Decon vai investigar loja Zara por recusar atendimento a delegada negra e por código discriminatório

Investigação da Polícia Civil do Ceará descobriu que funcionários da Loja utilizavam política de vigilância e código de segurança cifrado (“Zara zerou”)

Escrito por Redação ,
delegada Ana Paula Barroso vítima de racismo na Zara
Legenda: Ana Paula Barroso é diretora adjunta do Departamento de Proteção aos Grupos Vulneráveis da PC-CE

O caso de racismo na loja Zara, dentro de um shopping de Fortaleza, continua a trazer repercussões para o estabelecimento. O Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (Decon), do Ministério Público do Ceará (MPCE), abriu investigação contra a Loja por ter se recusado a atender uma delegada negra e por se utilizar de um código discriminatório, o "Zara zerou".

O Procedimento Administrativo (PA) foi instaurado pelo Decon na última quinta-feira (28), segundo o MPCE. A Zara tem até dez dias úteis, contados do dia 28 – data em que foi notificada -, para apresentar esclarecimentos por possível violação ao Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Investigação da Polícia Civil do Ceará (PCCE) descobriu que funcionários da Loja Zara utilizavam política de vigilância e código de segurança cifrado (“Zara zerou”), ao identificaram clientes com estereótipos que não se enquadram no parâmetro exigido pela loja (clientes de tom de pele mais escuro, ou que usavam roupas mais simples, etc.). Foi o que aconteceu com a delegada da PCCE, Ana Paula Barroso, em 14 de setembro deste ano.

O Decon do Ceará pediu uma cópia do Inquérito à Polícia Civil, assim como o Decon do Pará, para investigar a mesma prática discriminatória naquele Estado. Em São Paulo, a Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor de São Paulo (Procon-SP) notificou a Loja para pedir explicações.

O MPCE destaca que o Código de Defesa do Consumidor considera "prática abusiva a segregação de pessoas somente com base em características físicas e/ou sociais, sem considerar qualquer outro fator daquele potencial consumidor, em detrimento de seu real poder de compra e direito de acesso ao estabelecimento. O CDC também proíbe o fornecedor de produtos e serviços de recusar atendimento às demandas dos consumidores, quando houver estoque disponível".

Quando não é permitida a liberdade de escolha e igualdade nas contratações a determinado grupo de clientes, segundo o Código de Defesa do Consumidor, ocorre prejuízo a direitos básicos dos consumidores previstos na lei.”
Hugo Xerez
Promotor de Justiça e secretário-executivo do Decon

Ainda conforme o Decon, mesmo que a ação tenha sido exercida por funcionários da Loja Zara, o estabelecimento torna-se responsável pelos atos destes. O gerente da Zara, o português Bruno Filipe Simões Antônio, de 32 anos, foi indiciado pela Polícia Civil por racismo, contra a delegada.

Em nota, a Zara Brasil "nega a existência de um suposto 'código interno' para discriminar clientes. A Zara rechaça qualquer forma de racismo, que deve ser tratado com a máxima seriedade em todos os âmbitos".   

 

A Zara Brasil conta com mais de 1800 pessoas de diversas raças e etnias, identidades de gênero, orientação sexual, religião e cultura. Zara é uma empresa que não tolera nenhum tipo de discriminação e para a qual a diversidade, a multiculturalidade e o respeito são valores inerentes e inseparáveis da cultura corporativa."
Zara Brasil
Em nota

Veja também

Relembre o caso

Diretora adjunta do Departamento de Proteção aos Grupos Vulneráveis (DPGV), Ana Paula Barroso foi vítima de racismo ao ser barrada na entrada da Zara. O crime ocorreu no dia 14 de setembro em uma unidade da loja em um shopping do bairro Edson Queiroz, em Fortaleza. 

A delegada consumia um sorvete no momento em que chegou à loja. Um funcionário a impediu de permanecer no estabelecimento por "questões de segurança". Ela ainda questionou se a ordem teria sido motivada em função da sobremesa gelada, mas não teve retorno.

Sem resposta até então, Ana Paula saiu da loja e chamou um outro segurança e perguntou se o consumo do sorvete era um impedimento para o acesso. O homem afirmou que não e solicitou a presença do chefe de segurança do shopping. 

Este acabou reconhecendo a delegada porque já havia trabalhado com ela em outra oportunidade. Ana Paula foi novamente à loja acompanhada dos dois seguranças, e o funcionário que impediu de entrar adotou uma postura defensiva justificando não ter preconceito.

"Ele já foi logo dizendo que não tinha nenhum preconceito, que tinha várias amizades gays, lésbicas e trans. Quando ele fala isso, de forma velada, já mostra que tem preconceito. Essas declarações foram dadas no BOE e ratificadas pelo chefe da segurança. Depois, ele pediu desculpa e ela saiu da loja extremamente abalada", disse Anna Nery.

A Zara foi alvo de um mandado de busca e apreensão no dia 19 de setembro após se recusar a entregar imagens do circuito interno de câmeras. Além disso, antes da representação judicial por parte da PC-CE, houve demora nos trâmites internos, como o tamanho dos arquivos. 

Somente no dia 20 de setembro, seis dias após o caso, a loja emitiu nota alegando que o impedimento à delegada não foi motivado por questões raciais, mas sim pelo fato de estar sem máscara enquanto tomava o sorvete.

Assuntos Relacionados