Jovens se livram das drogas pela fé

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Dependentes químicos conseguem se livrar do vício e encontrar a paz de espírito em entidades que reforçam a fé em Deus

Pacatuba. “Minha vida começou a desmoronar com o álcool. Meus pais nunca tiveram problema com a bebida. Mas nas festas de fim de ano sempre tinha cerveja, champanhe. Experimentei aos 11 anos. Aos 13, o primeiro porre. De 15 para 16, me decepcionei com uma namorada, fui para uma festa na praia e provei a maconha com amigos. Passei um ano sem tocar na droga. Mas, já aos 18 anos, usava todos os dias, era maconha, psicotrópicos, benzina, cola de sapateiro. Antes disso, aos 16 já roubava a minha mãe para pegar dinheiro para viajar e consumir. Aos 19 passei a usar cocaína. Trabalhava e o dinheiro era só para o consumo de drogas, que davam prazer, emoção, aventura. Perdi o emprego, passei a fazer pequenos roubos, arrombamentos. Quase morri. Então, certo dia, senti uma forte dor no peito e na cabeça, me ajoelhei e pedi a Deus que me ajudasse e, hoje, renovei a esperança de uma vida melhor que eu achava que tinha perdido”. Em poucos minutos, o jovem de 34 anos, Marcelo (nome fictício) contou como quase perdeu sua vida em função das drogas. A sua história poderia ser semelhante a de milhares de pessoas que, por curiosidade, resolveram só “experimentar” a sensação de euforia dada pelo entorpecente e não conseguiram mais voltar para a realidade. A diferença é que ele resolveu transformar a sua triste trajetória e buscar, pela fé em Deus, a salvação.

A ajuda para se livrar da dependência química e deixar de fazer “qualquer coisa” para consumir a droga ele encontrou na obra social Nossa Senhora da Glória Fazenda da Esperança, localizada no município de Pacatuba, Região Metropolitana de Fortaleza. Lá, Marcelo encontrou a paz que tanto precisava. “Aqui é como um santuário. Aprendemos sobre o amor de Jesus, seus ensinamentos, a trabalhar a nossa personalidade, a sermos mais humanos para com os outros e ver que o que realmente nos dá força para sair do vício é a palavra de Deus”, acredita.

A Fazenda da Esperança é uma instituição filantrópica, sem fins lucrativos, que trabalha com o propósito de resgatar pessoas que foram “tragadas” pelas drogas e oferecê-las uma vida de paz e harmonia, contribuindo, dessa forma, para a construção de um mundo melhor, com menos violência. “As nossas atividades se baseiam em um tripé: trabalho, convivência e espiritualidade. Não utilizamos nenhum medicamento. O tratamento aqui é todo voltado para a meditação da palavra de Deus”, contou o responsável pela Fazenda, César Garcia. Segundo ele, os jovens que chegam lá vêm de uma realidade de dependência “que afeta a moral, a dignidade, o caráter, atinge todos os bons princípios de um ser humano. A droga acaba com tudo isso”.

Ele faz o relato baseado na experiência própria, pois já foi um usuário de drogas. “Tive uma fase muito difícil, mas fui recuperado na Fazenda Esperança e hoje continuo repassando os ensinamentos para quem busca por ajuda”.

Em um lugar em meio à natureza, 57 homens — divididos em cinco casas, cada uma ocupada por 12 a 18 jovens — dividem o tempo diário trabalhando dentro da fazenda, capinando, plantando, fazendo suas próprias refeições, praticando esportes e exercitando a parte espiritual, com catequese, reza do terço, missa e meditação da palavra. “A Fazenda Esperança traz uma proposta de vida nova, um sentido de paz para essas pessoas que já não sabiam o que era a paz”.

Oportunidade divina

Para Marcelo, deixar para trás o passado sombrio e tentar recomeçar é mais uma oportunidade dada por Deus. “Nunca usei arma para assaltar, só a força. Mas, por diversas vezes, os bandidos me convidaram para fazer ‘paradas’ mais pesadas. Eu era escravo da droga, mas sabia que podia ser preso e perder a ‘liberdade’, de andar na rua, de fazer as poucas coisas que eu ainda gostava. Cheguei a ser internado em uma clínica onde era tratado com remédios, eu vivia dopado, ou melhor, drogado. Quero deixar tudo isso no passado e me reconstruir. Já estou conseguindo, pois, agora, sei a importância de um pedido de desculpa, do perdão, ações que contribuem para que todos nós possamos viver num mundo de paz”. Ele já até pensa no futuro. “Quando sair daqui quero fazer faculdade de Educação Física e trabalhar em um projeto social voltado para crianças. Dar de graça o que eu recebi de graça e, assim, estar construindo verdadeiramente a paz”.

Bem perto dali, um outro grupo de jovens também é chamado a reconstruir suas vidas. São dependentes químicos que estão conseguindo ajuda na instituição Leão de Judá. O medicamento também não é comprimido, é, sim, para eles, uma arma muito mais forte, as palavras da Bíblia.

