Legislativo Judiciário Executivo

Fim da reeleição? Saiba quais regras eleitorais estão na mira do Senado e podem mudar jogo político

Propostas estão em discussão no Senado Federal e podem ser votadas ainda este ano, mas não vão valer para as eleições de 2024

Escrito por Luana Barros , luana.barros@svm.com.br
Urna eletrônica
Legenda: Mudanças nas regras eleitorais não serão aplicadas em 2024, mas podem impactar as disputas eleitorais seguintes
Foto: Fabiane de Paula

Mudanças nas regras eleitorais brasileiras devem ser prioridade para os senadores neste primeiro semestre do ano. Fora do prazo eleitoral, as modificações não podem mais ser aplicadas nas eleições municipais de 2024, mas devem ter forte impacto para as próximas disputas eleitorais. O aumento no tempo de mandato, o fim da reeleição, a 'quarentena' para juízes e militares serem candidatos e a unificação das eleições são alguns dos temas tratados pelas propostas em discussão no Senado Federal. 

Uma delas, o novo Código Eleitoral entra na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) ainda nesta semana, com a apresentação do relatório do senador Marcelo Castro (MDB-PI). O projeto de lei complementar foi aprovado na Câmara dos Deputados ainda em 2021, mas estava parado no Senado. 

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Castro apresentou o parecer ao Colégio de Líderes da Casa Alta na última quinta-feira (29). No texto, são unificadas sete legislações eleitorais e partidárias, além de trazer pontos da reforma eleitoral debatida em 2023 — aprovada pelos deputados federais. A reforma não avançou no Senado. 

A segunda proposição — trazendo o fim da reeleição e a possibilidade de coincidir, em um mesmo ano, eleições municipais e gerais — deve ser apresentada em forma de Proposta de Emenda à Constituição (PEC), também de autoria de Marcelo Castro. 

Presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) tem como prioridade a discussão e votação das mudanças nas regras eleitorais. 

"Primeiro, através de uma modernização do Código Eleitoral, uma compilação definitiva do Código Eleitoral brasileiro, que envolva as regras eleitorais do nosso país", destacou ainda em fevereiro. "E o meu propósito, particularmente, é colocar fim à reeleição no Brasil, com a coincidência de mandatos e a coincidência de eleições".

PEC do Fim da Reeleição

O senador Marcelo Castro apresentou, aos líderes de bancada do Senado Federal, três textos de Proposta de Emenda à Constituição (PEC) determinando o fim da reeleição para os cargos de presidente, governadores e prefeitos. 

A meta do parlamentar é protocolar a proposição com mais apoio dentro da Casa — para apresentar uma PEC são necessárias, pelo menos, 27 assinaturas dentre os 81 senadores brasileiros.

Confira os principais pontos propostos nas PECs apresentadas por Castro:  

Fim da reeleição

O fim da reeleição irá abarcar os cargos de presidente da República, governadores e prefeitos. A forma como deve ser feita a transição para o novo modelo, no entanto, ainda está sendo discutida. 

Marcelo Castro apresentou aos líderes de bancada no Senado três textos diferentes para a Proposta de Emenda à Constituição. Todos eles trazem o fim da possibilidade de se eleger para mandatos consecutivos no Executivo. 

A perspectiva, no entanto, é que a nova regra passe a valer apenas nas eleições de 2030 ou nas de 2035. 

5 Anos de Mandato

Os três textos apresentados por Castro também estabelecem um novo período de mandato para os cargos eletivos: 5 anos. Neste caso, presidente, governadores e prefeitos, além de deputados federais e estaduais e vereadores exerceriam o mandato por cinco anos. 

A exceção seriam os senadores, que passariam a ter mandatos de 10 anos — aumentando em dois anos o tempo de mandato atual. 

