Covid-19: Inquérito sorológico e medidas rígidas em 5 cidades visam frear o aumento de novos casos

Último decreto do Governo do Estado recomendou ações mais restritivas para conter o avanço da Covid no interior. Além disso, a Secretaria da Saúde do Estado vai iniciar ação para identificar onde esses surtos estão acontecendo

Escrito por André Costa/Honório Barbosa/Nicolas Paulino , regiao@svm.com.br
Legenda: Aglomerações em atos políticos são apontadas, por especialistas, como responsáveis pela crescente de casos do coronavírus em algumas cidades

Após o início da campanha eleitoral, há cerca de um mês, algumas cidades do interior cearense voltaram a apresentar tendência de crescimento na curva de contágio do novo coronavírus. Para o Conselho das Secretarias Municipais de Saúde (Cosems) do Estado e médicos infectologistas, a aglomeração de pessoas nesses atos políticos está diretamente relacionada ao surgimento de novos casos.

O secretário da Saúde do Estado (Sesa), Dr. Cabeto, endossa esse panorama e assegura que "há correlação temporal entre o início da campanha e o aumento do número de casos" no Ceará. Para identificar esse salto e traçar novas ações, o Governo do Estado vai iniciar, ainda nesta semana, novo inquérito sorológico nas cidades de Iguatu, Crateús, Icó, Sobral, Juazeiro do Norte e Fortaleza.

"Queremos saber de novo o número de pessoas que estão imunizadas e a atual taxa viral. Já que conhecemos a anterior, que estava abaixo de 1%, queremos saber se isso mudou e, no caso de Fortaleza, saber também em que bairro isso mudou", detalha Dr. Cabeto. Só na Capital cearense, vão ser três mil amostras, segundo a Sesa. "Vamos rastrear para saber exatamente onde estão esses surtos", acrescenta o titular da Pasta.

A presidente do Cosems no Ceará, Sayonara Cidade, se mostra preocupada com o surgimento exponencial de casos em diferentes microrregiões de Saúde do interior. "A pandemia é grave, mas a população não está colaborando, relaxou e o resultado dessas aglomerações da campanha eleitoral e de outros eventos está aparecendo, e pode continuar crescendo", critica. Para reverter este cenário, ela defende a "adoção urgente" de medidas preventivas.

Medidas

Essas ações mais restritivas, como sugere Sayonara, serão adotadas em pelo menos cinco municípios cearenses, conforme consta no decreto governamental publicado no último domingo (18). As cidades de Tauá, Crateús, Icó, Russas e Juazeiro do Norte receberam recomendação para adotarem medidas mais rígidas de isolamento social, que incluem fiscalização e impedimento de aglomerações.

Dr. Cabeto explica que o decreto estadual versa recomendação aos municípios acerca do cumprimento das medidas sanitárias, como uso obrigatório de máscaras e manutenção do isolamento social. "Estamos em uma situação de alerta epidemiológico para essas cidades", destaca.

Além disso, a Secretaria da Saúde do Ceará e o Cosems encaminharam ofícios ao Ministério Público do Estado (MPCE) e ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE) para que promotores de Justiça e juízes eleitorais atuem impedindo a realização de eventos partidários com aglomerações - caminhadas, amplas reuniões, carreatas e comícios. "Temos assistido muito descumprimento principalmente em municípios do interior", reforçou o Dr. Cabeto.

O médico infectologista e professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), Ivo Castelo Branco, é mais um que correlaciona o crescimento dos casos ao momento eleitoral ativo. "Com certeza há uma relação direta entre o comportamento dos moradores e as aglomerações em eventos eleitorais que contribuem para o aumento dos casos", analisou.

Crescimento

[Atualização às 12h18min, de 22/10/2020] O Sistema Verdes Mares errou ao noticiar médias móveis e crescimento dos casos em Fortaleza, Crateús e  Icó. O levantamento inicial levou em consideração a data de confirmação dos casos e não levou em conta que, no último dia 5 de outubro, a Secretaria de Saúde do Estado homologou no Integrasus a confirmação de 11.482 casos de Covid-19 no Ceará, registrados entre março e setembro de 2020. O correto é fazer a média móvel de casos levando em conta a data de início dos sintomas.

Em Fortaleza, por exemplo, na semana epidemiológica 40 (entre os dias 27 de setembro e 3 de outubro), a média móvel estava em 56 casos/dias. Uma semana depois, foi para 71, o que representa variação de 26,78%. Na semana seguinte (11 de outubro a 17 de outubro), a média caiu para 66,71, ainda assim, porém, com uma elevação se comparada à situação verificada na semana 40. 

Segundo dados do Integrasus, em Crateús, Russas, Tauá e Juazeiro do Norte, cidades que receberam a recomendação do Governo do Estado para adotarem medidas mais rígidas de isolamento social, na semana epidemiológica 40 (do dia 27 de setembro a 3 de outubro), de modo geral, tiveram média movel de casos mais altas que nas demais semanas (41 e 42). Entre os dias 4 de outubro e 17 de outubro, as médias, embora distintas nas quatro cidades, recuaram em cada localidade. 

