Divergência de dados é apontada como razão para 3 cidades do CE terem vacinas contra Covid retidas

Apenas Trairi, Tururu e Tarrafas não atingiram a meta da primeira dose, segundo a Sesa

Escrito por André Costa e Honório Barbosa , regiao@svm.com.br
Legenda: As doses serão liberadas quando os municípios atingirem a meta de 85%
Foto: Diário do Nordeste

No início deste mês, 37 cidades cearenses que não haviam aplicado 85% das primeiras doses da vacina contra a Covid-19 tiveram o envio de novos imunizantes retido. Passados sete dias desde a decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5), três municípios, segundo a Pasta, ainda não atingiram a referida meta. No entanto, gestores se defendem e afirmam que há uma leitura errada das informações, enquanto especialistas alertam para o risco de aumento da transmissão do vírus devido à morosidade da vacinação.

A presidente do Conselho de Secretários Municipais de Saúde (Cosems-CE), Sayonara Moura Cidade, que se mostra contrária a decisão a qual classificou como “arbitrária e descabida”, explica que o prazo para atualização no sistema é curto e muitas cidades enfrentam dificuldades e limitações no acesso à internet. 

“As pequenas cidades precisam de prazo, pois enfrentam falta de suporte de internet, de informática e de pessoal, além de dificuldades em períodos chuvosos de chegar às áreas distantes, isoladas na zona rural, uma vez que a imunização é feita em domicílio da pessoa idosa”, detalhou a representante o Cosems.

Se a vacina é aplicada e no mesmo dia o sistema não é alimentado com essa informação, fica como se aquela cidade não tivesse alcançado a meta. Isso é um absurdo 
Sayonara Moura
Presidente Cosems

A presidente do Cosems critica a retenção e pondera que “nenhum município tem interesse em não vacinar". Sayonara acrescenta ainda que, antes da medida ser aplicada pela Sesa, “faltou pedido de informações aos municípios sobre o porquê de não se alcançar a meta de 85% para determinado grupo prioritário”. 

Em nota, a Sesa explica que "o horário acordado previamente foi de 12h para preenchimento [dos dados de vacinação], sugerido por alguns municípios". Após esse período, quem não atualizar os dados ficará, naquele dia, com a porcentagem da última atualização.

O secretário da Saúde de Tarrafas, João Deniciano Mendes Araujo disse que ficou "surpreso" com a retenção e que "a Secretaria do Estado não entrou em contato com o Município". Ainda segundo o gestor, a vacinação em Tarrafas está em "ritmo acelerado".

"O último lote recebido foi com 1.434 doses e já aplicamos 1.289. Uma taxa superior a meta [85%]. Todos os nossos idosos acima de 70 anos já receberam a vacina. Portanto, não entendo o motivo dessa retenção", esclarece Deniciano.

O secretário disse que vai enviar um ofício à Sesa pedindo explicações e, acrescenta que, "além da doses estarem sendo aplicadas, há divergência de dados". O gestor confidencia que, segundo a Secretaria do Estado, Tarrafas têm 257 profissionais na saúde, enquanto o Município diz ter 174. "Como vou vacinar quem não existe? Desse jeito a gente realmente não bate a meta", critica.

A secretária da Saúde de Tururu, Rozzana Tabosa também relata que houve erro no quantitativo de doses envidas. Segundo ela, o Município tem 180 profissionais da saúde cadastros, "mas foram enviadas 280 vacinas. Então, o índice naturalmente cai", explica.

Outra divergência apontada por ela diz respeito ao número de quilombolas. Segundo Rozzana, são 780 e a Sesa teria enviado 2.630 doses. A gestora garante que todos os grupos prioritários estão sendo vacinados de forma "celere". "Não há fila de espera para idosos acima de 75 anos e, nos profissionais da saúde, todos já foram vacinados", conclui.

