Professores protestam contra aprovação de projeto de lei que exige testes psicológicos da categoria
Relator do projeto, que havia dado parecer favorável, protestou contra, ao lado dos professores. Categoria considera a proposta discriminatória e inconstitucional
Professores da rede municipal de ensino protestaram na Câmara Municipal de Fortaleza, na manhã desta terça-feira (31), contra a aprovação do Projeto de Lei 0522/2018, segundo o qual a Prefeitura de Fortaleza está autorizada a submeter os trabalhadores da Educação da rede municipal a testes psicológicos e psiquiátricos a cada ano.
O relator do projeto, o vereador Dr. Vicente (PT), que antes havia dado parecer favorável à proposta, esteve com os professores no protesto, se colocando contrário ao projeto.
De autoria do vereador Jorge Pinheiro (PSDB), o projeto de lei foi aprovado pela Câmara na semana passada e seguiu para sanção do prefeito José Sarto, que na segunda-feira (30), que decidiu vetar a proposição. A proposta é criticada por professores e pelo Conselho Regional de Psicologia.
O argumento é que, na prática, há problemas que vão desde aspectos técnicos à falsa ideia de que é possível prever que pessoas estejam suscetíveis a surtos e problemas mentais agudos apenas com a realização de testes.
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A categoria pede que o legislativo rejeite a pauta, que irá para a redação final. Para a professora Ana Cristina Guilherme, presidente do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação do Ceará (Sindiute), o projeto é inconstitucional, uma vez que um vereador não pode legislar sobre o orçamento do Município.
"Esse projeto já tem um vício de origem porque quando ele determina uma norma de examinar todos os trabalhadores em Educação anualmente precisa de custeio desse projeto. Vai ser financiado por quem esse aparelhamento da saúde? Porque não é pouca coisa você ter que fazer anualmente um exame psicológico e psiquiátrico de todos os trabalhadores da Educação. Então, primeiro de tudo, ele já é inconstitucional porque o vereador não pode legislar o orçamento do Município. Aí a gente já pergunta de qual [setor] vai ser o orçamento, porque não pode ser o da Educação, e a Saúde nós estamos vendo que não está dando conta de atender a demanda do povo de Fortaleza", criticou.
Categoria alega discriminação
Ainda conforme a líder do Sindiute, a proposição tem caráter discriminatório contra a categoria por considerar professores um risco às escolas, ao invés de propor políticas de apoio à saúde dos trabalhadores.
"A gente entende que há um adoecimento social, reconhecemos isso, mas não há nada na nossa categoria, percentualmente, maior que nas outras. Então por que só os professores? [...] Ele [projeto] não está propondo uma política de saúde da Educação, que seria interessante, não é uma preocupação com a saúde dos alunos, dos professores, não é isso. Ele coloca como se houvesse uma pesquisa feita por ele de índices alarmantes de professores doentes psiquiátricos que oferecem risco às escolas, e não podemos tolerar porque achamos que isso é discriminação. E nós lamentamos muito esse consenso da Câmara de votar esses projetos de aberrações indicativas", afirmou.
Posição dos vereadores
Contrária à matéria, a vereadora Adriana Gerônimo (PSOL) sinalizou que ela representa uma ameaça aos trabalhadores, já que infringe diretrizes de organismos que são referências no assunto e até a própria legislação brasileira.
"Primeiro, o problema principal desse projeto é que ele vai na contramão de uma política de saúde mental que está alinhada com as normativas que garantam a proteção dos direitos humanos. Então, ele não representa uma política de saúde mental humanizadora", sinalizou a parlamentar.
Ela foi adiante: "Segundo, há problemas técnicos que ferem normativas do Conselho Federal de Psicologia (CFP), que hoje não autoriza que testes psicológicos ou psiquiátricos sejam feitos de maneira indiscriminada".
Adriana também fez uma última pontuação. "O terceiro é que esse projeto foi elaborado em 2018, quando a gente ainda não tinha a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Esse projeto prevê que a Secretaria Municipal de Educação guarde esses testes psicológicos e psiquiátricos como se fosse em um arquivo morto, então isso fere a LGPD", disse.
Pinheiro, proponente do projeto, foi procurado pelo Diário do Nordeste no plenário da Câmara, mas o parlamentar disse que somente depois irá se manifestar.
O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), vereador Lúcio Bruno, por sua vez, disse que não irá assinar a matéria e pretende engavetar a pauta.
Falta de atenção
Uma comissão formada por representantes da manifestação foi recebida pelo presidente do Legislativo municipal, Gardel Rolim (PDT). Ao fim do encontro, realizado a portas fechadas, o chefe falou com a imprensa. Segundo ele, houve um equívoco na tramitação da matéria, que será corrigido.
"A primeira coisa que precisa ficar claro é que não é a intenção da Câmara Municipal, dos colegas vereadores, em nenhum momento fazer ataques contra os professores", alegou Rolim, destacando como prova disso a aprovação de pautas relacionadas com a Educação Municipal.
"Obviamente, neste caso específico, houve uma falta de cuidado, uma falta de atenção ao debate. De fato é que os vereadores se posicionaram a favor do projeto. Então o que recebi neste momento do sindicato e vamos procurar uma forma de fazer um reparo a isto. Vamos procurar uma forma técnica, jurídica, segura, que a gente faça um reparo para que os professores não entendam que a Câmara em algum momento quis fazer um ataque", concluiu.