A história deles não difere das encontradas na Fazenda Esperança. O contato com as drogas é muito cedo, com 8 ou 12 anos. Como foi o caso de Edson de Moura. Ele contou que conheceu todos os tipos de drogas, era eletricista de carros, tinha um bom emprego e perdeu tudo por causa do vício. “Fui preso por assalto, atropelado em uma tentativa de roubo e, até hoje, uso platina na perna por causa do acidente. As pessoas pensam que a gente faz isso porque quer, mas a compulsão pelo vício nos faz agir assim. Eu cheguei a roubar minha família, a vender botijão de gás e panelas, mas hoje me libertei”, disse Wosley Wyllien, que está há dez meses na Leão de Judá e já trabalha na instituição como auxiliar.

Estas duas instituições não recebem ajuda de governos ou empresas. Para se manter, os jovens da Fazenda Esperança fazem uma cesta com os produtos que eles fabricam, como doce. A própria família compra, para poder manter as despesas do familiar. Já a Leão de Judá recebe doações e realiza a campanha “Ajude-nos a ajudar” para arrecadar fundos. Os jovens também saem para vender canetas, biscoitos e saquinhos de lixo para automóveis.

ALERTA MUNDIAL

Dependência pode ter causas genéticas


Pacatuba. Ter um filho, um irmão, um marido, enfim, um parente, “tragado” pelo mundo — quase sem volta — das drogas é uma experiência absolutamente indesejável. As dores ocasionadas pelo efeito dos entorpecentes são incalculáveis. Difícil ainda é constatar que 13% da população, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), já nasce vulnerável geneticamente e corre o risco de ficar dependente a partir da primeira “experiência”. A informação é do psiquiatra e fundador do Instituto Volta Vida (IVV), Osmar Diógenes Parente, que trabalha no tratamento de dependentes químicos.

Segundo ele, começar a ser dependente químico, “é fácil, principalmente se a pessoa já nasce com a predisposição”. Mas, conforme o médico, existem também outros fatores, “sociais, econômicos, familiares, hereditários, liberdade em excesso, preço, oferta, aceitação dentro do grupo, inibição, dificuldade de lidar com as frustrações”. É necessário que as famílias tenham consciência de que existe uma fase da vida em que a pessoa está mais propícia a entrar neste mundo. “É, principalmente, na fase da adolescência, que o indivíduo se encontra mais exposto à possibilidade de ‘experimentar’ algum tipo de droga, inclusive a consumir bebida alcoólica, às vezes, até na própria família, um verdadeiro absurdo”.

Para o responsável pela Fazenda da Esperança (presente em 10 países), César Garcia, o que falta, atualmente, nas famílias é o tempo para o diálogo entre pais e filhos. “Um tempo para brincar com o filho, conversar, comer junto já é um passo para evitar o contato com as drogas. Já a ausência dos pais, as brigas nos lares levam à revolta e o filho vai buscar os incentivos dados pelo mundo”.

Entrar é fácil, o difícil é conseguir a recuperação dos dependentes. O primeiro passo para isso é a pessoa querer se “curar”. Osmar Diógenes explicou que “o primeiro passo é parar de usar qualquer tipo de droga. Daí vem uma fase difícil que é a abstinência, na qual o sofrimento, por conta da falta da droga, é realmente cruel. Nesse momento, a pessoa fica mais instável emocionalmente, irritada, intolerante, grosseira, infeliz. O apoio da comunidade, da equipe terapêutica é fundamental. É importante saber que ele não está só. Tem muita gente que o ama, tem uma família torcendo por ele. Somos felizes de participar de inúmeros casos de reconstrução familiar, de testemunhar pessoas voltando a estudar, a trabalhar, a viver em paz com sobriedade e serenidade”. Para ele, “é bom ver pessoas que, com a nossa orientação, encontraram uma nova maneira de viver”.

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Edson de Moura

29 ANOS
Eletricista

"A Leão de Judá é um lugar abençoado por Deus, que está me levantando e me ensinando a ser honesto"

Wosley Wyllien
22 ANOS
Eletricista

"O que liberta mesmo é a palavra de Deus. A gente aprende o que é certo para construir uma família feliz"

Sandro Cajuí Pereira
36 ANOS
Operário

"Estar aqui é uma bênção de Deus, que está me dando força para resgatar a paz e reconstruir minha vida"

LIBERTAÇÃO

"Na Fazenda Esperança, sentimos o quanto é importante estar com Deus, pois Ele é a paz"

César Garcia
Responsável pela instituição

"Medicamento só atrapalha o tratamento. A libertação só com a ajuda de Deus"

Cristiane Ramires
Vice-presidente da Leão de Judá

Mais informações:

Fazenda da Esperança
(85) 3345.1973
www.fazenda.org.br
Leão de Judá: (85) 3062.6352
www.leaodejuda-ce.org.br

Mais informações:

Instituto Volta Vida
(85) 3476.2192


EVELANE BARROS
Repórter