Com prefeito do Cedro cassado, nove cidades do Ceará correm risco de passar por novas eleições
Situação do prefeito Joãozinho de Titico é semelhante a de Bruno Figueiredo, prefeito de Pacajus. Gestores ainda podem recorrer e os casos serão analisados no pleno do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará
Eleito com 7.719 votos contra 7.538 do segundo colocado, o prefeito do Cedro, Joãozinho de Titico (PDT), corre risco de não terminar o mandato. Ele e a vice-prefeita, Ana Nilma (PDT), foram condenados em primeira instância por abuso de poder durante o último pleito municipal. É o nono município a entrar em instabilidade política no Ceará.
Ambos afirmam que vão recorrer da decisão. "Vamos recorrer a quem for necessário, enquanto isso, seguimos no cargo", disse o prefeito.
A decisão, proferida na última quarta-feira (17), impacta também o ex-prefeito Nilson Diniz (PDT) que era presidente da Associação dos Municípios do Estado do Ceará. Para o juiz eleitoral Eduardo André Dantas Silva, da 13º Zona Eleitoral de Iguatu, Diniz teria sido "conivente" com as condutas ilegais.
Além desse caso de Cedro, a chapa vitoriosa na disputa pela Prefeitura de Pacajus passa por situação parecida. Bruno Figueiredo (PDT) foi considerado culpado pela Justiça Eleitoral, em primeira instância, por abuso de poder.
Veja também
Ambas as situações serão analisadas no Pleno do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE). Além de Cedro e Pacajus, há ainda o caso de Viçosa do Ceará, cujo prefeito está no comando da prefeitura, enquanto aguarda tramitação de processo na Justiça. Já em outros seis municípios cearenses, prefeitos interinos ocupam a chefia do Executivo municipal em meio a imbrólios na Justiça Eleitoral.
Contratos temporários no Cedro
No caso de Joãozinho, a chapa é acusada de ter contratado servidores em caráter temporário sem que fossem preenchidos os requisitos de interesse público e caráter emergencial.
Provocados pelo magistrado, o prefeito e a vice não comprovaram o excepcional interesse público na manutenção de 110 contratos temporários “para exercer funções ordinárias como, por exemplo, motorista, instrutor de capoeira, entrevistador de cadastro único, auxiliar administrativo, atendente, agente social, técnico de enfermagem e etc”, relata o juiz.
O magistrado considera ainda na decisão contratações realizadas nos meses de agosto a novembro, próximo ao período eleitoral. Conduta vedada pela legislação.
“Interpreto que, nesse particular, há uma clara confusão entre o interesse público e o interesse privado político-eleitoral do grupo político apoiado pelo gestor municipal”, acrescenta.
O juiz eleitoral também enquadrou na decisão o ex-prefeito Nilson Diniz (PDT), que exerceu o mandato até o ano passado e apoiava Joãozinho na disputa. “Donde se infere que tinha conhecimento dos fatos e circunstâncias do ato ilícito e nada fez para impedi-lo, usufruindo passiva e coniventemente dos benefícios eleitorais daí decorrentes”, aponta.
No processo, a defesa do prefeito alega que as contratações ocorreram dentro da legalidade e no âmbito das ações de combate à pandemia da Covid-19.
Novas eleições municipais
No despacho, publicado quarta-feira (17), o magistrado decide invalidar a votação na disputa pela Prefeitura de Cedro e convoca novas eleições municipais. Ele também ordena a cassação dos mandatos do atual prefeito e da vice. Ambos, assim como o ex-prefeito, tornam-se inelegíveis por oito anos.
Nesta segunda-feira (22), o prefeito disse que irá recorrer da decisão.
"Ainda não fomos notificados, estou aguardando. Fomos pegos de surpresa, mas temos a tranquilidade de que a decisão será revista, até porque o parecer do Ministério Público foi pelo indeferimento, mas o juiz entendeu diferente", disse o pedetista.
Instabilidade em Pacajus
O caso de Cedro cabe recurso e será analisado pelo TRE-CE. Até que sejam esgotados todos os recursos na Corte, o prefeito segue exercendo o mandato na cidade. A mesma regra é aplicada para Bruno Figueiredo (PDT), prefeito de Pacajus que teve a chapa cassada pelo juiz eleitoral Alfredo Rolim Pereira, da 49ª Zona Eleitoral.
