Enem: idade não reprova
Escrito por
Davi Marreiro
producaodiario@svm.com.br
Legenda:
Consultor pedagógico e professor
E se a idade fosse medida em curiosidade e disposição, quantos anos você teria? Essa provocação volta à cena após levantamento divulgado pela Agência Brasil: o Enem 2025 quase triplicou o número de participantes com 60 anos ou mais. Entre 2022 e 2025, o total de inscritos nessa faixa etária cresceu mais de 190%, somando 17 mil brasileiros que decidiram, corajosamente, enfrentar a segunda maior prova de acesso ao ensino superior do mundo. Mais do que simples curiosidade ou ousadia, esse movimento revela vitalidade intelectual e resistência cultural em uma sociedade que ainda insiste em relegar o envelhecimento às margens da vida produtiva.
Os idosos que se preparam para o Enem desafiam a “lógica” da obsolescência e provam que aprender é antídoto simbólico contra o envelhecimento da esperança. A socióloga Bernice L. Neugarten ajuda a compreender a dimensão dessa superação ao propor a ideia de que não existe uma única velhice, mas múltiplas formas de envelhecer, determinadas por fatores sociais, econômicos e históricos. É o que também confirma estudo internacional publicado na Nature Medicine, ao mostrar que a desigualdade social acelera o envelhecimento cerebral. Em outras palavras: envelhecer não é apenas questão biológica, é também o reflexo de um país que ainda precisa aprender a dar oportunidades em todas as idades.
Como o diabo não força a porta, entra pela brecha, vale destacar o artigo “O direito à educação para idosos no Brasil”, da professora Maria Clara Thomazini. Ela alerta que o ingresso de muitos idosos no ensino superior nem sempre é motivado por realização pessoal, mas por exigências do mercado de trabalho. Cada vez mais, os idosos prolongam sua vida profissional para garantir segurança e qualidade de vida. O reflexo é claro: segundo a Catho, entre janeiro e julho, o número de currículos de profissionais com mais de 60 anos cresceu 42,7% em relação ao mesmo período entre 2024 e 2025.
Celebramos o vigor intelectual, mas ignoramos que, muitas vezes, estudar virou questão de sobrevivência. O Brasil envelhece rápido, amadurece devagar, e o que caduca primeiro por aqui é a sensibilidade social.
Celebramos o vigor intelectual, mas ignoramos que, muitas vezes, estudar virou questão de sobrevivência. O Brasil envelhece rápido, amadurece devagar, e o que caduca primeiro por aqui é a sensibilidade social.
Davi Marreiro é consultor pedagógico