Pipas provocam acidentes

Escrito por Redação ,
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Foto: Thiago Gaspar
Desde o início do ano, 12 alimentadores da Coelce saíram de operação por conta de acidentes com pipas

Os ventos fortes coincidindo com as férias escolares fazem do fim de junho e início de julho a época ideal para soltar pipas. A prática, ensinada de pai para filho, persiste principalmente na periferia de Fortaleza, onde o cinza das favelas e o desbotado dos calções dos meninos contrastam com o colorido das pipas. O brinquedo disputa espaço no ar, cortando umas às outras.

Mas essa briga de raias que ocorre no céu é feita à base de muito cerol (mistura cortante feita com vidro de lâmpada moído, cola e clara de ovo) passado na linha, quase invisível sob o sol forte. Quando a linha está bastante esticada, o poder de corte é aumentado, quase como uma lâmina, tornando-se mais eficiente para derrubar outras pipas, mas também para machucar seriamente as pessoas e danificar equipamentos.

E como nas periferias quase não há grandes espaços abertos para lazer, os meninos soltam pipa nas ruas mesmo, tentando desviar das outras raias, dos carros, motoqueiros, ciclistas, transeuntes, postes e fios elétricos. Ao fim do dia, o que se vê são crianças com as mãos cortadas de cerol e restos de pipas por todos os lados, inclusive enroscados na fiação elétrica.

Em muitos casos, os danos nos fios são tantos que chegam a prejudicar o fornecimento de energia elétrica. Segundo a Companhia Energética do Ceará (Coelce), somente no mês de junho, cinco ocorrências provocadas foram registradas. Desde o início do ano, 12 alimentadores (parte da rede que alimenta os transformadores) saíram de operação por conta de acidentes com pipas, afetando 99.410 consumidores.

Mas a Coelce alerta que as pipas não são prejudiciais somente aos usuários, mas às próprias crianças porque, caso um fio com cerol encoste numa parte desencapada do fio, pode conduzir energia elétrica e causar choques fatais.

Além disso, apesar de não possuir estatísticas de acidentes com linhas de pipas, o Instituto José Frota (IJF) afirma atender casos de ferimentos causados pelo brinquedo. Com medo de cortes na região do pescoço, muitos motoqueiros passam a usar, nesta época do ano, uma espécie de haste sobre o guidom.

Porém, os meninos não admitem que tal brincadeira possa ser perigosa. Conforme o estudante Eduardo Maia, de 13 anos, que há oito solta pipa, o cerol só faz pequenos cortes em sua mão. “Eu sei que quando a pipa puxa e a linha estica o corte fica pior, mas aí não tem ninguém perto”, diz.

RENATA BENEVIDES
Repórter

ENQUETE
Com que idade começou na brincadeira

Denis Rodrigues - 13 ANOS - Estudante
Eu solto pipa desde os 11 anos e venho sempre que dá tempo e o vento ajuda. Com as férias, vou praticar muito mais

Eduardo Maia - 13 ANOS - Estudante
Aprendi a soltar pipa sozinho, quando tinha cinco anos, e nunca mais parei. O bom é cortar a raia dos outros

Ramom Sousa de Abreu - 11 ANOS - Estudante
Comecei na brincadeira ano passado. Já estou até conseguindo brincar com os meninos grandes

FIQUE POR DENTRO
Brinquedo surgiu 400 anos antes de Cristo

Pipa, papagaio, pandorga ou raia é um brinquedo que voa preso a extremidade de uma linha ou barbante. Em geral, tem uma armação leve de bambu ou madeira, sobre a qual se estica uma folha de papel ou plástico. Os historiadores acreditam que tenha sido inventada entre 400 e 300 (AC) por Arquitas, um grego da cidade de Tarena. No entanto, os chineses afirmam que um de seus generais Han Sin inventou em 206 (AC), para uso dos militares.

O nome pipa surgiu por ter formato semelhante à vasilha de madeira usada para guardar vinhos e também é chamada de pipa. Esse tipo de papagaio era confeccionado com três varetas, e foi usado por muitos anos. Foram criadas três versões: duas feitas com três varetas e uma com quatro.

Com o passar do tempo, essas pipas ficaram conhecidas como pipas-modelo. No fim da década de 40 do século passado, surgiu a pipa pião oriunda do Nordeste, e o cerol. As pipas-modelo, que usavam lâminas de barbear para cortar a linha dos adversários, não resistiu ao cerol e a rapidez das pipas pião e foram extintas, dando lugar à atual cultura.

No Ceará, no linguajar da meninada, as pipas recebem ainda outros nomes, de acordo com suas características. A chamada paquetão é uma raia grande e imponente, mais almejadas pelo iniciantes. Já a uruquinha é o oposto, sendo sempre pequena e rápida. O periquitinho é a pipa feita de papel e o pangão a feia, com vôo desajeitado e confeccionada com sacolas plásticas. Há ainda a pipa bolachinha, redonda, pequena e feita de isopor.