População carcerária do Ceará reduz, mas superlotação continua alta

Embora o número de detentos no Sistema Penitenciário tenha caído 25,4%, há mais de 8 mil internos excedentes em presídios cearenses. SAP diz que criou novas vagas e quatro unidades de privação de liberdade estão em construção

Escrito por Cadu Freitas , cadu.freitas@svm.com.br
Na CPPL II, a capacidade é de 944 presos, mas a SAP já registra 1.944, um excedente de 105,93%
Legenda: Na CPPL II, a capacidade é de 944 presos, mas a SAP já registra 1.944, um excedente de 105,93%
Foto: Natinho Rodrigues

Desde que a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) passou a gerenciar as unidades prisionais do Estado do Ceará, no lugar da antiga Secretaria da Justiça e Cidadania (Sejus), foram 20 meses até agosto deste ano. No período, é fato, o número da população carcerária cearense caiu 25,4%. Contudo, tal redução não foi suficiente para garantir que os presídios cearenses ficassem mais livres - pelo contrário, eles ficaram ainda mais superlotados.

É o que aponta o último relatório apresentado pela SAP relativo ao mês de agosto deste ano. Embora o documento não traga a capacidade de cada uma das penitenciárias, informações repassadas pela própria Pasta dão conta que há 8.237 internos excedentes nessas unidades de privação de liberdade. O número corresponde a 67,21% a mais do que esses espaços deveriam suportar internamente. 

Desde janeiro deste ano, a Secretaria não divulga dados da capacidade dos presídios nem de quantos detentos extras há em cada um. A última publicação ocorreu em dezembro de 2019, quando as unidades apresentavam 2.366 vagas a menos do que a SAP hoje afirma ter. 

A fim de reduzir o excedente populacional no Estado, a Pasta afirmou que “tem mais quatro unidades prisionais em construção, o que vai gerar mais 2 mil novas vagas. Duas delas devem ser entregues ainda em 2020. Além disso, novas vagas foram construídas a partir de reformas das unidades IPPOO 2, IPF, CPLL 1, Pacatuba, Caucaia”.

Antes de ser extinta, a Sejus tinha menos detentos excedentes do que é observado atualmente pela SAP. Os dados do fim de 2018 apontam que a Secretaria entregou a gerência das penitenciárias com 6.374 presos a mais; ou seja, em 20 meses, 1.863 internos também se amontoaram aos que já estavam aglomerados anteriormente.

Campeãs

Três unidades de privação são as campeãs em lotação: o Centro de Triagem e Observação Criminológica (CTOC), em Aquiraz; a Penitenciária Industrial de Sobral (Pirs); e o Hospital Geral e Sanatório Penal Professor Otávio Lobo (HGSPPOL), em Itaitinga. Elas têm uma particularidade em comum: há mais de três detentos para cada vaga. 

“A superlotação dificulta porque você não teve um grande aumento de infraestrutura. E aí eu não falo só predial, mas também do ponto de vista de serviço, de aumento de agentes penitenciários. Não teve um aumento significativo desse quadro de assistência a esses presos”, pondera o presidente do Conselho Penitenciário do Ceará, Cláudio Justa.

É como se fosse um efeito dominó. Por causa dessa ausência citada pelo advogado, há uma “dificuldade de controle e de contenção das unidades”, o que torna “a segurança uma questão central”. Em decorrência disso, há uma dificultação dos programas de ressocialização - ponto-chave da existência dos presídios, uma vez que a ideia do encarceramento é propiciar que o interno saia de lá melhor do que entrou.

“Como há, na atual administração, uma metodologia de disciplinamento, de maior uso da força disciplinar, você tem uma contenção de tumultos prisionais. Mas isso não garante de toda a segurança, portanto não teria plena liberdade para abertura de programas de ressocialização”, acrescenta o presidente do Conselho. Em agosto, um em cada quatro detentos estava incluídos em programas de inclusão social, nas áreas de trabalho, cultura e assistência.

Cadeias públicas

Para o presidente da Comissão do Direito Penitenciário da Ordem dos Advogados do Brasil Secção Ceará (OAB-CE), Márcio Vitor Albuquerque, é importante que o preso tenha ocupação, direito à remissão de pena, além da possibilidade de aplicar recursos. “De fato, esse preso, muitas vezes, fica na ociosidade, não tem ocupação. Há de se reconhecer, de toda sorte, que nessa administração houve um maior controle no tocante à segurança, mas o que foi feito aqui no Estado? Foram fechadas mais de 80 cadeias públicas, e esses presos vieram para esses presídios da Capital e da Região Metropolitana”, diz.

O problema da enorme quantidade de detentos, segundo Márcio Vitor, é o grande número de presos provisórios, cuja determinação deveria ocorrer de forma “excepcional”. Conforme o representante da OAB-CE, a quantidade chega a ser tão alta que acaba sendo nociva para o interno, uma vez que “não está comprovada a culpabilidade dele, e isso pode até desafiar o princípio da presunção de inocência”. 

Nas 13 cadeias públicas ainda existentes no Estado, há 1.862 vagas ocupadas, com 3.625 disponíveis. A política de fechamento desses locais foi implementada pelo Governo Camilo Santana que vem, paulatinamente, redistribuindo os internos a penitenciárias com melhores e maiores estruturas. Márcio Vitor concorda com a necessidade de fechamento de algumas unidades por falta de estrutura, mas “era apenas um percentual, que não chegava nem a metade”, indica. 

Já Cláudio Justa acredita que “faz sentido desativar esses equipamentos”, levando em consideração a lógica de controle de segurança e integração com ações de segurança pública. “Faria mais sentido aparelhá-los, mas não tendo os meios, que se desative”, aponta. Por outro lado, os presos provisórios ficam distantes das comarcas onde os crimes ocorreram, impossibilitando a maior brevidade do andamento do processo e os distanciando dos familiares.

“Tem prejuízo de garantia de direitos e tem ganho com relação a segurança. Mas eu acho que isso tem que ser uma medida transitória. Tem que ter a provisão da proximidade do condenado com a comunidade dele, como prevê a lei”, finaliza Justa.

Apesar de a população carcerária ter apresentado redução em 20 meses, ainda há superlotação nas unidades prisionais cearenses. Segundo especialistas, a causa decorre do fechamento das cadeias públicas do interior e apresenta consequências aos detentos

 

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