Receio e cuidados específicos marcam a possibilidade de retorno das gestantes ao trabalho presencial

O Ceará registra oito procedimentos junto ao Ministério Público do Trabalho sobre o descumprimento da lei do afastamento de gestantes do trabalho presencial

Escrito por Theyse Viana , theyse.viana@svm.com.br
Gestantes
Legenda: Grupo recebeu imunização contra a Covid-19 de forma prioritária
Foto: Agência Diário

Quem está no processo de se tornar mãe durante a pandemia da Covid-19 pode sair do isolamento social, propiciado pelo trabalho remoto, conforme decide a Câmara dos Deputados. A possibilidade traz receio para mulheres na busca por manter uma gestação saudável e especialistas se dividem quanto à análise dos riscos de voltar para a jornada presencial.

O Projeto de Lei 2058/21, aprovado pela Câmara na última quarta-feira (6), prevê o retorno de mulheres grávidas ao trabalho presencial, desde que estejam imunizadas pelas duas doses da vacina contra a Covid.

Se aprovado pelo Senado, o PL altera a Lei nº 14.151, sancionada em maio deste ano, que assegurava o “afastamento da empregada gestante das atividades de trabalho presencial durante a emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus”.

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No Ceará, oito procedimentos foram abertos junto ao Ministério Público do Trabalho (MPT/CE), até essa segunda-feira (11), ligados ao descumprimento da Lei 14.151/2021. De acordo com o órgão, dois deles são de abrangência do município de Sobral. 

Os casos denunciados, explica o ministério, “estão no âmbito das negociações”, quando o são averiguados e se busca entendimento entre as partes por mediação. Quando não há consenso, o MPT ingressa com ação na Justiça.

Empresas que desobedecerem à lei estão sujeitas a ações judiciais coletivas ou civis públicas, além de pagamento de multa, como alerta a assessoria jurídica do MPT/CE. "As ações também podem prever indenizações a serem pagas pelos empregadores, caso a conduta tenha de alguma forma prejudicado a saúde das gestantes", reforça o MPT.

Mais segurança

Para a publicitária Ana Luiza Ribeiro, 32, permanecer em trabalho remoto durante toda a gestação foi determinante para manter a saúde intacta. Na empresa em que ela trabalha, o regime de home office foi adotado desde o primeiro decreto estadual de isolamento social.

“Eu só saía para os exames e médicos, o medo de pegar a Covid era muito grande. Tudo era muito novo e os relatos de grávidas que pegaram a doença eram assustadores. Me resguardei o máximo que pude”, relembra.

Em agosto, já próximo ao nascimento do pequeno Davi, Ana Luiza completou o esquema vacinal com a segunda dose contra o coronavírus – mas, mesmo assim, afirma “não se sentir 100% segura” para voltar ao trabalho presencial. 

Grupo de risco

De acordo com a epidemiologista Caroline Gurgel, professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), o fato de o Brasil ter sido o país que mais registrou óbitos em gestantes aponta que quebrar o isolamento delas não é seguro.

Nenhuma atividade, fora o isolamento social, é segura para a gestante. Por vários motivos, infecção por vírus respiratórios têm manifestação clínica mais severa entre elas
Caroline Gurgel
Professora da Faculdade de Medicina UFC

A virologista ressalta, ainda, que “estamos num momento em que os números de casos reduziram bastante, o que é natural para o segundo semestre”, mas que é preciso manter vigilância e medidas sanitárias adequadas, como o uso de máscaras PFF2.

“As empresas devem adotar medidas para cada momento: no primeiro semestre, com restrições novamente, mandar para casa gestantes e pessoas com comorbidades. No segundo, reabre tudo e vamos fazendo esse ciclo”, avalia Caroline.

Já o médico infectologista Robério Leite pontua que a relação “risco-benefício” da volta das gestantes imunizadas às atividades de trabalho presencial “ainda não está clara" – e, por isso, a própria ciência ainda não tem resposta favorável ou desfavorável a esse retorno.

De todo modo, o médico reforça que “a Covid tem um impacto muito mais forte na mulher grávida, com risco três vezes maior de ser hospitalizada, de prematuridade e de passar a doença para o bebê”, o que exige cautela por parte delas e dos empregadores.

O ideal é que, na situação de voltar, ela seja colocada numa atividade em que haja menos risco de exposição a outras pessoas, ainda que vacinada
Robério Leite
Médico Infectologista

Até domingo (10), 65.018 gestantes e puérperas (que deram à luz há 45 dias ou menos) haviam tomado a 1ª dose da vacina contra a Covid no Ceará, das quais 56.096 já estavam imunizadas com as duas aplicações – o correspondente a 86% das vacinadas.

No Ceará, 27 gestantes morreram de Covid desde o início da pandemia, de acordo com dados do Integra SUS, e 3 mortes estão em investigação. A média de idade das mulheres era de 30 anos, e menos de um terço delas tinha alguma comorbidade. Do total, 21 foram a óbito na rede pública de saúde.

Além delas, 35 puérperas também não resistiram à infecção pelo coronavírus, e uma morte tem causa investigada. Eram mulheres de 34 anos, em média, e só uma em cada 5 tinha alguma doença preexistente. Pelo menos 20 delas morreram em hospitais públicos. Os dados foram atualizados até 11h42 de segunda (11).

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