Condições para produção sustentável da lagosta mais que dobram

A biomassa é o conjunto de fatores orgânicos para o desenvolvimento natural da espécie. No Ceará, o valor saltou de 13%, em 1990, para 29% em 2018. O aumento favorece a exploração sustentável do crustáceo

Escrito por Rodrigo Rodrigues , rodrigo.rodrigues@svm.com.br
Legenda: O defeso da lagosta começou a ocorrer, no Ceará, em 2012, e visa à garantia da manutenção da espécie
Foto: NATINHO RODRIGUES

A s perdas dos estoques de lagosta a partir da década de 1980, em decorrência da sobrepesca, preocupam ambientalistas e quem depende da atividade para sobreviver. Felizmente, um estudo pioneiro no Estado mostra resultados promissores: o porcentual de biomassa mais que dobrou em 30 anos.

"A biomassa se refere ao peso de um grupo de indivíduos. A importância de aumentar a biomassa se deve à grande probabilidade de aumentar o tamanho dos indivíduos e consequentemente o peso deles ou, então, a quantidade", explica a pesquisadora da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap), que faz parte do estudo, doutora Juliana de Carvalho Gaeta.

Apesar de ainda considerado baixo, esse nível teve um salto considerável. Entre 1990 e 2011, o índice era de aproximadamente 13%, valor que saltou para 29%, entre 2012 e 2018. Os dados evidenciam, conforme a pesquisadora, os benefícios do período de defeso - medida instituída anualmente pelo Governo Federal que paralisa, por seis meses, a pesca da lagosta. O período passou a ser implementado no Ceará a partir de 2012.

Para ter ideia, em 2019, 90% da pesca foram de exemplares capturados com idades de dois a seis anos - que nasceram justamente nos períodos de defeso. Uma lagosta adulta (75 mm de comprimento) - de 3 a 4 anos, da espécie Panulirus argus, por exemplo, produz em média 300 mil ovos, enquanto uma lagosta de 150 mm de comprimento de carapaça é capaz de produzir em média 2 milhões de ovos. Assim, quanto mais velha a lagosta, mais tempo ela tem de reprodução.

"As lagostas não param de reproduzir ao longo da vida e não perdem a capacidade de procriar, pelo contrário, quanto mais velhas as fêmeas, maior a produção de ovos e maior o tamanho dos ovos", explica Gaeta.

Resultados

Os resultados preliminares da pesquisa, realizada pelo Programa Cientista Chefe - área de Pesca e Aquicultura, da Funcap, foram apresentados no fim de setembro. O cientista chefe, professor Raúl Cruz, ressaltou a importância do avanço. "Nos anos 80 para 90 havia biomassa e taxa de reprodução muito baixas. A partir de 2012 já existe uma recuperação da biomassa por efeito do defeso de seis meses. O defeso, logicamente, protege esse período de reprodução. Isso está relacionado com o processo", explicou. "É um trabalho muito importante para todos, mas somente o defeso, por si só, não vai resolver o problema", adverte.

Pesca

Sobre este ponto, Gaeta acrescenta que os consumidores têm papel fundamental. "É importante que as pessoas tenham consciência disso para, talvez, quando forem comer lagosta, não comerem as pequenas, o que é ilegal; também não comprarem lagosta ovada de nenhum pescador ou mercado", explica.

O pescador e coordenador de políticas públicas do Sindicato dos Pescadores e Pescadoras Artesanais de Icapuí, Tobias Soares, 40, também avalia os benefícios do defeso, mas reconhece que há desafios.

"O defeso é uma ferramenta muito importante, mas o esforço de pesca também aumentou. Um barco que levava 50 filas de rede caçoeira, hoje pesca com 100. Estamos em um equilíbrio muito frágil que, acontecendo qualquer evento inadequado - mudanças de correntes, derramamento de óleo, aquecimento global -, teremos um impacto muito negativo sob os estoques".

Segundo ele, a implantação do defeso propiciou manter o patamar de produção. "Antes, a gente pescava 11.500 toneladas (ano), hoje, temos cerca de 4.500 toneladas, que vêm se mantendo. Nem sobe e nem baixa, as oscilações são muito pequenas", aponta. "Mas observo que ainda há muita comercialização mesmo no defeso. Não para exportação, mas para a comercialização interna. Nos bares, barracas, ainda se via o fluxo muito grande". Neste ano, o defeso ocorreu até 31 de maio.