Justiça determina que órgãos ambientais apurem contaminação de solo e água em Sobral

A análise deve ser feita pelo Ibama e pela Semace no prazo de 60 dias em área de empresa beneficiadora de couros na cidade da região Norte

Escrito por Honório Barbosa , regiao@svm.com.br

A Justiça Federal determinou que os órgãos ambientais Instituto Brasileiro de Recursos Naturais e Renováveis (Ibama) e a Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace) façam análise de solo e de água com o objetivo de verificar se ocorreu contaminação de solo e do lençol freático por elemento químico despejado pela empresa JBS, unidade de beneficiamento de couro, no município de Sobral, na região Norte do Ceará.

A decisão foi do juiz federal Sérgio de Norões Milfont Júnior e atendeu pedido do Ministério Público Federal (MPF) que ingressou com ação civil pública com pedido de liminar (tutela de urgência).

A ação visa apurar possível dano ambiental causado pela unidade industrial. Os órgãos ambientais estão autorizados a entrarem no imóvel "para fazer a coleta e posterior análise do solo e de eventual curso d'água ou outro recurso hídrico que exista na área, para atestar se há contaminação por elemento químico cromo ou por outro agente poluidor, devendo expor os resultados da diligência em relatório técnico a ser apresentado ao MPF no prazo de 60 dias”.

No despacho, a Justiça Federal frisou que se houver contaminação, “os órgãos ambientais deverão dimensionar o dano ambiental e especificar as medidas aptas à total recomposição do meio ambiente - incluindo a forma de remoção e a destinação adequadas do material contaminado”.

A decisão da Justiça Federal concedeu prazo de 30 dias para que a Semace informe se houve concessão de “licença ambiental para a empresa JBS operar no local do suposto dano, ou, em caso negativo, qual foi a destinação dada à área”.

O despacho judicial obriga, ainda, a Semace no prazo de 60 dias analisar a legalidade do respectivo processo administrativo referente à concessão de licença ambiental para a empresa beneficiadora de couro, a fim de identificar se as autorizações foram regulares.

De acordo com relatório da Justiça Federal, a “Semace limitou-se a argumentar pela ausência de requisitos para concessão da liminar, bem como informou que tomou todas as providências a seu cargo. Quanto ao pedido de análise laboratorial do solo, informou que não dispõe de equipamentos aptos a realizá-la”.

O magistrado observou também que “o Ibama, por sua vez, apresentou argumentos em tudo semelhantes, destacando que compete à Semace o licenciamento do local”.

Em nota ao Sistema Verdes Mares, a Semace informou que “o assunto envolve três diretorias (Fiscalização, Licenciamento Fortaleza e de Sobral), além de ser processo antigo, requer mais tempo para fazermos levantamento das informações” e que o órgão está “tomando as medidas cabíveis no que diz respeito à fiscalização no local, já colocando em sua pauta desde já”.

O Ibama ainda não respondeu às perguntas que foram encaminhadas pela reportagem. O SVM tentou ouvir a empresa JBS, mas o atendimento informou que gestores estavam em reunião.  

Entenda

A Ação Civil Pública (ACP) foi impetrada com base nos fatos apurados em Inquérito Civil instaurado em 2018, após representação, que informava sobre despejo irregular de resíduos perigosos – cerca de 1500 toneladas – com elevada concentração de cromo.

Por causa da alta toxicidade do cromo, a liberação do produto químico colaria em risco o meio ambiente - inclusive os lençóis freáticos da região - e a saúde pública, segundo apontou a procuradoria federal na ACP. 

Em resposta ao MPF, a Agência Municipal do Meio Ambiente (AMA) de Sobral informou que a área afetada está destinada à construção da Central de Tratamento de Resíduos - CTR, de responsabilidade do governo do Ceará, através da Secretaria das Cidades, e seria atribuição da Semace o licenciamento ambiental, monitoramento e fiscalização do local, por ser considerada atividade de impacto regional, conforme resolução Conselho Estadual do Meio Ambiente (Coema).

A Semace alegou que o dano ambiental foi possivelmente causado pela então empresa Cascavel Couros, a antiga Bracol Indústria de Couros de atividade de curtume e de beneficiamento de carne bovina.

Um relatório de Apuração de Infração Ambiental informou que a partir de pedido de renovação de licença de operação para curtume em nome da empresa Bracol em 2014 os fiscais compareceram ao aterro sanitário de Sobral e verificaram uma área exclusiva para Estação de Tratamento de Efluentes do curtume da empresa.

“A empresa foi adquirida pela JBS que assumiu o passivo ambiental e o dever de reparar o dano. Os fiscais notificaram os responsáveis da JBS, para que apresentassem documentação comprobatória do encerramento da atividade produtiva e destinação adequada dos resíduos sólidos e líquidos, bem como plano de recuperação do aterro industrial e das lagoas biológicas encontradas no local. Em virtude do descumprimento das notificações, foram lavrados autos de infração”, apontou a ação judicial.

A JBS apresentou um Plano de Recuperação da Área Degradada (PRAD). A Semace avaliou que o projeto atendeu ao disposto no Termo de Referência emitido pelo órgão ambiental e, em sequência, em 2017, assinou Termo de Compromisso, comprometendo-se à recuperação dos danos.

Em maio de 2018, os fiscais realizaram vistoria e emitiram um relatório técnico registrando que “não foi possível chegar ao local exato da execução do PRAD, porém, de uma distância de aproximadamente 30 metros, os agentes constataram o cumprimento de algumas medidas: a remoção do resíduo, contaminante da camada superficial do solo, a retirada da camada de solo diretamente afetada, o transporte e a destinação ambientalmente adequada dos resíduos e a reconformação topográfica do terreno em razão da retirada dos taludes da lagoa”.

O procurador federal observou, entretanto, que a Semace “não visualizou mudas de vegetação nativa exigidas no PRAD e ainda assim, concluiu pela execução satisfatória do Termo de Referência e do Termo de Compromisso pela JBS, registrando não haver passivo ambiental pendente junto à autarquia na área em questão.

O MPF também salientou que a própria Semace informou que “em momento algum, efetuou coleta de material na área do lixão, razão pela qual não poderia esclarecer sobre a concentração de cromo no local, alegando apenas que a atividade de curtume, que utiliza como principais produtos curtentes os sais de cromo” e concluiu que a autarquia não poderia “ter concluído pelo atendimento satisfatório do Plano de Recuperação da Área Degradada, sobretudo porque, como seus fiscais permaneceram a uma distância de 30 metros da área afetada no dia da vistoria, não houve exame do solo e dos recursos hídricos presentes na região, para averiguar se havia ou não a contaminação por agente tóxico”.

A Semace esclareceu que foi intimada no último dia 1º deste mês e que a “demanda encontra-se sob providências envolvendo a Coordenadoria Jurídica e da Diretoria de Fiscalização da autarquia, para cumprir a referida decisão dentro do prazo estabelecido”.