Ajudante de escola de futebol estuprava crianças e usava ranking para aliciar vítimas no Ceará

Conforme relato de uma mãe, o homem oferecia às vítimas um copo de champanhe com um líquido suspeito tipo sonífero. Os familiares começaram a desconfiar porque as crianças chegavam muito sonolentas em casa

Escrito por Raísa Azevedo , raisa.azevedo@svm.com.br
delegacia regional de Sobral
Legenda: Denúncias foram realizadas por familiares das crianças na delegacia de Sobral
Foto: Mateus Ferreira

Familiares de crianças entre 9 e 12 anos denunciaram o ajudante de uma escolinha de futebol no município de Sobral, no interior do Ceará, por estupro e aliciamento de menores.

De acordo com testemunhas ouvidas pelo Diário do Nordeste, o homem andava sempre com uma pochete cheia de doces e dinheiro, e frequentemente dava presentes para atrair as crianças e ganhar a confiança dos pais. Ele usava códigos para se comunicar com as vítimas e até criou um ranking em que dava pontos para as vítimas após os abusos.

Segundo a Polícia Civil, o homem de 38 anos foi preso na última quinta-feira (27), em uma rodoviária no bairro de Fátima, em Fortaleza, enquanto tentava fugir para o estado do Rio Grande do Norte. As investigações apontam que os crimes ocorreram em abril e junho deste ano contra quatro vítimas.

MODUS OPERANDI

A mãe de uma das crianças, que não quis ser identificada, confirmou ao Diário do Nordeste que o filho, de 9 anos, e um sobrinho, de 12, alunos da escolinha de futebol, foram abusados pelo homem.

Segundo ela, a violência sexual contra o filho ocorria desde o Dia das Crianças, em 12 de outubro do ano passado. Ela registrou um boletim de ocorrência (BO) há cerca de dois meses sobre o caso e teria sido a primeira a procurar o Conselho Tutelar, quando foi encaminhada para a delegacia.

A mãe afirmou que o acusado agradava muito os pequenos com lanches, doces e chegava a dar dinheiro e presentes como chuteiras, chinelos e até celular para conquistá-los.

Além disso, ele se colocava à disposição para buscar e deixar as vítimas em casa todos os dias após as atividades na escolinha de futebol. Por conta disso, ele vivia cercado de crianças e, devido à proximidade com elas, era chamado de padrinho ou "padim".

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A desconfiança de mulher começou quando ela percebeu a frequente demora do filho para chegar em casa.

"A aula terminava 9 horas da noite, mas ele só chegava lá pelas 11 horas. Aí quando eu perguntava o motivo da demora, ele dizia que chegava tarde porque eram muitas crianças", relembra a mãe.

Ela acredita que muitos desses abusos ocorriam no caminho para casa, em uma região de mata.

Outra familiar ouvida pelo Diário do Nordeste, que também preferiu não ser identificada, revelou que o irmão, de 10 anos, começou a participar da escolinha e chegava com dinheiro em casa, o que levantou a suspeita da família.

"Ele (abusador) sempre agradava com doces, presentes, mas minha mãe começou a desconfiar porque meu irmão chegava sonolento e ganhava presentes, o que era muito estranho", disse.

SUSPEITO SE COMUNICAVA POR CÓDIGOS

O suspeito também costumava convidar as crianças para momentos de lazer no fim de semana em uma casa com piscina, que seria de uma parente dele, lugar onde também ocorriam os estupros. 

Conforme a denúncia de uma das mães, o homem usava códigos para se comunicar com as crianças e dava pontos em um ranking enquanto as aliciava.

"As crianças disseram que ele agia falando no 'ponto p', que valia 10 pontos. Já o 'ponto ch' era para sexo oral, que valia 1.000 pontos. Tinha criança com 6 mil pontos", afirmou a mãe.

Outra artimanha utilizada pelo estuprador era dar dinheiro para as crianças. Ainda segundo a denunciante, ele pagava R$ 10 por 10 minutos de carícias, R$ 15 por 15 minutos e assim por diante.

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Dentre os relatos, um garoto teria dito que, no Dia das Crianças nessa casa com piscina, ele teria o mandado deitar-se no colchão, dado um celular com um jogo e aproveitado o momento para molestá-lo. O fato teria ocorrido mais de duas vezes e na presença de outras crianças.

