Presos ficam sem comida dentro de delegacia no Ceará e Justiça ordena fornecimento de alimentação

O MPCE apontou que a situação acontece na Delegacia Regional de Tianguá

Escrito por Redação , seguranca@svm.com.br
delegacia tiangua
Legenda: O MPCE destacou na fundamentação que a Delegacia Regional de Tianguá abrange todos os municípios da Serra da Ibiapaba, além de Frecheirinha e estaria com déficit de servidores
Foto: Divulgação

A Justiça ordenou que o Governo do Ceará forneça alimentação aos presos da Delegacia Regional de Tianguá. A decisão vem a partir de relatos de que os presos mantidos por até três dias na unidade não estariam recebendo alimentação, já que não há contratos que cubram a unidade nem por parte da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) nem por parte da Secretaria da Administração Penitenciária (SAP).

O Ministério Público do Ceará (MPCE) ajuizou ação civil pública requerendo que o Estado adotasse medidas. No dia 17 de janeiro de 2023, a Justiça decidiu que o Poder Público Estadual "deve adotar as providências administrativas necessárias para garantia da dignidade da pessoa presa, provendo alimentação necessária para aqueles que não são transferidos de imediato para o Núcleo Regional de Custódia".

A tutela de urgência impõe ao Estado do Ceará que em até 30 dias "promovesse contratação administrativa e estabelecesse parâmetros logísticos e fluxos de trabalho que orientem a alimentação desses custodiados conforme o tempo de permanência na Delegacia Regional de Tianguá".

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MEDIDAS

Prestes de encerrar o prazo, a Polícia Civil do Ceará informa que "está adotando todas as medidas necessárias ao cumprimento da decisão judicial emanada nos autos de Ação Civil Pública em curso na Comarca de Tianguá".

Já Secretaria da Administração Penitenciária diz que: "os contratos licitados para fim de alimentação possuem restrição legal de distribuição de alimentos exclusiva a pessoas privadas de liberdade, que estão sob a tutela do Estado no interior das unidades prisionais do sistema penitenciário".

O diretor de prerrogativas da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Secção Ceará, Márcio Vitor de Albuquerque, afirma que ao saber do caso, a Ordem pretende fazer uma inspeção no local "para saber de fato como está a acomodação do preso".

"De antemão entendemos que é ilegal. Um preso sem alimentação desafia a lei e é um desrespeito aos direitos humanos. Qualquer tipo de preso, seja o oriundo do flagrante ou da prisão preventiva, ou o preso sentenciado, deve ser acomodado em uma unidade penitenciária, que os comporte. A Lei de Execução Penal não prevê a situação de presos em Delegacia de Polícia. Essa custódia por si só é ilegal", disse Márcio Vitor.

A Associação dos Delegados de Polícia Civil (Adepol) disse concordar com o Ministério Público do Ceará (MPCE), autor da Ação Civil Pública (ACP), e com a decisão judicial. Afirmou ainda ser um retrocesso a presença de presos em unidades da Polícia Civil por conta do baixo efetivo e o prejuízo claro ao objetivo principal da instituição que é investigar crimes e não abrigar e custodiar presos. Por fim, a Adepol destacou que já havia feito ofícios informando sobre a situação dos presos e do prejuízo ao trabalho policial para a cúpula da Polícia Civil.

Desde 2019, o Governo do Ceará determinou a retirada de xadrezes das delegacias do Estado

[ATUALIZAÇÃO às 17h52]

Após publicação da matéria, a Polícia Civil do Ceará informou que: "com a inauguração da nova Unidade Prisional de Ensino, Capacitação e Trabalho (UPECT), da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), ocorrida na última terça-feira (14), em Tianguá, na Serra da Ibiapaba, os presos flagranteados na delegacia regional da cidade serão encaminhados para audiência de custódia ou para a unidade prisional. Desta forma, os presos permanecerão na delegacia apenas o tempo necessário para a lavratura do procedimento e, em seguida, serão encaminhados para a unidade, onde permanecerão recolhidos e receberão alimentação, tendo em vista que o local está plenamente adequado para custódia dos recém-ingressos".

ENTENDA O CASO

O MPCE destacou na fundamentação que a Delegacia Regional de Tianguá abrange todos os municípios da Serra da Ibiapaba, além de Frecheirinha e estaria com déficit de servidores: "dessa forma, como posto de segurança regional, a referida repartição recebe todos os indivíduos presos provisoriamente em qualquer dos municípios sob sua responsabilidade, ou seja, pessoas presas em flagrante, presas devido ao cumprimento de mandados de prisão, menores apreendidos".

"Tendo isso em vista, para além de complementar o que foi aduzido acima quanto à insuficiência de servidores lotados na repartição para a realização de todos os procedimentos necessários, tal informação serve para demonstrar a séria necessidade de se proporcionar tratamento digno a tais indivíduos, o que não é, todavia, efetivado, haja vista que não há o fornecimento, pelo Estado, de alimentação aos presos provisórios"
MPCE

O órgão acusatório considera que "a inércia do Estado afronta a constituição" incidindo na violação de direitos fundamentais: "os custodiados têm sua dignidade continuamente atingida haja vista a premente e crucial necessidade humana de alimentação adequada que não vem sendo atendida"

"Vale ressaltar que, durante a semana, os policiais civis, diariamente, realizam o transporte dos custodiados até o município de Sobral, entretanto, aqueles que são presos após as 17h da sexta-feira, só são transportados à Sobral por agentes da Secretaria de Administração Penitenciária no domingo, período durante o qual não há fornecimento de qualquer gênero alimentício, permanecendo, consequentemente, por vezes, mais de 24 (vinte e quatro) horas sem alimento. Portanto, a realidade que se observa na Delegacia Regional de Tianguá é de puro descumprimento das ordens constitucionais e legais"
MPCE

OFÍCIOS

A SAP e a SSPDS chegaram a enviar ofícios ao Judiciário para comprovar que o fornecimento da alimentação não era de sua responsabilidade.

A Secretaria da Administração Penitenciária destaca no documento que a Delegacia Regional de Tianguá é vinculada à Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social "além disso, traz o dado de que inexiste contrato vigente firmado pela SAP para fins de fornecimento de alimento a presos provisórios custodiados na Delegacia Regional de Tianguá e que os contratos de alimentação vigentes nesta Pasta só contemplam os presos privativos de liberdade sob a tutela desta SAP"

A Polícia Civil do Ceará também comunicou que "não mantém contrato para fornecimento de alimentação de presos provisórios custodiados na Delegacia Regional de Tianguá, mas somente nas Delegacias de Fortaleza e da Região Metropolitana da capital".

O juiz considerou os ofícios e pontuou que o Estado não adotou cautelar necessárias "para suprir alimentação aos presos provisórios que, por vezes, pernoitam na Delegacia Regional de Tianguá aguardando o transporte para a cidade de Sobral, onde realizarão audiência de custódia".

 

 

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