Centros e promotorias do Ministério Público do Ceará (MPCE) solicitaram, nesta terça-feira (15), por meio de dois ofícios, que o pastor Davi Goés, do Ministério Canaã da Assembleia de Deus, em Fortaleza, seja responsabilizado civil e criminalmente por disseminar notícias falsas sobre a vacina chinesa CoronaVac. Em um vídeo que circula nas redes sociais, o religioso afirma que a vacina pode causar câncer e possui o HIV dentro dela.
O vídeo foi divulgado pela reportagem, mas foi retirado do ar, nesta quarta, pelo YouTube por "ferir a política de informações médicas relacionadas à COVID-19".
Em entrevista ao Sistema Verdes Mares, o pastor declarou estar sendo vítima de Fake News proposital. "Alguém de muito má vontade alterou uma aula de 40 minutos em um vídeo sem os embasamentos que eu usei. Não afirmei nada, apenas informei à Igreja", relatou.
Davi Góes cita matérias científicas internacionais que justificam a fala realizada durante o vídeo. O Pastor diz "ter feito uso de seu direito constitucional de liberdade de expressão, emitindo sua opinião pessoal, cabendo a cada um dos membros analisar e ponderar as informações repassadas, inclusive as científicas".
A Secretaria da Saúde do Estado do Ceará (Sesa), a quem o ofício da esfera civil enviado, confirmou o recebimento do ofício do Ministério Público e que, após análise do expediente, responderá a solicitação do órgão dentro de sua competência.
Conteúdo
"Muitas pessoas vão morrer de câncer, achando que foi câncer porque comeu alguma coisa, porque foi hereditário, porque tem família, por causa de um tumor, mas na verdade foi por causa da vacina. Depois que essa substância entrar no nosso organismo vai atingir o nosso DNA, um cientista francês disse que até HIV tem dentro dela", disse o pastor no vídeo.
De acordo com o MPCE, a conduta do líder religioso fere a lei de contravenções penais sobre provocar alarde, anunciar desastre ou perigo inexistente, praticar ato capaz de produzir pânico ou tumulto além de descumprir uma lei estadual que responsabiliza quem dissemina notícias falsas relativas à pandemia de Covid-19 regulamentada em maio deste ano.
O MP afere também que o pastor cita, na ocasião em que foi filmado o vídeo, matéria científica vinculada em alguns portais e canais de vídeo da internet. O promotor de Justiça e coordenador do Centro de Apoio Operacional de Defesa da Cidadania (CAOCidadania), Enéas Romero de Vasconcelos, explica que o promotor titular que acatar o ofício da esfera criminal deve decidir, mas ainda sem previsão de data.
Em caso de responsabilização por contravenção, o acusado é punido com multa ou prisão que pode variar de 15 dias a seis meses.
Para Enéas, é preciso lembrar o papel social de cada um. "Se eu preciso de auxílio na saúde, devo procurar um médico. Se preciso de auxílio espiritual, procuro um pastor. Quem não sabe da área de outro, não fala", defende.
"Se uma única pessoa ali presente na Igreja durante a gravação concordar com o dito por ele, deixar de se vacinar e ficar doente, isso é gravíssimo. É preciso ter muita responsabilidade. E acho que o pastor, antes de qualquer coisa, deveria se retratar, assumir. Não existe nenhuma evidência científica séria de que a vacina contra o Covid-19 altere DNA, ou transmita doenças", conclui o promotor.
Para Caroline Parahyba, membro da Comissão de Saúde da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-CE), mesmo que a fala tenha sido embasada, deve ser levada em consideração o ato de falar para muita gente, podendo influenciar negativamente pensamento coletivo a respeito da vacina.
Esse procedimento que se refere à esfera criminal foi elaborado pelo Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Defesa da Cidadania, do Idoso, da Pessoa com Deficiência e da Saúde Pública (Caocidadania), Centro de Apoio Operacional Criminal (Caocrim) e pelas Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde.
O segundo ofício, encaminhado à Sesa, cita que a conduta do pastor fere a Lei Estadual nº 17.207/2020, regulamentada pelo Decreto 33.605, de 22 de maio de 2020 e que trata da responsabilização para quem dissemina notícias falsas relativas à pandemia.
O pastor afirma não ter recebido ainda nenhuma notificação oficial dos órgãos, e frisa que seus advogados cuidarão do assunto.