PMs acusados de agredir e matar jovem em operação policial em Fortaleza vão a júri popular

O homicídio teria acontecido por motivo torpe, já que consistiu no "desprezo e desconsideração para com a vida da vítima" e com uso de recurso que impossibilitou a defesa de Tarciano

Escrito por Emanoela Campelo de Melo , emanoela.campelo@svm.com.br
natinhopms
Legenda: Não há data para o júri
Foto: Natinho Rodrigues

Três policiais militares devem sentar no banco dos réus devido à morte de um jovem abordado em uma operação policial no bairro Pici, em Fortaleza. Tarciano Pereira da Silva foi agredido e atingido por um disparo de arma de fogo, na frente dos pais dele.

O juiz da 5ª Vara do Júri decidiu pronunciar (levar ao Tribunal do Júri Popular) os PMs Hericksson Richard da Silva Barreto, Israel Paiva Saraiva e Frank Wendel de Sousa Soares. Hericksson é acusado de efetuar o disparo que atingiu a vítima. Já Israel e Wendel teriam participado das agressões e do homicídio devido à omissão.

No decorrer do processo, Hericksson chegou a alegar legítima defesa. A decisão foi proferida no último dia 4 de setembro e publicada no Diário da Justiça eletrônico dessa quarta-feira (11).

Veja também

Consta no processo que "há indícios portanto de que a vítima foi atingida quando já havia sido liberada pelos policiais, após abordagem policial, sendo razoável o entendimento de que não portava arma quando alvejada, e numa ocasião em que não se divisava conflito iminente, que poderia dar ensejo à intenção de ataque ou de revide por parte da vítima"

O homicídio teria acontecido por motivo torpe, já que consistiu no "desprezo e desconsideração para com a vida da vítima" e com uso de recurso que impossibilitou a defesa de Tarciano.

Ainda na decisão de pronúncia, o magistrado destacou que "a prova testemunhal, assim como a manifestação dos réus em sede de interrogatório, não deixa dúvidas de que os réus atuaram no referido procedimento policial. Há indícios de que o tiro que atingiu Tarciano Pereira da Silva foi desferido pelo policial militar Heriksson Richard da Silva".

O QUE OS RÉUS DIZEM

O Ministério Público do Ceará (MPCE) apresentou memoriais finais pedindo a pronúncia dos acusados. As defesas de todos os réus pediram a absolvição ou a impronúncia.

"O réu Wendel de Sousa Soares informou, em sede de interrogatório judicial, que estava no meio do beco quando escutou dois disparos de armas diferentes e, pouco depois, próximo à saída do beco, deparou-se com o policial Heriksson Richard da Silva, muito nervoso, dizendo que "o rapaz havia atirado nele", após o que teriam iniciado o procedimento de socorro à vítima alvejada"

"Da mesma forma, a manifestação do réu Israel Paiva Saraiva em sede de interrogatório judicial, que aduziu que quando estava saindo do beco ouviu dois disparos e pouco depois viu a vítima no chão e o policial Heriksson Richard, que disse "ele atirou em mim, ele atirou em mim". Por fim, o réu Heriksson Richard da Silva Barreto, que disse em juízo que visualizou a vítima correndo e apontando a arma para o réu, ocasião em que efetuou o disparo de arma de fogo"

Já a defesa de Heriksson disse que no dia dos fatos o PM "tinha posição de motorista da viatura, e, no dia do ocorrido, ficou com a responsabilidade de resguardar as quatro viaturas que ali se encontravam, ficando apenas na entrada/saída do beco, controlando a movimentação da população que se aproximava do local, por medida de segurança, não tendo em nenhum momento entrado no beco junto com os demais policiais para realizar as abordagens".

Ainda segundo a defesa do PM acusado pelo disparou que matou a vítima, o agente foi "surpreendido por barulho de pessoas correndo em direção à saída/entrada do beco onde se encontrava, ocasião em que passou a olhar para dentro do beco, recebendo o primeiro disparo, um tiro em sua direção. O ora requerente, em seguida, atirou como forma de coibir a injusta agressão sofrida, vindo posteriormente a retornar para a posição da foto acima para se resguardar".

A reportagem entrou em contato com a defesa de Heriksson a fim de saber posicionamento acerca da pronúncia, mas não teve resposta até a edição desta matéria.

DENÚNCIA DO MPCE

A abordagem aconteceu em abril de 2020, no Beco do Maia, bairro Pici. Consta na denúncia do MP que a operação iniciou por determinação do Subcomando do Batalhão.

Por volta das 22h, os réus teriam abordado Tarciano. Os pais da vítima chegaram ao local e já encontraram o filho rendido, segundo testemunhas.

Conforme os pais do jovem, eles sequer puderam se aproximar do filho, tendo permanecido na entrada do beco, mas chegaram a presenciar as agressões. 

"Testemunhas chegaram a pegar celulares para gravar a ação dos réus, mas os réus constrangeram ilegalmente essas pessoas, ameaçando e dizendo “tu guarda esse celular aí, se eu te pegar filmando te levo preso. Tu não confia na Polícia não! Vocês só vão na ignorância"
Trecho da denúncia do MP

Ainda segundo testemunhas, Tarciano foi liberado e começou a se distanciar dos policiais que tinham abordado ele, mas, quando já se aproximava da saída do beco, foi atingido por um PM "surpreendendo os que ali se encontravam e especialmente a vítima que já havia sido liberada pela polícia".

 

 

 

Este conteúdo é útil para você?
Assuntos Relacionados