortaleza ou o Ceará, mas várias outras localidades ainda precisam de mais investimentos. Quando isso acontecer, daremos passos ainda mais largos", finaliza Oscarina.

Qualidade da água

Os principais fatores que corroboram para a qualidade imprópria da água são as redes de esgoto e chuvas torrenciais, que acabam levando para o mar esgotos e detritos. 

Quanto à ocorrência de chuvas de maior intensidade, a Semace alerta que o banhista deve evitar tomar banho de mar "pois elas [as chuvas] contribuem para a deterioração da qualidade das águas das praias carreando uma grande quantidade de esgotos, lixo e outros detritos através de galerias de águas pluviais, córregos e canais de drenagem".

Outra recomendação da Superintendência Estadual do Meio Ambiente diz respeito aos locais com manchas de coloração vermelha, marrom ou azul-esverdeada. Nestas faixas, "recomenda-se evitar nadar ou praticar outros esportes náuticos, assim como evitar o consumo de frutos do mar desses locais". 

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