Prazo de permanência e confinamento solitário: o que muda no presídio de segurança máxima do Ceará
Advogados destacam que a permanência em presídio de segurança máxima não pode ser a critério da administração penitenciária, e sim do Judiciário
A Justiça do Ceará determinou que a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) crie uma regulamentação específica de inclusão e permanência de internos na Unidade Prisional de Segurança Máxima, no Ceará. Inaugurada há um ano e dois meses, a unidade prisional funciona sem ato normativo específico "para disciplinar o cotidiano dos presos e os critérios para a sua inclusão", de acordo com o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE).
O Instituto Anjos da Liberdade pediu providências em abril deste ano e apontou irregularidades no equipamento. Sob a análise e decisão da Corregedoria de Presídios da Comarca de Fortaleza, a Justiça determinou no último dia 5 deste mês que a SAP estabeleça mudanças, que vão desde a decisão de qual preso fica na unidade de segurança máxima até a forma de como acontece o banho de sol.
As advogadas Almerivânia Ferreira e Alexandrina França, que protocolaram a petição, consideram que a decisão será um "divisor de águas". Para elas, o regime adotado atualmente é "extremamente cruel e desumano”. “Não reflete os objetivos de ressocialização constantes na Lei de Execução Penal (LEP). O meio utilizado para punir o preso ultrapassa os limites da pena privativa de liberdade".
"Uma das ilegalidades que podemos constatar em atendimento jurídico e que nos foi repassado foi isolamento contínuo, banho de sol na extensão da própria cela, proibição de conversar com outro preso. Protocolamos a petição no dia 19 de abril de 2022, na oportunidade em que o Instituto Anjos da Liberdade atuou em um ato de manifestação em frente ao Fórum Clóvis Beviláqua, em protesto as arbitrariedades que estariam acontecendo no sistema prisional cearense"
DETALHES DA DECISÃO
Consta no documento, assinado pelo corregedor-geral de Presídios de Fortaleza e Região Metropolitana, juiz Raynes Viana, e pela juíza Luciana Teixeira, corregedora-auxiliar, responsável diretamente pela fiscalização daquela Unidade. a necessidade de regulamento do prazo máximo de permanência de medida imposta pela unidade.
"Também fica vedada a previsão de confinamento solitário prolongado ou indefinido (proibição absoluta de comunicação entre os internos) e de banho de sol em áreas contíguas às próprias celas, devendo se dar no pátio destinado a tal finalidade", comunicou o TJ.
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A decisão indica que a SAP realize imediatamente a transferência dos internos em cumprimento de pena em regime semiaberto para unidades prisionais adequadas ou efetue a instauração dos respectivos procedimentos para sua submissão ao Regime Disciplinar Diferenciado (RDD).
"A pasta deve comunicar sobre a disponibilização do banho de sol a todos os internos de forma não individual e no espaço adequado, bem como sobre a cessação da obrigatoriedade de incomunicabilidade absoluta entre os internos, podendo, todavia, estabelecer limitações nos moldes definidos segundo a referida regulamentação"
Em entrevista ao Diário do Nordeste, Raynes Viana explicou que "para não gerar qualquer abalo à ordem ou prejuízo à rotina do sistema prisional, foram estabelecidos prazos para o atendimento das determinações, os quais ainda estão em curso".
ALERTA
O presidente da Associação Nacional da Advocacia Criminal Regional Ceará (Anacrim-CE), advogado Alexandre Sales, explica que a partir da decisão, a administração penitenciária precisa pedir ao juiz que determinado preso seja conduzido à unidade de segurança máxima: "até mesmo a retirada, a saída, precisa ser regulada pelo juiz".
"Se a unidade prisional é encarada para que o preso pague por ação disciplinar, essa ação precisa ser subordinada ao Judiciário. Não só porque acham que ele é perigoso, mas essa permanência deve ser autorizada e o juiz decidir quanto tempo essa pessoa pode ficar lá"
O Conselho Penitenciário do Estado do Ceará (Copen) ressalta que a forma de lidar com os presos "tidos como mais perigosos" vinha "extrapolando as normas e os limites fixados pela Lei de Execução Penal".
Ruth Leite, presidente do Copen, afirma que o Conselho vinha "batendo na tecla" sobre a necessidade da fundamentação: "existe a falta de autorização legal para o regime diferenciado, o que gera a não-convivência com os outros, o não ter contato com a família".
Para o juiz corregedor, a decisão de fixar normas claras irá facilitar a vinculação dos presos que lá se encontrarem a um sistema legal de direitos e deveres. "Ainda, algumas proibições -como a permanência dos internos em isolamento quase absoluto - repercutem em aspectos de dignidade e saúde física e mental", acrescentou.
A SAP ainda deve instaurar imediatamente os processos para apreciação judicial sobre a situação dos presos já reclusos na unidade, de acordo com a decisão judicial. A Pasta foi procurada para comentar as mudanças, mas não se posicionou até a edição desta matéria.