Mainha: justiceiro, pistoleiro ou vingador?
A morte do homem que marcou a era da pistolagem tradicional no Ceará completou 11 anos e permanece sem respostas
Falar de pistolagem no Ceará é revisitar o simbolismo que Idelfonso Maia de Cunha, o ‘Mainha’, deixou após gerações. Ainda em vida, Mainha não admitia ser chamado de matador de gente ou pistoleiro. Se considerava um justiceiro dizendo para os outros que só precisava agir porque “a justiça tradicional não dava conta”.
Mainha morreu enquanto passeava, montado em um burro. Dois homens, ocupantes em um carro preto, atacaram o desafeto, sem chance para defesa. Alguns nomes chegaram a ser apontados como os algozes dele: Manoel Carneiro Neto, o 'Manoel Preto', e José Delano Diógenes, o ‘Delaninho’, que também tiveram o mesmo fim trágico de Idelfonso, anos depois.
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Se fala ainda em um consórcio formulado para financiar a morte do pistoleiro. Quando os maiores inimigos de Mainha se reuniram, não houve chance para que ele se defendesse. Morreu atingido por nove tiros de pistola .40, aos 55 anos de idade, em 2011.
‘Manoel Preto’ chegou a negar que tenha assassinado o rival declarado. Quando detido por outros crimes, falou que queria ter sido ele o autor do homicídio, mas não teve a “oportunidade”. Em 2013, foi morto em uma vaquejada, na cidade de Tabuleiro do Norte.
“NUNCA FUI LADRÃO”
Cerca de 40 mortes são atribuídas a Idelfonso Maia de Cunha. Ele teria fuzilado quatro pessoas em um só episódio, o prefeito de Alto Santo, João Terceiro de Sousa, a primeira-dama, Raimunda Nilda Campos; o motorista do casal, Francisco de Assis, e o soldado PM João Odeon. Desde o fato, passou a ser alvo dos investigadores.
Quanto mais o tempo passava, mais Mainha conquistava seu espaço enquanto ‘lenda na pistolagem’. Sempre negava receber dinheiro pelos crimes que praticava. A recompensa, segundo ele, era “manter sua honra e a da família”.
O pesquisador e sociólogo, César Barreira, conversou com Mainha diversas vezes. O suspeito aproveitava todas as ocasiões possíveis para negar que pertencesse a pistolagem. “Negava matar por dinheiro. Era um vingador que queria uma assepsia social”, diz César Barreira.
“Vamos encontrar no Mainha muitos fatos interessantes. Primeiro, uma relação muito forte, um pacto de sangue com o primo dele, de quem ele teria recebido uma arma. Ele não deixava que tocassem nessa arma, até mesmo quando foi preso pediu aos policiais que não mexessem nela. Era um símbolo para ele”
Negava ser ladrão e matava quem falasse o contrário. “Se reconhecia como autor de cinco crimes, uma a morte de quem matou o pai dele, outra, a de um rival, e as demais de quem espalhava boatos”, conta o pesquisador.
Mainha foi preso em 1988, em Quiterianópolis. Foi a julgamento e condenado a mais de 80 anos de prisão. Ficou preso durante 11 anos.
Em entrevista concedida a TV Verdes Mares no dia do júri, Mainha se manteve em silêncio quando foi questionado sobre se arrepender dos seus crimes.
César Barreira diz não ficar surpreso por a morte de ‘Mainha’ não ter sido solucionada. “Ele sofreu vários atentados, ligados a fatos que ele executou, mas também aos mandantes dele. Ele era um arquivo vivo, tinha muitas informações. Continuamos (a sociedade) com a máxima de que ‘bandido bom é bandido morto’’”, afirma o estudioso.