Apaixonada por astronomia, adolescente do interior do Ceará descobre asteroide em programa da Nasa

Maria Larissa, de 16 anos, é estudante da rede pública de Pires Ferreira, e tem o sonho de ensinar a crianças sobre o Universo

Escrito por Theyse Viana , theyse.viana@svm.com.br
Maria Larissa, de 16 anos, sonha em ser astrônoma e ensinar sobre o Universo de forma lúdica
Legenda: Maria Larissa, de 16 anos, sonha em ser astrônoma e ensinar sobre o Universo de forma lúdica
Foto: Arquivo pessoal

“Eu olhava pro céu e queria saber o que tinha dentro das estrelas.” A lembrança-poesia é do primeiro contato de Maria Larissa Pereira Piava, 16, com a Astronomia, ainda pequena. Hoje, ela busca as respostas no céu de Pires Ferreira, no interior do Ceará, de onde alimenta a paixão pelo Universo e o sonho de ensinar a crianças sobre ele.

Larissa estuda, hoje, na Escola Estadual de Educação Profissional Antônio Tarcísio Aragão, em Ipu, município vizinho de onde mora. Junto à série do ensino médio, cursa Administração – mas, com o perdão de todo o clichê, quer mesmo, no futuro, atingir o céu como limite.

Em junho deste ano, ela participou de uma “caça a asteroides” promovida pelo International Astronomical Search Collaboration (IASC), programa da Nasa que busca popularizar a ciência entre estudantes. Num notebook emprestado, já que não possui um, Larissa encontrou um asteroide não detectado antes.

É um trabalho bem árduo, uma análise bem complicada. Marquei mais de 10 pontos que acreditava que eram asteroides, mas só um foi às preliminares. Se ele for detectado mais vezes, vou poder dar um nome.

O processo de numeração e catalogação do asteroide pelo Minor Planet Center (em português, Centro de Planetas Menores), de Harvard, leva de três a cinco anos para ser completado – e não foi a única conquista da cearense em 2021.

Legenda: Certificado de participação na "Caça a asteroides" promovida pela Nasa

Neste ano, Larissa conquistou uma medalha de prata na Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica (OBA), um feito cuja importância dobra de tamanho diante das dificuldades impostas pela pandemia de Covid aos estudos da adolescente.

“Para fazer as atividades na astronomia, usei computadores emprestados. Pra caçar os asteroides também. Mas é realmente muito difícil, fico pensando em quem não tem acesso de jeito nenhum. Essa falta de investimento é um reflexo do Brasil: a ciência está largada às traças”, lamenta.

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“Na pandemia, pensei em desistir”

Os obstáculos para se manter estudando mesmo sob as dificuldades do ensino remoto, usando apenas o celular, fizeram Larissa tropeçar: chegou a pensar em desistir do ano letivo, mas se ergueu e impôs a si a meta de ajudar os colegas a permanecerem na escola.

“Vi que a galera estava se distanciando muito, e não era de se surpreender. Muita gente se distanciava também da ciência: muitos pensam que é chata, inacessível e difícil. Decidi, então, convidar os melhores cientistas que conheço para palestras na escola”, relembra.

Pelas redes sociais, a adolescente contatou os pesquisadores e promoveu o projeto “Dose de Ciência”, que, segundo ela diz, orgulhosa, “teve muita presença, mesmo sem ser atividade obrigatória”.

Legenda: Larissa construindo "foguete" com garrafa pet

A didática, aliás, é como traço genético, corre nas veias de Larissa desde que olhava o céu com a avó, querendo entender as estrelas. O mesmo encantamento de quando pesquisou “Três Marias” e viu do que os astros eram feitos reflete nos olhos ao falar do que quer para o futuro.

Quero trabalhar com ciência e com crianças. Eu era curiosa, e não tinha estímulos, não tinha quem me explicasse. A dor que você sente é a que você nasceu pra curar: e é isso que eu quero fazer.

Na intenção de dar aula de Astronomia aos pequenos, já que “não existe nada mais gratificante do que levar ciência às pessoas”, Larissa apresentou à prefeitura da cidade o projeto “Pires Ferreira nas Estrelas”, para ter apoio e concretizar a atividade que sonha em fazer.

Hoje, aos 16, ironicamente, nunca entrou num avião, e nunca precisou sair do Ceará para saber exatamente aonde quer ir. “Se eu não conseguir vaga na USP em Astronomia, tenho sonho de ir pra fora do Brasil estudar – e voltar pra continuar meus projetos aqui”, sentencia.

Consegui apoio de um ex-engenheiro da Nasa pra ser orientador de uma pesquisa que eu quero fazer, sobre ensino lúdico de Astronomia. Não tem artigo sobre isso, então eu vou fazer meu próprio.

Ser mulher (ou menina) na ciência

Maria Larissa, estudante do interior do Ceará que descobriu um asteroide em programa da Nasa
Foto: Arquivo pessoal

Além de todo o esforço que fazer pesquisa e ciência no interior de um estado nordestino exige, Larissa ainda lida com a soma de mais um: ser mulher – ou menina – nessa área. A adolescente desabafa que "precisa sempre provar o que sabe".

O empoderamento enquanto menina e potencial cientista foi ainda mais fortalecido, segundo ela, com a participação no grupo "InSpace", cuja fundadora é uma mulher e uma das principais premissas é incentivar a participação feminina na ciência.

"Entrei no final do ano passado, não imaginava que seria tão bom. Meu grupo na caçada de asteroides, por exemplo, era só de meninas. Nosso objetivo é democratizar a ciência", finaliza Larissa, que se autodefine como "cientista cidadã, astrônoma amadora e divulgadora científica".

 

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