De 597 PMs denunciados por motim, 22% foram absolvidos e o restante segue em julgamento

Nesta semana, pelo menos 46 policiais militares acusados foram absolvidos sumariamente de crimes militares no movimento

Escrito por Messias Borges , messias.borges@svm.com.br
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Legenda: Os PMs eram acusados pelos crimes de omissão de lealdade militar e atentado contra viatura
Foto: Camila Lima

A Vara da Auditoria Militar, da Justiça Estadual, já absolveu 135 militares acusados de participar do motim de fevereiro de 2020, segundo o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE). O número representa 22,6% do total de agentes de segurança denunciados por crimes militares no movimento, que é de 597, de acordo com a Promotoria Militar. Os processos contra os outros militares estão em andamento.

Ainda conforme o TJCE, dos 135 absolvidos, 116 são praças (suboficiais, cabos, soldados, sargentos ou recrutas) e 19, oficiais (tenentes, capitães, majores, tenentes-coronéis ou coroneis). Eles estão alocados em 22 processos criminais analisados, sendo 15 pelo Conselho Permanente da Vara da Auditoria Militar e 7, pelo Conselho Especial.

Nesta semana, pelo menos 46 policiais militares acusados de participar do motim foram absolvidos sumariamente pelo Conselho Permanente da Vara Militar (formado pelo juiz de Direito Roberto Soares Bulcão Coutinho e por juízes militares), em três sentenças, proferidas entre a última segunda-feira (25) e terça (26). Os PMs eram acusados de crimes militares como omissão de eficiência de força; inobservância de lei, regulamento ou instrução; e omissão de lealdade militar.

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Somente em um processo, foram inocentados 26 PMs. Conforme a sentença, os policiais denunciados estavam de serviço na 1ª Companhia do Batalhão de Polícia de Meio Ambiente (1ª CIA/BPMA), na Avenida Raul Barbosa, em Fortaleza, em 19 de fevereiro do ano passado, quando "um bando de indivíduos, todos usando balaclavas, e conduzindo 20 (vinte) motocicletas e mais algumas bicicletas, chegaram buzinando e dando palavras de ordem".

"Na ocasião, foi visto um dos encapuzados puxar arma de fogo tipo pistola e disparar tiros, tendo o policiamento do BPMA feito uso de espingarda de calibre 12, com munição não letal para reagir à injusta agressão".

Segundo a denúncia do Ministério Público do Ceará (MPCE), um major PM foi "o único agente público que cumpriu com o seu dever de lealdade e de coragem para com a instituição militar e assim enfrentou o grupo delituoso". "Já os demais policiais militares ligados à 1ª CIA/BPMA nada fizeram para evitar que os subversivos levassem a viatura Hilux descaracterizada (identificação das placas preservadas), pertencente aquela unidade militar", completa.

Entretanto, o Conselho Permanente da Vara Militar considerou que "exigir, no caso em análise, a ação enérgica dos militares, quando abordados, é interpretar de modo excessivo os deveres dos militares". 

Como se, em qualquer situação, tivessem que atuar para impedir a tomada do bem ou alguma ação contra ele. É de se considerar as circunstâncias do caso, o clima de tensão da época e o fato de que entre os amotinados havia outros militares que, mesmo que agindo equivocadamente, eram companheiros de farda."
Vara de Auditoria Militar
Em sentença

Ocorrências semelhantes em Baturité e Maracanaú

As outras duas sentenças, com absolvições sumárias, foram proferidas em casos semelhantes. No Município de Baturité, em um Posto Avançado do BPMA, seis PMs de serviço foram surpreendidos por militares amotinados, que furaram pneus de uma viatura, em 18 de fevereiro de 2020. Entre eles, estavam dois policiais militares que também foram acusados por não reagirem à ação criminosa do dia seguinte, na sede da 1ª CIA/BPMA, em Fortaleza.

Já os outros 14 agentes de segurança denunciados pelo MPCE estavam de serviço em Maracanaú, no dia 19 de fevereiro de 2020, quando o 14º Batalhão de Polícia Militar foi invadido e as viaturas tiveram os pneus furados.

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O advogado Cícero Roberto, que representou a defesa de 19 policiais militares absolvidos nos três processos, alegou que os clientes não praticaram ações a favor do motim e que não reagiram aos ataques criminosos para evitarem o confronto.