A  Secretaria da Saúde do Estado explicou que cabe ao município "reunir-se com as lideranças quilombolas e documentar as estimativas populacionais de cada quilombo". Havendo divergência nos números, como é o caso apontado por Tururu, a Sesa deve ser informada via ofício. "Já enviamos o ofício e estão esperando a liberação das 40 doses retidas", pontuou Rozzana Tabosa.

A mesma divergência de números é apontada pela coordenadora da Atenção Primaria da Saúde de Trairi, Dayana Sales. Segundo ela, o Município conta com 78 quilombolas, enquanto a Sesa teria enviado quase 170 doses para este grupo prioritário. Quando os imunizantes foram retidos, a Secretaria da Saúde de Trairi "realizou um novo mapeamento da quantidade de quilombolas e enviará um ofício para a Sesa", disse Dayana.

Ainda segundo ela, os demais grupos prioritários a vacinação "está acima da meta". Ela cita os índices de "89,35% para os profissionais da saúde e 93% para os idosos acima de 75 anos". Conforme a coordenadora, esses números são do boletim do último dia 6 e "devem sofrer atualização nesta quita-feira (8). 

O secretário da Saúde de Trairi, Márcio Alves Ribeiro, destaca que a cidade tem "20 equipes de vacinação e mais uma volante" e acrescenta que a imunização no Município está contemplando as metas estabelecidas. 

Diálogo 

Nesta terça-feira (6), a Sesa se reuniu com representantes do Cosems e gestores municipais e estaduais para deliberar medidas acerca da vacinação. Ficou acordado que, quando houver divergência de números entre meta e população vacinada, "deverá ser enviado um oficio para a Área Descentralizada de Saúde (ADS) responsável, solicitando a correção de meta e documentando essa alteração".

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A Pasta informou que "após o recebimento do documento, a Sesa irá analisar junto o Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial (CEPIR) e a Assessoria Especial de Acolhimento aos Movimentos Sociais do Ceará, a necessidade de remanejamento de doses"

A Secretaria do Estado ressalta ainda que o Vacinômetro é de domínio público e "deve ser utilizado como estratégia de acompanhamento e tomada de decisão pelos gestores". Além disso, a Pasta informou que, através da sua Plataforma de Regionalização, fornece apoio aos municípios pelas Superintendências Regionais e Áreas Descentralizadas de Saúde que possuem células específicas de vigilância em saúde.

Impacto na descontinuidade da imunização 

Para Caroline Gurgel, virologista, epidemiologista e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), a descontinuidade do processo de vacinação pode trazer diversas implicações. Ela cita que, ao deixar um grupo, ou localidade descoberta, há o risco de surgir o novo epicentro da doença.

Esse vírus tem uma transmissão super rápida. Então se não houver a vacinação de forma rápida e em massa, teremos potenciais agentes transmissores do vírus. 
Caroline Gurgel
Epidemiologista

A especialista alerta que por mais que essas cidades - referindo-se às 4 que estão com doses retidas - sejam de pequeno ou médio porte, há um intenso fluxo de pessoas no Estado, o que pode acarretar a continuidade do período crítico da pandemia.

"Uma pessoa não vacinada e, consequentemente, vulnerável, pode se contaminar em um grande centro e levar o vírus até as cidades menores. A única solução é vacinar muito e de forma rápida", avalia Gurgel. Outro fator destacado por ela, é a possibilidade de novas variantes surgirem. 

"Imagina-se que a Coronavac tenha boa resposta para as variantes atuais. Mas, não sabemos até que ponto, então o grande objetivo não é acabar com o vírus, pois ele continuará circulando na sociedade, mas sim evitar o surgimento de novas cepas, e isso só será possível com a imunização geral", conclui. 

Entenda o caso

A meta estipulada pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5), para acelerar a campanha e permitir envio de mais doses é de 85% de vacinação dos imunizantes recebidos para as primeiras doses. Por decisão judicial, a Sesa suspendeu o envio de doses para as cidades que não alcançaram o mínimo percentual definido. 

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