O pedetista e o vice, Francisco Fagner (DEM), foram considerados culpados por abuso de poder político. A ação movida contra a dupla foi apresentada pelo candidato derrotado José Wilson Chaves Júnior (PSD). A sentença foi proferida no dia 15 de fevereiro.
"Julgo procedente o pedido inicial, reconhecendo o ilícito de abuso de autoridade dos demandados Bruno Pereira Figueiredo e Francisco Fagner Da Costa, aplicando-lhes a sanção de cassação dos seus diplomas de prefeito e vice-prefeito, respectivamente, decorrentes das eleições municipais de 2020, cominando-lhes, ainda, a sanção de inelegibilidade para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes a esta eleição", determina o juiz.
Na acusação – acatada pelo magistrado – a oposição acusa o pedetista de usar a estrutura do município em benefício próprio. Eles apontam a realização de "lives" na página oficial da Prefeitura de Pacajus, além de eventos em que auxiliares do então candidato exaltavam o trabalho de Bruno.
"Nesses eventos, que contaram com uma estrutura cuidadosa de transmissão de sons e imagens, edição de vídeo e cerimonial, percebe-se que há uma notória tentativa de tornar pessoais as realizações da gestão municipal,", aponta o juiz.
O magistrado pontua como gravidade do caso a semelhança de algumas "lives" com comícios de campanha - proibidos pela legislação eleitoral, focadas em temas "de grande apelo junto à população", como saúde e educação e com realização próxima a data limite para veiculação de propaganda institucional. "(...) Não havendo dúvidas de que as condutas abusivas ora verificadas tiveram a potencialidade de desequilibrar a igualdade de condições entre os candidatos", diz o texto.
Bruno Figueiredo e Nilson Diniz foram procurados pela reportagem, mas as chamadas para a Prefeitura de Pacajus não foram atendidas. As ligação e mensagens encaminhadas para o ex-prefeito do Cedro também não foram retornadas.
Cidades sem prefeito
Se os imbrólios judiciais em Pacajus e Cedro causam instabilidade política, em outros seis municípios cearenses a situação é ainda mais complicada, conforme mostrou o Diário do Nordeste na última sexta-feira (19). Nessas cidades, três meses após as eleições, os prefeitos nem sequer tomaram posse efetivamente do cargo.
Há ainda o caso de Viçosa do Ceará, onde o prefeito Zé Firmino (MDB) se mantém no poder enquanto tramitam recursos na 2ª instância eleitoral. O TRE-CE já decidiu, neste mês, manter a cassação de seu registro de candidatura, confirmando decisão do juiz eleitoral da 35ª Zona.
Veja a situação dos prefeitos que não tomaram posse:
Barreira
Prefeita: Maria Auxiliadora Bezerra Fechine (PSD)
Acusação: Dra. Auxiliadora teve as contas desaprovadas, em julho de 2018, pelo então Tribunal de Contas dos Municípios (TCM). As acusações que pesam contra ela são da época em que a prefeita eleita geriu o Fundo Municipal de Saúde de Barreira. Entre as irregularidades, os auditores apontaram ausência de licitação para despesas com locação de veículos e gastos irregulares com medicamentos e material médico-hospitalar.
Situação na Justiça: Em 1º de dezembro, o Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) decidiu indeferir o registro de candidatura da prefeita eleita. A defesa entrou com recursos na Corte Regional, mas também foram negados. Assim, o caso chegou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Lá, em 13 de novembro do ano passado, o ministro Luis Felipe Salomão negou o prosseguimento do recurso especial interposto pela defesa.
Caridade
Prefeita: Maria Simone Fernandes Tavares (PDT)
Acusação: De acordo com o MPCE, quando Simone foi secretária municipal da cidade, ela teve contas de gestão reprovadas pelo TCM. Em 2004, durante a gestão da pedetista, foi realizada a compra de R$ 55,2 mil reais em medicamentos sem licitação e houve ainda atraso na remessa ao TCM de documentação mensal relativas a despesas e receitas.
Situação na Justiça: O juiz eleitoral deferiu a candidatura de Simone. Contudo, a promotoria eleitoral recorreu. No último dia 18 de novembro, o TRE-CE indeferiu, por unanimidade, o registro de candidatura de Simone. Em 2 de dezembro, o caso chegou ao TSE, após recurso da defesa da candidata. O processo teve como relator o ministro Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, que emitiu parecer mantendo o indeferimento do registro de candidatura. O Tribunal votou em unanimidade. Assim, em 18 de dezembro do ano passado, a Corte determinou a realização de novas eleições no município.