Já em Iguatu, município que também tem recomendação para aumentar o rigor nas normas sanitárias, na semana 40, a média móvel foi de 14,85 casos por dia. Na semana seguinte (41) passou para 16,17. Nos outros sete dias foi para 14,28, chegando, dessa forma, a um patamar semelhante ao da semana epidemiológica 40. 

Legenda: Juazeiro do Norte, no Cariri, é a segunda cidade do Estado com maior número de casos de Covid: 15.967
Foto: Antonio Rodrigues

Para frear a crescente dos casos nesses municípios e evitar que outros apresentem a mesma tendência, o médico e professor Ivo Castelo Branco argumenta que "o governo deve fazer o que tem de ser feito, mesmo que adote medidas que não sejam simpáticas".

Municípios

O início desta semana nas cidades mencionadas na publicação do novo decreto estadual tem sido "para traçar estratégias". O gestor da Saúde em Russas, no Vale do Jaguaribe, Reginaldo Chagas, disse que "vai atender as recomendações e esperar que o Ministério Público Eleitoral adote medidas mais enérgicas, se necessário, contra aglomerações em eventos de campanha".

No entanto, ele ressalta que o aumento pode estar ligado "a casos que só agora foram notificados, mas que ocorreram há mais de três semanas". Já o secretário de Saúde de Tauá, Marcos Noronha, na região dos Inhamuns, avalia que os casos "aparecem porque temos realizado testes em massa, até mais que o Estado".

Contudo, ele lamentou o comportamento dos moradores e atribuiu à Polícia Militar o papel de fiscalizar e punir. "Existem aglomerações na campanha eleitoral e muitos grupos não estão nem aí, mas quem tem a força de coerção é o Estado, que baixou as normas sanitárias".

Em Crateús, o assessor jurídico do Município, Emanoel Castro, também afirmou que a cidade vai adotar as medidas recomendadas pelo governo do Estado para tentar dispor de maior controle e evitar a expansão da pandemia do novo coronavírus. A Secretaria da Saúde de Crateús atribuiu o crescimento do número de casos ao processo de "reabertura de restaurantes e lanchonetes" onde as pessoas permanecem sem máscara. Neste cenário, foram aplicadas 40 notificações contra estabelecimentos comerciais abertos de forma irregular.

O procurador geral de Icó, Fagundes Lourenço, antecipou que serão implantadas três barreiras sanitárias no Município com mais rigor na fiscalização. Ele destacou ainda que a cidade reforçará a fiscalização a restaurantes e pontos com aglomeração. "O nosso maior problema são os restaurantes", pontuou o procurador geral.

Juazeiro do Norte, no Cariri, é o segundo município que registra maior número de casos da Covid-19, atrás apenas de Fortaleza. A diretora de Vigilância em Saúde do Município, Evanúsia de Lima, disse que a Secretaria da Saúde "está fazendo a análise das informações do decreto". Ela também ressaltou que será feito uma auditoria nos casos. "Queremos entender e verificar os diagnósticos de pacientes locais e de outros municípios", explicou Evanúsia. "Vamos ter uma reunião do grupo de trabalho para direcionar essa situação". A procuradoria geral do Município também vai analisar as recomendações propostas no decreto estadual e verificar a adoção no âmbito local.

Em Fortaleza, Dr. Cabeto indica que a reabertura dos voos internacionais carece de maior atenção devido à segunda onda na Europa. "É muito importante que a gente tenha um papel [ativo] do governo Federal, do Ministério da Saúde, da Anvisa e Anac. É importante que haja protocolos nacionais porque, uma vez tendo segunda onda na Europa e transporte de passageiros, temos que estar com protocolos em dia até porque não sabemos se essas cepas virais são as mesmas", concluiu o secretário. Ontem (20), porém, a Anvisa negou o pedido de Camilo Santana (PT) para realização de testes nos passageiros que chegam ao Ceará pelo aeroporto de Fortaleza, em voos internacionais.

Médias móveis de casos - conforme Integrasus

Fortaleza
27/09 a 03/10: 56 casos/dia
04/10 a 10/10: 71 casos/dia
11/10 a 17/10: 66,71 casos/dia

Tauá
27/09 a 03/10: 29,14 casos/dia
04/10 a 10/10: 13,42 casos/dia
11/10 a 17/10: 7,28 casos/dia

Russas
27/09 a 03/10: 6,14 casos/dia
04/10 a 10/10: 5,71 casos/dia
11/10 a 17/10: 1,71 casos/dia

Crateús
27/09 a 03/10: 47,71 casos/dia
04/10 a 10/10: 20,71 casos/dia
11/10 a 17/10: 5,85 casos/dia

Iguatu
27/09 a 03/10: 14,85 casos/dia
04/10 a 10/10: 16,17 casos/dia
11/10 a 17/10: 14,28 casos/dia

Icó
27/09 a 03/10: 23,42 casos/dia
04/10 a 10/10: 11 casos/dia
11/10 a 17/10: 4,57 casos/dia

Juazeiro do Norte
27/09 a 03/10: 16,28 casos/dia
04/10 a 10/10: 9,57 casos/dia
11/10 a 17/10: 1,28 casos/dia

Fonte: Integrasus, dados coletados até as 10h do dia 22 de outubro. 

 

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