Acidentes de trânsito caem 61% durante isolamento social

Ocorrências em rodovias estaduais passaram de 123 para 48. A queda ocorreu entre 17 e 31 de março deste ano quando comparado a igual intervalo de 2019. Redução é atribuída à reclusão domiciliar provocada pela Covid-19

Escrito por Felipe Mesquita , felipe.mesquita@svm.com.br
Legenda: O tráfego de veículos diminuiu significativamente nas vias de Fortaleza, como na Avenida Washington Soares
Foto: Foto: Thiago Gadelha

A dinâmica do espaço urbano mudou a partir das confirmações de pacientes infectados pelo coronavírus Sars-CoV-2 no Ceará. Os casos positivos para a Covid-19, doença pandêmica em crescimento, obrigaram a reclusão social, sobretudo com o decreto estadual que interrompeu serviços. Com mais gente dentro de casa e consequentemente, menos carros, motos e bicicletas, o número de acidentes de trânsito recuou. Se entre 17 e 31 de março de 2019 os sinistros chegaram a 123, em igual período deste ano, foram apenas 48, o que aponta uma redução de 61% nos números.

Os registros de óbitos por acidentes também acompanharam o cenário de quedas. Em igual intervalo de tempo, as mortes decresceram de 21 para 9. Os dados foram encaminhados pelo Departamento Estadual de Trânsito (Detran-CE), após solicitação do Sistema Verdes Mares. O órgão, no entanto, não detalhou em quais municípios e rodovias estaduais as ocorrências foram registradas.

A Capital, por sua vez, que concentra a maioria dos casos com diagnóstico positivo da Covid-19, acumula também a maior baixa no quantitativo de acidentes. Segundo balanço da Autarquia Municipal de Trânsito e Cidadania (AMC), os chamados para atendimentos de incidentes em ruas e avenidas caíram 73% entre 19 (feriado estadual de São José) a 29 de março últimos, em comparação a iguais dias de 2018.

Enquanto em 2020, Fortaleza contabilizou apenas 95 acidentes, no ano passado, o total chegou a 351. A AMC inclui na lista atropelamentos, colisão com e sem vítimas e choques com postes de energia. Já sobre os incidentes que levam usuários de transportes a óbito, o órgão indica um declínio de 20%, e para as ocorrências com o registro de vítimas, 58,2% a menos.

"Essas reduções proporcionam a melhoria do sistema de atendimento de emergência. Isso porque, menos pessoas estão correndo risco nas ruas e acabam dando a oportunidade de quem, nesse momento, precisa efetivamente desse serviço encontrar vagas de imediato nas redes públicas e particular", justifica o superintendente da Autaquia Municipal, Arcelino Lima.

IJF

Referência estadual no atendimento de traumas, o Instituto Doutor José Frota (IJF) também viu cair os acolhimentos na emergência por causa da quarentena. Vítimas de acidentes de carros, motos, bicicletas e pedestres somaram 238 entre 17 e 31 de março, 55% a menos que o mesmo período do ano passado, com 529 casos.

Por outro lado, o superintendente adjunto do IJF, Osmar Aguiar, esclarece que as equipes multiprofissionais continuam voltadas para o atendimento de diferentes complexidades clínicas. Os leitos vagos estão sendo ocupados por pacientes internados. "Eles estão sendo colocados para darem continuidade aos seus tratamentos", diz o médico, complementando que já existe uma ala para receber exclusivamente pessoas contaminadas pelo coronavírus. "Nós disponibilizamos no IJF 2 uma unidade para receber pacientes que tenham diagnóstico do Covid-19".

Emergência

As anotações de trânsito aconteceram quando o fluxo de pedestres e motoristas começou a diminuir em 17 de março, um dia após o governador Camilo Santana baixar decreto suspendendo aulas em colégios e universidades públicas até o dia 29. O mesmo documento também definiu estado de emergência na saúde pública por ocasião do coronavírus. O chefe do Executivo estadual prorrogou por mais 30 dias a suspensão das atividades presenciais em escolas, cursos, faculdades e universidades públicas e privadas.

Além de mudar o calendário letivo das instituições de ensino, Camilo Santana determinou ainda em novo decreto o fechamento de estabelecimentos comerciais entre os dias 20 a 29 de março. Dessa forma, bares, lanchonetes, restaurantes, feiras livres, shoppings, barracas de praia, cinemas, academias e museus deveriam permanecer de portas fechadas. Apenas farmácias, hospitais, clínicas veterinárias e supermercados podem funcionar, o que contribuiu também para afastar as pessoas da rua. No último sábado (28), o governador anunciou o isolamento social por mais sete dias.

Até que a rotina seja normalizada, o cenário continuará com movimentação atípica nas áreas de grande comércio, pontos turísticos e unidades de ensino básico e superior: sinais de trânsito sem fila de veículos, faixa de pedestres quase inutilizada e frota de ônibus coletivo reduzida. Quem precisa se deslocar ao trabalho encontra vias vazias e sem engarrafamentos até em horários de pico, realidade diferente para um dia útil.

O advogado e especialista em Direito de Trânsito, Rodrigo Nóbrega, pondera que alguns condutores podem se aproveitar da circunstância para cometer infrações. "O fato de as pessoas estarem dentro de casa diminui o uso do veículo, mas tem gente que se aproveita do fato da fiscalização menos ostensiva e ter menos meios de transporte para descumprir a quarentena e a legislação de trânsito", atesta.

Contudo, a AMC reforça que as 110 câmeras de videomonitoramento instaladas em Fortaleza não deixaram de mapear o comportamento dos motoristas. Os equipamentos acompanham possíveis transgressões. A fiscalização eletrônica acontece ainda através de fotossensores que registram a infração e tiram foto das placas dos veículos.

De acordo com Arcelino Lima, os agentes do órgão foram realocados em novas atividades, o que eles chamam de "regime de contingenciamento" por conta da Covid-19. No último fim de semana, por exemplo, o efetivo atuou na campanha de vacinação contra a gripe, organizando as filas de automóveis nos shoppings e na Universidade de Fortaleza. O trabalho tem sido reforçado também em áreas de carga e descarga, embarque e desembarque de hospitais, como o Leonardo da Vinci, que recebe pacientes contaminados por coronavírus.

"O nosso trabalho é muito proporcional ao volume de carros nas ruas. Se há pouco fluxo, reduz a necessidade de efetivo. Atualmente, as atividades estão mais específicas para tentar ajudar a cidade na reversão desse problema. Nesses locais que têm grande movimentação na entrada e saída, a gente pode utilizar, sim, de fiscalização, mas não é a nossa função principal no momento", ressalta Lima.

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