Uma só eleição

Existe uma diferença entre os textos apresentados por Castro na última semana para a PEC do Fim da Reeleição: a coincidência ou não das eleições municipais e gerais. "Sinto que há um consenso maior sobre o fim da reeleição e o mandato de cinco anos, mas um consenso menor sobre a coincidência de eleições, explicou. 

A ideia de unificar o ano eleitoral — elegendo, de uma só vez, todos os cargos eletivos — está presente em duas PECs elaboradas por ele. A diferença, neste caso, está no tempo de transição até unificação. 

Uma primeira proposta é a de estabelecer um 'mandato tampão' nas eleições de 2028. Portanto, prefeitos eleitos neste ano, teriam um mandato de apenas dois anos. A eleição seguinte, em 2030, já seria unificada para todos os cargos. 

Na outra alternativa, prefeitos eleitos em 2028 teria direito a seis anos de mandato, finalizando em 2034 — a partir de quando as eleições passariam a ser unificadas.  

O terceiro texto elaborado por Castro retira a proposta de coincidir as eleições, estabelecendo apenas o fim da reeleição e aumentando o tempo de mandato para todos os cargos eletivos. 

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Código Eleitoral

O projeto de lei complementar 112/2021 foi enviado ao Senado Federal ainda em 2021, após aprovação na Câmara dos Deputados, mas ficou parado nos últimos anos. A proposta institui um novo Código Eleitoral. 

Segundo Castro, relator do projeto, a meta é que a nova legislação unifique sete leis, além de trazer pontos discutidos na reforma eleitoral de 2023, que acabou não sendo aprovada no Senado. 

"Hoje, quando uma pessoa quer uma informação sobre a legislação eleitoral tem que procurar — e saber onde procurar — em sete leis. Se o Código for aprovado e sancionado, teremos uma única lei tratando de toda a legislação eleitoral e partidária. São 898 artigos. É um código muito extenso, muito amplo", detalhou o senador. 

Confira os principais pontos do novo Código Eleitoral:   

'Quarentena'

Juízes, promotores, policiais e militares que queiram concorrer a mandatos eletivos precisam deixar os cargos pelo menos quatro anos antes da eleição em que serão candidatos, determina o novo Código Eleitoral. 

A 'quarentena' será estabelecida porque estes cargos exercem "atividades e funções que a gente entende que são incompatíveis com a atividade política", justifica Marcelo Castro. 

A nova regra terá validade também para integrantes do Ministério Público, guardas municipais, policiais federais, policiais rodoviários federais, policiais ferroviários federais e policiais civis e militares.

"Quer ser político? Abandona a magistratura, o Ministério Público e a carreira militar e vai ser político. Não é proibido, mas, [ficar] nas duas coisas, não dá certo. (...)  Nessas atividades, por serem especialíssimas e não poderem estar próximas à política, quem quiser ser terá que passar por uma quarentena de quatro anos", explicou o senador.

Mesmo se aprovado o novo Código Eleitoral, a regra não valeria nas eleições de 2026. A implementação aconteceria nas disputas eleitorais seguintes. 

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Desincompatibilização 

A proposta também unifica os prazos de desincompatibilização para as eleições — ou seja, quantos meses antes do dia de votação, aqueles que pretendem ser candidatos precisam deixar os cargos na administração pública. 

Atualmente, o afastamento dos cargos tem prazos variando entre três e seis meses, a depender da função exercida e de para qual cargo o candidato pretende concorrer. 

Por exemplo, servidores públicos só precisam se afastar três meses antes do dia da votação quando vão concorrer aos cargos de prefeito ou vereador. 

Reitores de universidade ou dirigentes de órgãos estaduais, por sua vez, precisam se afastar quatro meses antes se forem concorrer à prefeitura e seis meses antes se vão tentar uma vaga nas câmaras municipais. 

O novo Código Eleitoral pretende unificar estes prazos, estabelecendo que todos que integrem a máquina pública — seja federal, estadual ou federal — precisam se afastar seis meses antes para concorrer nas eleições. 

