Comunidades pesqueiras no Ceará têm dificuldades para manter a subsistência durante pandemia
Com a proibição temporária das feiras livres e o fechamento do comércio, a comunidade pesqueira é diretamente afetada, já que tem na venda de peixes a principal renda, estaca a Defensoria Pública, que cobra medidas emergenciais
Mais de 300 comunidades de pescadores estão sofrendo os efeitos da pandemia no Ceará, com dificuldades para manter a subsistência e, portanto, cuidados pessoais necessários para evitar a contaminação pelo novo coronavírus, segundo a Defensoria Pública do Ceará. Com a proibição temporária das feiras livres e o fechamento do comércio, a comunidade pesqueira é diretamente afetada, já que tem na venda de peixes a principal renda.
Só em Aracati, com três comunidades tradicionais: Quilombola do Cumbe, Vila da Volta e a Comunidade de Sítio Canavieira, são mais de 600 famílias afetadas, informou a Defensoria. No município, os defensores públicos vêm expedindo ofícios e pedidos de providências para que a situação das famílias não seja agravada.
Impacto na saúde coletiva
E os impactos se acumulam, já que as comunidades ainda sofrem as consequências do crime ambiental de derramamento de óleo no litoral nordestino, ocorrido em 2019.
"Se a soberania alimentar das comunidades tradicionais pesqueiras do litoral já estava afetada em 2019 com a poluição ambiental, o cenário da pandemia avançou as dificuldades para outros territórios", apontou a agente pastoral do Conselho Pastoral dos Pescadores – Regional Ceará (CPP), Diana Maia.
A ouvidora geral externa da Defensoria Pública, Antônia Mendes, alerta para a falta de alternativas da comunidade.
“As comunidades pesqueiras estão produzindo, mas desde que as autoridades determinaram o isolamento social devido ao novo coronavírus, os pescadores não estão conseguindo vender sua produção, porque o comércio local e as feiras livres estão fechadas. A falta de renda também os impede de comprar produtos de higiene e limpeza necessários para se prevenir da pandemia”, comenta.
Segundo Mariana Lobo, defensora pública supervisora do Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas, desde o ano passado existe um debate sobre o impacto na saúde coletiva dos pescadores e pescadoras.
“Se formou um coletivo que conta com a presença das comunidades atingidas, movimentos populares, pastorais sociais, movimentos ambientalistas e pesquisadores. Agora com a pandemia, a situação dessas comunidades se agravou, porque nem mais do turismo elas estão podendo tirar o sustento. Precisamos pensar medidas emergenciais e a execução de planos de monitoramento desta população”, sustenta a defensora.
O Diário do Nordeste entrou em contato com a Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) para obter informações sobre medidas de assistência implementadas diretamente nas comunidades pesqueiras, mas a Sesa informou que a competência é da Secretaria do Desenvolvimento Econômico e Trabalho do Ceará (Sedet). O Diário questionou a Sedet, mas até a última atualização da reportagem não obteve resposta.
Mais de 10 municípios passam por dificuldades
O Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas da Defensoria, a Ouvidoria Externa da instituição e a Defensoria Pública da União se reuniram com representantes do Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP) das comunidades tradicionais pesqueiras dos municípios de Aracati, Aiuaba, Beberibe, Crateús, Independência, Fortim, Parambu, Tauá, Tamboril, Quiterianópolis, Nova Russas e Novo Oriente.
No encontro, representantes afirmaram que comunidade vem sendo assistida por iniciativas solidárias não governamentais.
"No ano passado, já não tivemos assistência imediata com relação ao derramamento do óleo. Hoje, com esse cenário mais grave, nada mais justo que chamar a atenção para a nossa situação. Alguns municípios têm ações pontuais com a distribuição de cesta básica, mas nada muito concreto. Hoje essas comunidades estão sendo mais ajudadas por ações solidárias de organizações não governamentais que atuam nesses territórios”, revela Diana Maia.
Nas regiões onde não existe atuação da Defensoria Pública, os ofícios solicitando medidas emergenciais foram emitidos pelo Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC).
Projeto para auxílio aguarda sanção do presidente
A Secretaria de Aquicultura e Pesca (SAP), do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) informou que "tem trabalhado para minimizar os efeitos da pandemia", e que o segmento do pescado foi incluído como atividade essencial na Portaria nº 116, de 26 de março, que define os serviços, as atividades e os produtos considerados essenciais pelo Mapa.
"O pescado está enquadrado nesta regra e, apesar do desaquecimento do consumo, por ocasião das medidas de distanciamento social, não há desconexão da atividade com a produção de alimentos já resguardada pela medida. No que se refere à renegociação de dívidas, a Secretaria tem mantido conversações com representantes do Ministério da Economia para ampliar as condições de renegociação de dívidas adquiridas, bem como possibilitar condições semelhantes àquelas ofertadas, neste cenário de crise, pelo Programa Nacional de pelo Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf)", informou o órgão.
Outra medida é a extensão do pagamento do auxílio emergencial R$ 600 aos trabalhadores dessa cadeia produtiva.
"O projeto já aprovado pelo plenário do Senado, no último dia 22 de abril (e já aprovado pela Câmara dos Deputados) aguarda sanção presidencial. No texto, foram incluídos o pagamento da ajuda para pescadores profissionais e artesanais, aquicultores, marisqueiros e os catadores de caranguejos", esclareceu o Mapa.