Em 6 meses, pacientes com doença rara podem ficar sem tratamento

Degenerativa, a Mucopolissacaridose afeta diversos órgãos, como cérebro, olhos, ouvidos, coração, fígado, ossos e articulações. Novo protocolo do Ministério da Saúde causa temor entre pacientes, que podem ficar sem remédios

Escrito por Redação , metro@verdesmares.com.br
Legenda: Daniela de Oliveira foi diagnosticada com a doença aos 3 anos de idade
Foto: Foto: Camila Lima

Há três anos, todas as sexta-feiras, Daniela de Oliveira, 29, acorda cedo para ir ao Hospital Geral de Fortaleza (HGF). No local, ela realiza o tratamento com o Vimizim, uma terapia de reposição enzimática no tratamento à mucopolissacaridose (MPS). A medicação, entretanto, pode ter o fornecimento interrompido no prazo de seis meses para os tipos IV e VI da doença, com reflexos diretos na saúde de 80% dos 37 pacientes no Ceará. A decisão está no novo protocolo elaborado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec).

A situação preocupa Daniela, diagnosticada com MPS aos três de idade. A doença genética do metabolismo é causada por deficiência de enzimas. Afeta diversos órgãos, como cérebro, olhos, ouvidos, coração, fígado, ossos e articulações. O tratamento auxilia na estabilização da capacidade degenerativa.

"Eu sou pequenininha, tenho problema de vista, audição e no coração. Tudo isso que eu tenho é decorrente da MPS", explica Daniela. Desde que começou o tratamento no HGF pelo SUS, as crises respiratórias e os problemas no coração diminuíram.

De acordo com a Associação Cearense de Doenças Genéticas (ACDG), no Ceará, cerca de 37 pessoas foram diagnosticadas com MPS até este ano. Ela pode ser manifestada em sete formas e há tratamentos com medicação para os tipos I, II, IV e VI. Dos 37, 80% devem ficar sem os remédios quando o protocolo for implantado, ressalta Mônica Aderaldo, advogada da ACDG.

Daniela de Oliveira não foi a única da família a manifestar a doença, ela tinha um irmão, o Itallo Mendonça de Oliveira, que faleceu em 2011 decorrente de complicações da MPS.

O jovem de 17 anos não recebeu a medicação na época. "Eu fiquei muito triste com a perda do meu irmão e, ao mesmo tempo, muito assustada. Eu achava que ia morrer toda vez que eu gritava.

Em seis meses, Daniela deve não receber mais o medicamento por conta do novo protocolo. "Eu fico com medo de novo, porque a doença pode evoluir mais. A minha prima Antônia, que faz tratamento comigo, deixou de andar", afirma Daniela.

Para a advogada Mônica Aderaldo, o protocolo é irresponsável e sem precedentes científicos. "A gente tem direito à vida. Essas pessoas precisam desse medicamento. Vão tirar a qualidade de vida delas. Elas vão morrer como morriam antigamente", diz.

Doença

A médica geneticista Erlane Marques explica que a doença provoca "um erro genético que compromete os órgãos e tecidos, fazendo com que apareçam os sintomas". A depender do estágio da doença no início do tratamento, as complicações podem ser mais graves, pontua.

Sobre o protocolo da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), Erlane afirma que os critérios estabelecidos são "totalmente anti-éticos e eugênicos, retirando a oportunidade dos pacientes continuarem a medicação ou iniciarem em casos novos, quando não se pode medicar um cadeirante", completa.

Critérios revisados

Procurado, o Ministério da Saúde informou que "os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDTs) para Mucopolissacaridose (MPS) IV e VI estão em vias de publicação".

O órgão justifica que "foram revisados critérios para o tratamento com terapia de reposição enzimática com 'galsulfase'. Cabe esclarecer que os pacientes cadeirantes, que cumpram os critérios de inclusão, não estão excluídos dos protocolos e continuarão recebendo o tratamento".

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