Os números não mentem (e indicam caminhos a seguir)
Estudo da NTU aponta queda de 45% na demanda e sugere medidas para atrair passageiros ao transporte urbano
A Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) apresentou no seu Seminário Nacional, em agosto passado, o Anuário NTU 2023/2024, marcando 30 anos de acompanhamento do transporte urbano por ônibus no Brasil. Com dados de nove capitais e regiões metropolitanas que representam 33% da frota nacional, o anuário revela uma queda acentuada de 45% no número de passageiros mensais transportados: de 390 milhões em 2013 para 214 milhões em 2023. A quilometragem produzida também reduziu 40%, passando de 230 milhões para 138 milhões de quilômetros mensais, impactando diretamente a sustentabilidade do setor.
A pandemia provocou um declínio abrupto na demanda, com uma queda de até 80% no número de passageiros, em março de 2020. Desde então, houve uma recuperação gradual, mas a demanda atual ainda está 15% abaixo do nível transportado na pré-pandemia, refletindo uma migração de passageiros para outros modos, tais como: carros, motos e aplicativos.
O dado indica uma "demanda perdida" que não deve retornar ao transporte público, reduzindo a produtividade do setor que, em 1993, tinha um índice de passageiros equivalentes por quilômetro (IPKe) de 2,52, caindo para 1,53, em 2023.
Além da queda na demanda, a produtividade do sistema, medida pela quantidade de passageiros transportados por veículo, sofreu uma redução de 53%, entre 1995 e 2023, passando de 631 para 295 passageiros diários, por veículo.
Esse desempenho reflete a falta de investimentos em infraestrutura e o aumento dos congestionamentos, que elevam o tempo de viagem e afetam o equilíbrio econômico-financeiro do setor. A idade média da frota também subiu para 6,42 anos em 2023, o maior valor da série histórica, o que demonstra uma baixa renovação dos veículos.
A Pesquisa de Mobilidade, realizada pela Confederação Nacional dos Transportes – CNT, avaliou 319 municípios com mais de 100 mil habitantes, abrangendo 57% da população brasileira. O ônibus continua sendo o meio de transporte mais utilizado, responsável por 31% dos deslocamentos urbanos, mas sofreu uma redução em comparação aos 45% em 2017.
Em contrapartida, o uso do veículo próprio subiu de 22% para quase 30%, enquanto o uso de serviços por aplicativos cresceu de 1% para 11%. Entre os que mudaram de modo de transporte, os principais fatores apontados foram conforto insuficiente (28,7%), horários inflexíveis (20,7%), e tempo elevado de viagem (20,4%).
Os altos custos e a falta de conforto explicam os motivos para quase 30% dos entrevistados abandonarem o ônibus e 27% diminuírem seu uso. Contudo, 63,5% afirmam que retornariam ao transporte público, caso as tarifas fossem menores, os ônibus mais confortáveis e as viagens mais rápidas.
Entre os que substituíram o ônibus, 25,2% dos passageiros voltariam a utilizar o transporte público, se a tarifa fosse reduzida pela metade. Além disso, o custo médio do ônibus, de R$ 9,75 ao dia, é competitivo em relação ao dispêndio diário com veículos próprios (R$ 30,00) e aplicativos (R$ 27,00), sugerindo que ajustes de tarifa e melhorias de qualidade podem ajudar na recuperação da demanda.
Recomendações para melhorar o transporte público
Para reverter o declínio no uso de ônibus, o passageiro deve ser tratado como cliente e o transporte coletivo como serviço essencial, com financiamento adequado e investimentos em infraestrutura, como pistas exclusivas, corredores e terminais modernos. A separação entre tarifa técnica (custeio operacional) e tarifa pública (valor pago pelo usuário) também é fundamental para atrair passageiros.
Além disso, é crucial que o transporte público seja visto como uma responsabilidade de Estado, com apoio ao financiamento investimento em infraestrutura, renovação da frota e concessão de subsídios aos passageiros de baixa renda, para tornar o sistema mais atrativo e acessível.
Para garantir o desenvolvimento e a modernização do sistema de transporte coletivo, é essencial investir na atualização tecnológica da frota, no correto dimensionamento da demanda e da oferta e na definição de rotas e horários mais flexíveis, possibilitando a prestação de serviços confiáveis, regulares e pontuais. Tais avanços não só aprimoram a competitividade do transporte público em relação aos meios individuais, mas também contribuem para uma mobilidade urbana mais qualificada e mais sustentável.