"O que estamos fazendo? Uniformizando tudo. (...) A gente simplifica. Aliás, essa é a grande intenção do novo Código Eleitoral: sistematizar, harmonizar, simplificar e esclarecer", destacou Castro.

Inelegibilidade

Outra uniformização trazida pelo novo Código Eleitoral é quanto ao prazo de inelegibilidade para políticos que sejam condenados — por crimes eleitorais ou comuns — à inelegibilidade pela Lei da Ficha Limpa. 

"O que estamos estabelecendo? Ela está inelegível por oito anos depois da data em que foi decretada a inelegibilidade. Todos os casos de inelegibilidade serão de oito anos e ponto final. Nem mais, nem menos", resumiu Marcelo Castro. 

O motivo para a regra é a desigualdade entre os tempos de inelegibilidade. Um exemplo citado é o caso da ex-senadora Selma Arruda. Cassada em 2019 por abuso de poder político, os oito anos de inelegibilidade seriam contados, segundo a lei atual, apenas após o fim do mandato para o qual ela foi eleita, em 2026. 

Essa regra é aplicada a deputados federais e estaduais, senadores e vereadores: o prazo de inelegibilidade é contado apenas quando o mandato para o qual foi eleito se encerra. 

Caso a mudança seja aprovada, o período em que o parlamentar ficará inelegível é calculado a partir do momento da condenação. No caso da senadora Selma Arruda, ela ficaria inelegível apenas até 2027. 

Este ponto da proposta também impacta na data inicial da inelegibilidade de quem é condenado por crimes eleitorais. O cálculo do período, de acordo com o projeto, será feito a partir do dia 1º de janeiro do ano seguinte à eleição — em vez de ser calculado a partir da data da votação de quando o crime foi cometido, como é hoje.

"Qual é o espírito disso? Quem se tornou inelegível, está inelegível por oito anos e passará dois pleitos sem disputar eleição. Se concorreu a um cargo em eleições gerais, vai passar duas eleições gerais fora do pleito. Se concorreu em eleição municipal, vai passar duas eleições municipais fora da disputa", explica o relator da proposta. 

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Prestação de contas

A simplificação da prestação de contas também é estabelecida na proposta em discussão no Senado. Hoje, todos os candidatos passam pelo mesmo processo para dar transparências às receitas e gastos de campanha. 

A meta do novo Código Eleitoral é de que os processos sejam distintos de acordo com os valores investidos durante o período eleitoral. Se não houver movimentação financeira, fica exigida uma declaração simplificada declarando a ausência de gastos e receitas. 

Caso o candidato gaste menos de R$ 25 mil, a declaração será feita a partir de "formulário simplificado". Apenas quando o gasto for superior a R$ 25 mil que a prestação de contas será feita como é determinado atualmente, com a necessidade inclusive de contratar advogado e contador. 

Sobras eleitorais

Existe a previsão ainda de mudanças de distribuição das "sobras eleitorais". A cada eleição proporcional — para os cargos de deputados e vereadores —, a divisão entre o número total de votos alcançados e o total de vagas disponíveis em cada casa legislativa resulta no coeficiente eleitoral. 

A partir dele, as cadeiras legislativas são divididas entre os partidos que alcançaram esse coeficiente. Ao final da divisão, algumas vagas 'sobram' e passam por nova divisão. Atualmente, a regra estabelece que todos os partidos podem concorrer às 'sobras', sem limitações. 

Regra aprovada em 2021, estabelecia que para participar dessa distribuição, o partido precisava ter alcançado 80% do coeficiente eleitoral, enquanto o candidato precisava ter tido 20% deste coeficiente — a regra acabou derrubada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e não irá valer para 2024. 

Agora, a proposta em discussão no Senado quer que os partidos alcancem 100% do coeficiente partidário e os candidatos cheguem a 10% para concorrer às 'sobras eleitorais'.

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