Foi preciso reviver a dor para que a Justiça seja feita, diz mãe de vítima da Chacina do Curió

Familiares aguardam decisão do júri, que está reunido desde a manhã deste sábado (24)

Escrito por Igor Cavalcante, Messias Borges, Beatriz Irineu ,
Mães aguardam decisão do júri
Legenda: Mães aguardam decisão do júri
Foto: Messias Borges

Enquanto aguardam uma decisão do corpo de jurados, as mães das vítimas da Chacina do Curió comentaram sobre os seis dias consecutivos de julgamento e a expectativa sobre o resultado do caso.

Neste primeiro júri, quatro policiais militares são julgados na 1ª Vara do Júri de Fortaleza. A expectativa é de que o desfecho seja dado ainda neste sábado (24).

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Edna Souza, mãe de Álef Sousa Cavalcante, morto aos 17 anos, disse que o momento mais difícil do julgamento foi reassistir gravações apresentadas pela acusação dos momentos de socorro às vítimas.

"Foi muito duro, ninguém quer reviver a história, mas foi preciso para que o júri visse as imagens, para que haja justiça"
Edna Souza
Mãe de Álef Sousa Cavalcante, morto aos 17 anos

Os vídeos foram exibidos na última sexta-feira (23) e emocionou quem estava presente na sessão. Os familiares das vítimas chegaram a deixar o salão do júri. 

As imagens de câmeras de rua mostram vários jovens estirados no chão ou sendo socorridos em carros, muitos deles baleados - e já mortos. O MP também reproduziu áudios que buscam provar a atuação de policiais na chacina.

"Reviver aquele momento foi muito devastador, ainda não nos recuperamos, ao longo dos anos não nos recuperamos"
Maria Suderly de Lima
Mãe de Jardel Lima dos Santos, morto aos 17 anos

O grupo de familiares das vítimas participou de um ato em homenagem aos adolescentes e jovens mortos na chacina. Autoridades públicas também participaram do ato, entre elas a secretária dos Direitos Humanos do Ceará, Socorro França, o deputado estadual Renato Roseno (Psol) e a promotora de Justiça Joseana França.

Edna Souza, mãe de Álef, comentou sobre a mobilização. "É importante que continue, é o apoio que temos da sociedade civil, dos movimentos, dos parceiros, é importante que tenha essa manifestação", disse.

O direito de defesa que não foi dado às vítimas

Maria Suderly de Lima disse ainda que espera apenas que a justiça seja feita. 

"Esperamos que a justiça prevaleça, seja ela qual for. Eles (réus) estão tendo o direito de defesa. Se esse direito tivesse sido dado aos nossos filhos, hoje eles não estariam aqui e nossos filhos estariam vivos", comentou.

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Decisão

Pouco depois das 10 horas deste sábado, quando o julgamento foi retomado, os jurados foram direcionados a uma sala secreta para decidir sobre o caso.

Ao todo, o júri irá responder a 365 perguntas sobre os quatro réus, que foram acusados de 18 crimes. Não há previsão de horário para a conclusão da votação.

A defensora pública geral Elizabeth Chagas explica o trâmite nesta fase do júri.

"Hoje é a fase da quesitação, que são mais de trezentos quesitos que são indagados aos jurados. São tantos porque é preciso delinear a autoria e a materialidade do crime. São quatro réus, são muitos fatos a serem indagados, então cada fato desse vai se relacionar com perguntas. Esse esquisito são perguntas que são feitas e cuja resposta vai indicar se houve o crime, começa por aí, se houve as mortes, se foi o réu, todas as perguntas são para que se tenha uma relação ou não dos réus com o crime", afirma.

Quem também esteve no local acompanhando o julgamento neste sábado foi o Procurador-Geral de Justiça do Ceará, Manuel Pinheiro.

“Este julgamento tem uma importância histórica não apenas para reparar a dor dessas famílias, mas também para sinalizar para frente sobre como nós vamos nos comportar em relação à violência policial. O resultado deste julgamento transcende o caso concreto”, disse.

“Estamos confiantes no julgamento que os membros do conselho de sentença irão acolher a tese do Ministério Público pela condenação que essa é uma situação que atingiu onze pessoas inocentes que perderam suas vidas, atingiu mais sete vítimas sobreviventes, atingiu toda a comunidade, da Grande Messejana, atingiu Fortaleza, o Ceará e o Brasil”.
Manuel Pinheiro
Procurador-Geral de Justiça do Ceará

O sociólogo e coordenador do Comitê de Prevenção a Violência da Assembleia Legislativa do Ceará, Thiago Holanda, afirmou que o Comitê vem monitorando, chamando atenção e propondo recomendações pra que casos como esse, [Chacina do Curió] que trouxeram ainda mais evidências que eles já estavam coletando no campo de pesquisa, se transformem em recomendações de política pública e que "se consiga estruturar realmente uma política que dê resposta a isso".

"Chegar aqui ao júri, a essa responsabilização, desse crime tão brutal, também é uma forma da gente pensar que a responsabilização, ela é importante pra passar uma mensagem de que não se pode, né? Principalmente agente do estado, matar aleatoriamente, pessoas, principalmente, jovens da periferia", afirmou.

Desde sexta-feira (23), a sessão estava suspensa  após a leitura dos quesitos que antecedem a votação dos jurados. Durante cerca de duas horas os magistrados leram cada um dos pontos dos quesitos.
 

Julgamento: veja resumo dia a dia

1º dia (20/06)

No primeiro dia de sessão do Júri, foram ouvidas três vítimas e duas testemunhas de acusação em sessão que durou 12 horas. Depoimentos violentos lembraram agressões e alvejamentos até de quem tentava socorrer vítimas feridas, na noite da chacina.

2º dia (21/06)

Na quarta-feira, foram ouvidas sete testemunhas arroladas pela defesa dos acusados, que buscaram ressaltar boa trajetória dos PMs na profissão e na vida pessoal. Ao fim do dia, chegou-se a 22 horas de julgamento.

3º dia (22/06)

Os réus Antônio José de Abreu Vidal Filho, Marcus Vinícius Sousa da Costa, Wellington Veras Chagas e Ideraldo Amâncio prestaram depoimento. Eles chegaram a se emocionar durante os interrogatórios e negaram participação nos crimes

Todos, por orientação da defesa e por direito deles, não responderam às perguntas do Ministério Público, para o qual há provas nos autos que "os colocam no local dos fatos". Eles responderam apenas ao colegiado de juízes e aos próprios advogados. O julgamento acumula 32 horas de duração.

4º DIA (23/06)

Acusação (MPCE e Defensoria Pública do Ceará) e os advogados de defesa protagonizaram os debates. A acusação dispensou a réplica e a sessão terminou com a leitura dos quesitos, momento que antecede a votação dos sete jurados.

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