A gestão que o Direito esqueceu de ensinar
O ensino jurídico no Brasil parece ter parado no tempo. Enquanto o mundo fala em inovação, gestão e tecnologia, algumas faculdades de Direito ainda formam profissionais para um mercado que não existe mais. Sai o aluno, entra o advogado, e o choque é imediato. Saber a teoria não basta. É preciso entender de gestão, estratégia, pessoas e resultados. Mas ninguém ensina isso.
A ausência desse conteúdo na formação jurídica criou uma geração de profissionais que sabem litigar, mas não sabem liderar. E o impacto é visível: escritórios quebram por má administração, departamentos jurídicos se perdem em burocracias e talentos se frustram em ambientes sem estrutura de crescimento. Quando o advogado precisa assumir um papel de gestor, descobre que o Direito não o preparou para isso.
Se para os homens essa transição já é difícil, para as mulheres ela é ainda mais árdua. A desigualdade de gênero atravessa toda a cadeia da liderança jurídica. A ONU vem alertando há anos: quanto maior o nível de decisão, menor a presença feminina. No Direito, essa realidade é gritante. Embora as mulheres sejam maioria nas universidades e nos concursos públicos, continuam minoria nas posições de comando.
Há, porém, uma área que começa a mudar esse cenário: a gestão jurídica. Em poucos anos, ela deixou de ser um tema secundário para se tornar uma especialidade em ascensão. Cursos e consultorias começam a preencher o espaço que a graduação deixou vazio, oferecendo capacitação prática em gestão administrativa, finanças, tecnologia e liderança.
Mas isso ainda é pouco. Precisamos repensar o modelo de ensino jurídico e valorizar competências que ultrapassam o domínio técnico. O futuro do Direito depende de profissionais que saibam unir conhecimento jurídico e visão estratégica; e de mulheres que encontrem, finalmente, espaço para liderar. Formar gestores é urgente. Formar líderes diversos é indispensável.
O avanço da gestão jurídica também exige uma mudança de mentalidade dentro das próprias instituições. Escritórios e departamentos precisam enxergar que gestão não é custo, é investimento. Estruturar processos, adotar tecnologia e desenvolver lideranças não enfraquece o trabalho jurídico, mas fortalece. A boa gestão libera tempo, reduz erros e aumenta a qualidade das entregas. Mais do que isso, cria ambientes sustentáveis, capazes de reter talentos e impulsionar a inovação.
Ao mesmo tempo, é fundamental que o protagonismo feminino nessa transformação seja reconhecido e incentivado. As mulheres têm se destacado justamente nas competências que o Direito negligenciou: empatia, comunicação, inteligência emocional e visão sistêmica. São habilidades essenciais para conduzir equipes, negociar e inovar. Valorizar essas qualidades não é apenas uma questão de justiça, mas de estratégia, porque o futuro da advocacia será moldado por quem souber gerir com propósito e sensibilidade.
Silvia Leticia é advogada