Jaguaruana
Prefeito: Roberto Barbosa Moreira (PDT)
Acusação: O pedetista teve as contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas quando foi secretário municipal da Infraestrutura e Serviços Públicos, em 2013. De acordo com o relatório dos auditores, entre as irregularidades detectadas na gestão de Roberto, viu-se que recursos oriundos da contribuição de iluminação pública, que é receita de natureza vinculada, foram usados para outras despesas.
Situação na Justiça: A candidatura de Roberto foi autorizada pelo Juízo da 75ª Zona Eleitoral. Contudo, o caso foi parar no TRE-CE. No último dia 3 de dezembro, a Corte rejeitou o registro de candidatura do político por 4 votos a 2. A defesa de Roberto recorreu ao STF, mas o recurso foi rejeitado pelo relator do caso, o ministro Tarcísio Vieira de Carvalho Neto. Paralelamente, em 17 de dezembro, o TRE-CE indeferiu a candidatura da vice-prefeita eleita de Jaguaruana, Flávia Façanha (PSB). Segundo a decisão, ela não teria se afastado do cargo de assessora parlamentar na Assembleia Legislativa do Ceará (AL-CE) no período estabelecido para concorrer às eleições.
Martinópole
Prefeito: James Martins Pereira Barros (PP)
Acusação: O político respondeu a processo administrativo por abandono de emprego. Ele havia ficado afastado do cargo de professor entre os anos de 2011 e 2016 para o exercício do mandato de prefeito da cidade. Contudo, não voltou a ensinar após o final do mandato, sendo demitido em 2017.
Situação na Justiça: Após ter a candidatura indeferida pelo Juízo da 25ª Zona Eleitoral – Martinópole, a chapa liderada por James Bel apresentou recurso junto ao TRE-CE. A Corte Regional contrariou parecer do Ministério Público Eleitoral e deferiu a candidatura. A Procuradoria Eleitoral recorreu da decisão e o caso chegou ao TSE. A Corte acatou pedido para enquadrar o candidato na Lei da Ficha Limpa. De acordo com a decisão do ministro do Tribunal Alexandre de Moraes, relator do caso, James Bel tornou-se inelegível ao ser demitido do cargo de professor da rede municipal. O julgamento, contudo, foi suspenso pelo ministro Luís Roberto Barroso.
Missão Velha
Prefeito: Washington Luiz Macêdo Fechine (MDB)
Acusação: O emedebista é condenado por improbidade administrativa. Ele foi acusado de, durante a gestão como prefeito da cidade, no período compreendido entre 2009 a 2012, aumentar o salário de servidores sem autorização legislativa. Na condenação, a Vara Única da Comarca de Missão Velha determinou que o político foi multado e teve os direitos políticos suspensos por oito anos.
Situação na Justiça: Em 4 de novembro, o TRE-CE decidiu, de forma unânime, pela impugnação do candidato. O caso foi parar no TSE, a pedido da defesa. Contudo, na Corte, o ministro Edson Fachin negou seguimento do recurso no último dia 18 de dezembro.
Pedra Branca
Prefeito: Antonio Góis Monteiro Mendes (PSD)
Acusação: Góis renunciou ao cargo de prefeito após a apresentação de pedido de cassação na Câmara Municipal, em 24 de maio de 2019. Em janeiro de 2019, ele chegou a ser preso temporariamente.Rogério é suspeito de ser um dos principais beneficiados por irregularidades em um contrato de R$ 5,4 milhões firmado entre o município e uma empresa de construção.
Situação na Justiça: Góis teve o registro indeferido pela 59ª Zona Eleitoral de Pedra Branca no último dia 17 de outubro. Ele foi considerado inelegível por oito anos. Em 5 de novembro, o TRE-CE apreciou recurso apresentado pela defesa de Góis, contudo, por cinco votos a um, manteve o indeferimento. Após a decisão, a defesa do prefeito apresentou recursos à Corte Regional, que foram apreciados, mas a decisão não foi revista. Góis encaminhou recurso especial eleitoral ao TSE.