Ministério Público investiga Prefeitura do Eusébio por vacinar jovens contra Covid antes do prazo
Apesar do grupo ainda não estar previsto no Plano Nacional de Imunização, secretário de saúde do Eusébio aponta que ação de imunizar o grupo de 12 a 17 com comorbidades no município foi tomada como proteção emergencial
Após a prefeitura de Eusébio vacinar contra a Covid-19 cerca de 200 adolescentes com comorbidades ou deficiências, acolhidos em instituições municipais, uma investigação por suposto desrespeito ao Plano Nacional de Imunizações (PNI) está sendo apurada pelo Ministério Público do Ceará (MPCE), aponta o promotor de Justiça Eneas Romero do órgão.
A investigação ocorre na promotoria de Justiça do Eusébio, detalha o membro do MPCE. Para Eneas, a situação “não deixa de ser” um caso de fura-fila da campanha de imunização, uma vez que é um modo de desrespeitar o plano nacional ao inserir um grupo que ainda não foi priorizado.
“Pode até ter boas razões, mas essa é uma decisão técnica que deve ser tomada pelo plano nacional. Já pensou se todo município resolve fazer como quiser? De acordo com suas conveniências?”, questiona o promotor.
Consciente da investigação que vai enfrentar, o secretário de saúde de Eusébio, Josete Tavares, explica que a decisão emergencial foi tomada com foco específico para os jovens com comorbidades em um momento em que o Rio Grande do Sul também estava realizando ação similar.
Prefiro responder um procedimento no MPCE para me explicar como gestor porque vacinei, do que eventualmente vir a responder por situação de questionamento doloso ante ao falecimento por complicação da Covid de uma dessas crianças e adolescentes.
Na última sexta-feira (23), o Diário do Nordeste publicou que Eusébio tinha vacinado cerca de 17 adolescentes do Lar Davis Brasil com doses da Pfizer.
A ação teria sido a última de outras promovidas pela Prefeitura para imunizar jovens entre 12 e 17 anos de idade acompanhados pela Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) e pelo Núcleo de Apoio aos Munícipes com Necessidades Especiais (Namme) locais.
À época, o secretário de saúde do município, Josete Tavares, e o coordenador operacional do Lar Davis Brasil, Márcio Gomes, disseram que a instituição enfrentou um surto da infecção em junho, quando sete casos foram confirmados dentre os jovens.
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Decisão por vacinar
Segundo Josete Tavares, a ação tomada pela prefeitura de Eusébio buscava reduzir o risco de contaminação e morte do público de 12 a 17 anos com comorbidades, como diabetes e Síndrome de Down.
No entanto, a inclusão somente foi realizada pelo secretário de saúde do Eusébio após a Anvisa autorizar o uso da Pfizer em jovens acima de 12 anos. A determinação foi informada para outros órgãos do Estado.
Nós optamos por incluir o grupo como uma ação de intervenção, na perspectiva de redução de danos, de riscos e de perdas de risco precocemente em decorrência da Covid.
Conforme detalha, foram encaminhados ofícios à Secretaria de Saúde do Ceará (Sesa), ao MPCE e à Comissão Intergestores Bipartite do Estado do Ceará (CIB). Também foi realizada uma audiência por chamada de vídeo com a Promotoria de Justiça do Eusébio, detalhando o passo a passo a ser adotado.
Registro de Vacinação
O registro da vacinação contra Covid-19 dos adolescentes imunizados no Eusébio foi realizado no Sistema Nacional de Registro de Imunização (SI-PNI), uma vez que era possível anotar a data de nascimento, a situação de comorbidade ou deficiência do adolescente e manter o monitoramento da vacina.
No Ceará, o sistema estadual ainda não permite esse acompanhamento. “Há uma contradição, a plataforma de saúde do Estado permite que a gente registre de 12 anos em diante, só que quando vou fazer o monitoramento da vacina, não aparece ainda o grupo etário para eu fazer o monitoramento”, detalha.
Fura-filas no Ceará
Após a imunização dos adolescentes entre 12 e 17 anos institucionalizados no Município de Eusébio, o MPCE declarou, em nota, a investigação considera "que ainda não há previsão para vacinação de menores de 18 anos no Plano Nacional de Imunização e nem no Plano Estadual”.
No Ceará, as Promotorias de Justiça do Estado já concentram 221 procedimentos instaurados em pelo menos 67 municípios, entre 21 de janeiro até 15 de junho de 2021, por conta de irregularidades no respeito à fila de vacinação contra Covid-19, conforme o MPCE, por meio do Centro de Apoio Operacional da Saúde (Caosaúde).
Para o promotor de Justiça Eneas Romero, a decisão da secretaria de saúde do Eusébio não cabe aos municípios, devendo ser uma ação nacional, estadual e ainda assim ser pactuado CIB.
A CIB toma decisões em consenso. Então, não cabe a nenhum secretário comunicar que vai fazer. Ele tem que seguir as decisões da CIB e não há nenhuma decisão determinando a vacinação de adolescentes e nem poderia haver porque o plano nacional e o plano estadual não autorizam.
Com isso, surge inclusive o problema de distribuição das doses, já que ainda não chegou vacina específica para esse grupo por não estarem aptos a se vacinarem dentro do PNI. “Nenhuma dose veio para esse público e não está nem sequer previsto no plano", detalha Eneas.
A decisão de vacinar o grupo, portanto, pode ter retirado doses de grupos que atualmente deveriam ter recebido os imunizantes contra Covid-19. Ao fim da investigação, o promotor explica que o caso poderá ser considerado como de improbidade administrativa.
"Vai ter que se discutir uma avaliação, no caso, pelo promotor titular, se é o caso de improbidade ou de algum outro tipo de ação e tem que saber a circunstância específica”, finaliza.
Denúncias ao MPCE
Dentre as denúncias gerais de irregularidades estão inseridas a investigação das situações em que pessoas não inseridas no grupo prioritário recebem a vacina, como prefeitos, secretários e gestores municipais ou outras pessoas que não estavam no grupo apto a receber o imunizante.
O MPCE também já entrou com ações visando responsabilizar aqueles que, por algum motivo, cometeram irregularidades após o início da vacinação contra a Covid-19 nos municípios de Jijoca de Jericoacoara, Acarape e Caririaçu.
O MPCE também apura as situações em que há uma possível ilegalidade na distribuição de vacinas; no descumprimento na ordem de imunização; no desrespeito à fila ou mesmo uma possível fraude de pessoas que receberam mais do que duas doses de vacina.