27 cidades do Ceará registraram mais óbitos que nascimentos em março de 2021
De forma geral, os registros não caíram no Estado em relação a 2020, mas a disparidade entre os indicadores apontam para a gravidade da pandemia da Covid
Dados colhidos no Portal da Transparência do Registro Civil, nesta sexta-feira (9), indicam que 27 cidades cearenses tiveram mais registros de óbitos que de nascimentos em março de 2021, mês que apresentou número expressivo de casos e óbitos por Covid-19 no Estado.
A lista é encabeçada por Fortaleza, que teve diferença de 959 registros: foram 3.401 mortes - 1.361 apenas por Covid, segundo a plataforma IntegraSUS - e 2.442 nascimentos. O resultado também coloca a Capital cearense entre as primeiras cinco cidades brasileiras com mais de 500 mil habitantes onde o fenômeno ocorreu.
Os dados ainda podem ser atualizados conforme novos registros sejam incluídos no Portal. Por causa da pandemia, os cartórios receberam extensão de prazos para lançar informações.
Confira as cidades cearenses em que o fenômeno ocorreu:
O microbiologista Samuel Arruda explica que uma soma de fatores convergiu para o número de nascidos ser menor que o de mortes, nessas cidades. Primeiro ele detalha que o processo de queda da natalidade “já vinha apresentando essa tendência em todo o País”.
Conforme ilustra, entre janeiro de 2020 e janeiro deste ano, o Brasil teve redução de 17% na taxa de natalidade. No Ceará, os números também apontam para baixo. Entre 2019 e 2020, a redução foi de 6%. Entre 2020 e este ano, de 14%, ainda segundo Samuel.
“Já havia uma tendência de queda. O que a pandemia fez foi acelerar. Alguns fatores podem explicar esse comportamento, um deles é o medo causado pelo vírus. As gestantes são do grupo de risco, então, quem estava se planejando para engravidar, acaba adiando essa gravidez por medo"
"Vale entrar que o Brasil é o País com maior taxa de mortalidade deste grupo em todo o mundo. Ele era responsável por 70% das mortes de gestantes em todo o planeta”, complementa.
O especialista acrescenta ainda que o aspecto econômico pode também contribuir para esta redução. “Quem estava pensando ter filho e tem medo de perder o emprego ou ficar sem renda, acaba desistindo ou adiando”.
O segundo fator é o aumento da mortalidade. “Para além da pandemia, mortes por outras causas continuam acontecendo, então naturalmente este número cresceu”, destaca Samuel.
A combinação destes dois aspectos, cuja pandemia tem participação em ambos, ainda que indiretamente, “pode explicar essa relação entre natalidade e mortalidade”, conclui Samuel.
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Balanço geral positivo
Apesar dos resultados nessas 27 cidades, de forma geral, o Ceará teve balanço positivo de nascimentos no mês: houve 7.839 registros de nascidos contra 6.804 mortos.
Em números absolutos, os dois indicadores cresceram: os registros de nascimentos aumentaram 6,8% em relação a março de 2020, que teve 7.334. Já os de óbitos subiram 78%, com 3.818 registros há um ano, o que indica a gravidade da pandemia.
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Para a estudante Karla Menezes, 18, uma dose de esperança para as dificuldades do último ano chegou em 25 de março último, pesando 2,9 quilos, medindo 51 centímetros e, em breve, atendendo pelo nome de João Arthur.
Embora os pais residam em Caucaia, cidade que teve 177 nascimentos no mês, mas 209 mortes, segundo o Portal do Registro Civil, João nasceu no Centro de Fortaleza.
A gravidez de Karla, descoberta em setembro do ano passado, não foi planejada. Por definição do plano de saúde, todo o pré-natal precisou ser adaptado com viagens mensais para exames na Capital.
“As consultas eram bem tranquilas, e o obstetra sempre passava pensamento positivo pra gente. Tinha sempre que ir de máscara, usar álcool em gel e medir temperatura na chegada”, lembra Karla.
Agora, com o filho nos braços em casa, a estudante tenta projetar dias melhores.
“O nascimento dele foi uma reviravolta. Eu não planejava, mas é a melhor coisa da minha vida. Espero um futuro que não tenha essas doenças e que ele não passe pelo que a gente está passando agora”.
Pós-pandemia
Na avaliação de Samuel Arruda, é cedo para avaliar ou identificar quais os efeitos desta relação onde há mais mortes que nascimentos. Ele acredita que, em 20 ou 30 anos, “dará para se ter um melhor recorte e análise. Mas, se continuarmos assim, a tendência é de um envelhecimento da população”.
Outro aspecto apontado por Samuel é a mudança de cenário na pós-pandemia. Em alguns países da Europa, como a Islândia, houve um salto vertiginoso de nascimento após a pandemia. “É o chamado baby boom. Aquelas mães que adiaram seus planos, começam a ter os filhos no período pós-pandêmio”, pontua.
Contudo, acrescenta microbiologista, não se sabe se essa “explosão de nascimento” será suficiente para compensar as baixas verificadas nos últimos anos. “Os próximos Censos do IBGE serão importantes para que a gente possa avaliar esses números”, finaliza Samuel.