"Tinha criança que chorava de dor e ele acalmava dizendo que ia passar uma 'pomadinha'. Outras crianças ainda pediam para ele parar", disse a dona de casa. A violência também ocorria durante e após os banhos. 

HOMEM OFERECIA CHAMPANHE COM SUBSTÂNCIA SUSPEITA DURANTE ABUSOS

Ainda conforme o relato da mãe, o homem oferecia às vítimas um copo de champanhe com um líquido suspeito tipo sonífero. Os familiares começaram a desconfiar porque as crianças chegavam muito sonolentas em casa.

"Ele dava um champanhe com um líquido e dizia que ia colocar dentro do copo porque ia ficar com gosto de morango. De repente a criança tava com os olhos baixos e elas chegavam a dormir", afirmou.

CRIANÇAS FIZERAM EXAME DE CORPO DE DELITO

De acordo com a irmã da vítima que teve a identidade preservada, algumas crianças passaram por exames de corpo de delito. No caso de uma delas, a análise teria dado positiva para estupro. Já no caso de seu irmão, o exame não conseguiu detectar os abusos, pois já havia passado mais de 8 dias da violência.

A parente do garoto disse que a família começou a suspeitar do homem há cerca de um mês, e não deixou mais a criança ir até a escolinha. A família registrou o BO na última segunda-feira (24) e afirmou que a criança vem sendo acompanhada por uma psicóloga.

FAMÍLIAS CLAMAM POR JUSTIÇA

Conforme outras testemunhas, o funcionário da escolinha de futebol ameaçava as crianças caso elas contassem sobre os abusos para as mães. "Se elas descobrirem vão bater em vocês", teria dito o suspeito.

"Aí uma criança falou para os pais porque as outras tinham medo. A mãe dele denunciou, fez o BO e foi repassando para os outros pais, quando vimos já eram vários", disse a denunciante. Antes de ser preso, o suspeito a removeu do grupo do Whatsapp em que estavam os familiares dos garotos da escolinha.

Uma das mães destaca o medo e a ansiedade como consequência das violências.

"Percebi o medo que ele tinha da nossa reação, eu sinto no meu filho a vergonha de contar o que o safado fez. É uma ferida que vai continuar, e deixar a gente mais alerta. A família quer que a justiça seja feita. Que ele volte pra cidade, porque ele tem que estar preso aqui. Precisamos divulgar quem é esse monstro", afirmou, em tom de revolta.

Apesar do número apresentado pela Polícia de 4 crianças, a mãe acredita que muitos outros garotos teriam sido vítimas, em torno de 20.

MÃE FOI ALERTADA POR OUTRA FAMILIAR

Uma das mães contou que sua irmã, que também teve o filho estuprado, sempre desconfiou do homem e tentou alertá-la. "Ela não confiava nele, pelo jeito dele que chamava atenção. Ela sempre dizia pra eu tomar cuidado com meu filho e alertava: 'mulher, não confia nele', e ele olhava de um jeito desconfiado", relembrou.

A certeza veio quando um outro familiar escutou as crianças conversando e comentando sobre os estupros. "Teve um dia que um outro parente nosso ouviu uma conversa das crianças falando sobre o ajudante da escolinha, aí tivemos a certeza", relatou.

PRISÃO DO SUSPEITO

Em nota enviada ao Diário do Nordeste, a Polícia Civil do Estado do Ceará (PCCE) informou que efetuou o "cumprimento dos mandados de busca e apreensão e de prisão temporária em desfavor de um homem, de 38 anos, por estupro de vulnerável".

O suspeito foi preso enquanto tentava fugir para o estado do Rio Grande do Norte. A captura foi realizada por equipes do Departamento de Polícia da Capital (DPC) com apoio do Departamento de Inteligência da Polícia Civil (DIP). 

"Por meio de investigações realizadas pelas equipes da Delegacia Municipal de Sobral, foi possível identificar o suspeito que era ajudante de uma escolinha de futebol infantil. O crime ocorreu em abril e junho deste ano contra quatro vítimas", diz a nota. O homem encontra-se à disposição da Justiça.

O Diário do Nordeste não localizou a defesa do homem acusado de estupro e procurou a SSPDS e a Polícia Civil para mais detalhes. A matéria será atualizada quando as respostas forem enviadas.

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