Ninguém quer ser processado. Já no início do processo, o reconhecimento da absolvição sumária representa uma alegria sem dimensão. Porque vários deles (PMs) estavam proibidos de serem promovidos ao final do ano. E evita o procedimento instaurado na Controladoria (CGD)."
Cícero Roberto
Advogado

Veja a lista dos 46 PMs absolvidos:

TC PM Fábio Lessandro Sena Lima
1º TEN PM Marcilon Lima da Costa
CB PM Marlon Davis Delfino Viana
CB PM Jonathan Peixoto Rodrigues
SD PM Marcos Flávio Furtado de Menezes
SD PM Jorbson Josué Castro da Silva

TC PM Fábio Lessandro Sena Lima
TC PM João Batista Farias
1º TEN PM Talyta Barros Maciel
1º Ten PM Orcelles Rodrigues Vasconcelos Júnior
1º Ten PM Marcillon Lima da Costa
ST PM Ulisses Paranhos Maia Júnior
ST PM José Teobaldo Gomes Júnior
ST PM Augusto César de Souza Silva
1º SGT PM Giulliade de Souza Cesário
CB PM Diego Monteiro de Almeida e Silva
CB PM Wladimir Bandeira da Silva
CB PM Eduardo da Silva Santos
CB PM Carlos Jared Andrade Paiva
SD PM André Amorim de Oliveira
SD PM Paulo Sérgio Costa Maciel
SD PM Fabrício Ramos Serpa
SD PM Caio Fernandes Melo
SD PM Francisco Vilemar de Maria
SD PM Michel Bruno Dantas de Melo
SD PM Dayana Magna de Souza Silva
SD PM Alison Ferreira Oliveira
SD PM Rodger de Menezes Oliveira
SD PM José Antônio Alves Neto
SD PM Francisco Diego de Oliveira Azevedo
SD PM Wilamy Sousa Braga
SD PM Israel Rooseveth Mobley Tavares Scofield

TC PM Júlio César Passos Pereira
TC PM Antônio William Franco de Sousa
ST PM Roberto Cezar Pereira Guedes
ST PM Gilberto Araújo da Silva
1º SGT PM Francisco Gleidson Pereira Olímpio
3º SGT PM Robson Levi de Sousa Góes
CB PM Caio Douglas Paiva dos Santos
CB PM Felipe Gomes da Costa
CB PM Miquéias Alves do Nascimento
SD PM Anderson Weverton de Lima Nunes
SD PM José Evandro Galdino Calixto
SD PM Danrley Reinaldo da Silva
SD PM Cleuton Nascimento da Silva
SD PM Josué Neto Abreu Marques

Estado teve alta de homicídios no motim

motim durou 13 dias, entre 18 de fevereiro e 1º de março do ano passado. Os policiais militares reclamavam da proposta de reestruturação salarial que começou a tramitar na Assembleia Legislativa do Ceará e começaram a se amotinar em batalhões da Capital e do Interior.

Dezenas de viaturas tiveram os pneus furados, para não serem utilizadas. No auge do movimento, o ex-governador do Ceará e senador Cid Gomes tentou furar um bloqueio feito pelos PMs em Sobral, com uma retroescavadeira, e foi alvejado com dois tiros, em 19 de fevereiro.

435%
O Estado registrou alta de homicídios. Durante os 13 dias, foram 321 crimes de morte, o que significa uma média diária superior a 24. Em igual período de 2019, foram 60 homicídios no Ceará, uma média diária superior a 4 crimes. O aumento de um ano para o outro, em casos de mortes violentas, foi de 435%.

Legenda: O prédio do 18º BPM, no Antônio Bezerra, e o entorno do equipamento foram ocupados pelos amotinados
Foto: José Leomar

A insegurança acarretada pelo motim dos militares levou alguns municípios do Estado a cancelarem as festas de Carnaval. A Segurança Pública precisou ser reforçada pelas Forças Armadas e pela Força Nacional de Segurança. Pelo menos 47 PMs foram presos por participação nos atos.

Por fim, os militares entraram em acordo com o Estado e encerraram o motim, após negociações que envolveram a Ordem dos Advogados do Brasil - Secção Ceará (OAB-CE), Defensoria Pública do Ceará e ministérios públicos Estadual do Ceará e Federal (MPF).

Entre os pontos da proposta aceita estão: acompanhamento desses órgãos nos processos administrativos; garantia de um processo devido e justo a todos; e suspensão da transferência de PMs por seis meses. Mas o principal pedido dos policiais amotinados não foi atendido pelo Governo do Estado: a anistia geral.

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