Suspensão da Operação Carro-Pipa e chuvas irregulares deixam 250 mil famílias sem água no sertão

Já são 33 dias sem distribuição de água para reabastecer as cisternas em localidades rurais cearenses

Escrito por Honório Barbosa , regiao@svm.com.br
Carro-pipa
Legenda: O Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) informou que os repasses integrais e regulares dependem da aprovação do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) 2021
Foto: Alex Pimentel

Há 33 dias, a Operação Carro-Pipa está suspensa em todo o Ceará. Mesmo na quadra chuvosa, ainda há regiões do Interior que necessitam do reabastecimento das cisternas feito por caminhões em decorrência da irregularidade das precipitações. A situação afeta diretamente 350 pipeiros e 250 mil famílias em áreas rurais. A informação é do Sindicato dos Pipeiros do Ceará (Sindipece) e das Coordenadorias Municipais de Defesa Civil (Comdec).

“A situação se agrava a cada dia porque as chuvas são poucas, isoladas e infelizmente a Operação Caminhão-Pipa está suspensa”, disse o coordenador da Comdec de Canindé, Francisco Junior Mourão. “Perguntei a um comandante do Exército sobre a retomada do serviço, mas ele disse que não há recursos e nem prazo previsto”.

Ainda conforme Mourão, somente em Canindé, mais de seis mil famílias necessitam da continuidade da Operação de entrega de água.

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Localidades sem água das regiões mais afetadas

As comunidades rurais mais afetadas são das regiões do Sertão Central, Inhamuns e Sertão de Crateús. “Muitas localidades estão sem água”, frisou Gabriel Silva, secretário Adjunto de Agricultura e coordenador da Comdec de Aiuaba, nos Inhamuns. “Choveu nos últimos dois dias, mas foi na cidade e foram chuvas fracas, esparsas, sem atingir todas as áreas e sem chegar às cisternas”.

Marlene Oliveira é moradora e apontadora da Operação Caminhão-Pipa na comunidade Frescos dos Sampaio, na zona rural de Canindé. Isso significa que ela recebe água em sua própria cisterna e a redistribui aos outros residentes da localidade. Segundo Marlene, “os moradores estão me cobrando todo dia por água porque tudo está seco, cisternas e açudes”. 

O presidente da Associação dos Agricultores do Vale da Conceição, na zona rural de Canindé, Marciano Souza, também confirmou a escassez de água nas cisternas. “Infelizmente, as chuvas são muito poucas e está todo mundo sofrendo e precisando de água”.

“Aqui não está chovendo nada”, disse o coordenador da Comissão Municipal de Defesa Civil (Comdec) de Quixeramobim, Roberto de Almeida Batista. “Estamos precisando e muito dos caminhões-pipa”.

Ele adiantou que “só hoje o município contratou por conta própria onze carradas de água para distribuir às famílias na zona rural”. 

Ainda de Acordo com Roberto Almeida, “o município sozinho não tem condições de arcar com o pagamento dos serviços, mas está mantendo uma despesa extra para não deixar as famílias sem água”. Ele também confirmou que “os pipeiros não se interessam mais em participar do programa porque estão com pagamentos em atraso”. 

Carro-pipa
Legenda: As comunidades rurais mais afetadas pela suspensão da Operação Carro-Pipa são das regiões do Sertão Central, Inhamuns e Sertão de Crateús
Foto: Alex Pimentel

Pagamentos estão atrasados, segundo sindicato

De acordo com o Sindipece, o pagamento dos serviços prestados na distribuição de água está com atraso referente aos últimos três meses. “Tem pipeiros que não receberam o mês de dezembro de 2020 e todos não receberam nada neste ano”, afirmou o diretor da entidade, Eduardo Aragão. “As chuvas são reduzidas e localizadas por isso é preciso que esse programa continue”, pontua Aragão.

O atraso no pagamento dos serviços prestados e as regras atuais do programa trazem impacto porque, segundo a entidade que representa a categoria, “os pipeiros estão desmotivados, não estão atendendo às chamadas públicas”.

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A Associação dos Municípios do Ceará (Aprece) voltou a mostrar preocupação com a paralisação do programa e o vice-presidente da entidade, o prefeito de Várzea Alegre, José Hélder Máximo, observou que “há regiões em que a distribuição de água pode ser suspensa porque foram beneficiadas por boas chuvas, mas ainda há muitos municípios que necessitam da ação”.

O gestor disse que a entidade vai enviar ofício ao Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) solicitando esclarecimentos e uma reavaliação do quadro hídrico dos municípios que precisam de continuidade do atendimento.

No Ceará, a Operação Caminhão-Pipa é executada pelo 40º Batalhão de Infantaria, em Crateús; o 23º Batalhão de Caçadores (23BC) e o 10º Depósito de Suprimentos (DSup), em Fortaleza.

Esclarecimento do Ministério do Desenvolvimento Regional

O MDR informou por nota que “nos meses de janeiro e fevereiro, houve o repasse emergencial de R$ 89,7 milhões para a Operação Carro-Pipa (OCP) Federal, que foram descentralizados ao Exército Brasileiro (EB) - responsável pela execução do serviço”.

A pasta ainda informou que, depois do repasse emergencial, “não foi mais possível realizar os repasses integrais e regulares para a OCP Federal em decorrência do Projeto de Lei Orçamentária Anual - 2021 (PLOA) ainda não ter sido aprovado pelo Congresso Nacional”.

A nota, por último, frisa que “o MDR e o Ministério da Economia buscam alternativas no âmbito do Governo Federal para possibilitar a execução da Operação em sua integralidade e evitar prejuízos à população. Com a aprovação do PLN 1/21 no Congresso Nacional, na última quarta-feira (17), foi ampliada a execução orçamentária provisória para este ano, deixando mais próxima a solução para a questão. A medida aguarda sanção presidencial”.

A Operação Carro-Pipa (OCP) federal é executada em toda a região rural do Semiárido, abrangendo os estados do Nordeste e parte de Minas Gerais e Espírito Santo. No ano de 2020, a média mensal de atendimento foi de cerca de 2 milhões de pessoas em 600 municípios. Uma média de 4,2 mil carros-pipa foram contratados por mês. No total, foram investidos R$ 603 milhões para o serviço.

Carro-pipa
Legenda: No Ceará, a Operação Caminhão-Pipa é executada pelo 40º Batalhão de Infantaria, em Crateús; o 23º Batalhão de Caçadores (23BC) e o 10º Depósito de Suprimentos (DSup), em Fortaleza
Foto: Alex Pimentel

Chuvas abaixo da média histórica

De acordo com a Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), em janeiro passado a macrorregião do Sertão Central/Inhamuns registrou chuvas abaixo da média histórica para o período. Foram observados 32,8mm, quando o esperado era de 88,1mm, ou seja, um déficit de 62,7mm.

Em fevereiro, primeiro mês da quadra chuvosa, a Funceme registrou na mesma região, um índice positivo de 17,5%. Eram esperados para o período, em média, 105,3mm e choveu 123,7mm.

Já no decorrer deste mês, os dados parciais da Funceme apontam queda de 47,9%. A média do mês é de 174,1mm, mas até agora foram observados apenas 90,7mm.

 

 

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