Bitupitá sofre entre a área de mangue e o mar

Escrito por Redação ,

Por estar dentro de uma APA, a legislação não permite que novas casas sejam feitas para acolher a comunidade

Barroquinha. Em 1934, imprensados pelo mar e pelas dunas, os moradores de uma comunidade inteira de pescadores tiveram que abandonar o Pontal das Almas e se transferir para a Praia de Bitupitá. Hoje, o drama volta a se repetir. A diferença é que, ao invés das dunas, é o mangue quem divide com o oceano a investida contra o povoado.

"Era adolescente quando tivemos que deixar nossas barracas e vir embora para cá. A gente insistiu enquanto pôde. Mas chegou a hora que não dava mais". Quem relata essa história é o pescador Antônio Maximiano Costa, o seu Pianô, de 80 anos.

Conforme o pescador, no Pontal das Almas "existia uma igreja e a casa dos Demétrius. Eram os únicos imóveis de alvenaria. O resto era de palhoça mesmo. O mar não respeitou ninguém e arrastou tudo. Na época da mudança, esse local aqui era conhecido como Morro da Cabeça, pois foi encontrada a cabeça de um homem. O corpo nunca acharam. Depois, resolveram trocar para Bitupitá".

O que seu Pianô não esperava era ter que passar pela mesma aflição tanto tempo depois. "É o que a gente está percebendo. Essa história eu já vi. A água está passando das casas e chegando até a rua. Só que, quando avançar mais ainda, pelo visto vai alcançar o mangue. E aí vamos ficar sem saída", adverte.

"A preocupação já faz parte da nossa vida. Desde 1983, época em que cheguei aqui, que vivo sobressaltado. É bem verdade que nos últimos anos o temor aumentou. A gente vai se prevenindo como pode. Todos por aqui aterraram a praia para construir um pouco mais alto do que o nível do mar. O resultado é que a água da maré contorna as casas e vai até a rua detrás. Até quando conseguiremos escapar, só Deus sabe", frisa Joaquim Edilo dos Santos, 70 anos.

Valioso

Por conta dessa situação é que os restos de construção são disputados pelos moradores. "Entulho aqui vale mais do que muitas mercadorias. É algo que não desperdiçamos de forma alguma. Desafio vocês a andarem por aí e encontrarem qualquer pedaço de telha quebrada. Não há possibilidade. Toda demolição aqui é aproveitada como alicerce", diz seu Joaquim, que é pedreiro.

O líder comunitário e vereador José Joaquim de Souza Neto revela que a situação da comunidade, formada por 800 famílias, é muito complicada. "O problema é que esse local aqui é uma Área de Proteção Ambiental (APA). Por conta disso, o remanejamento das famílias é difícil. Existe um projeto para a construção de 200 casas na única área possível por aqui. Só que a legislação impede justamente por tratar-se de uma APA. Até mesmo a licença ambiental para a construção de uma estrada foi barrada. O que é contraditório é que as edificações clandestinas, como não precisam de licença, são feitas livremente. Isso, aliás, é um dos fatores que estão comprometendo toda a coletividade, já que estão invadindo cada vez mais o espaço que é do mar". (FM)

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