Ceará é o segundo estado do Brasil com mais mortes violentas entre crianças e jovens com 1.396 casos
A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social afirma que mantém estratégias de prevenção e repressão aos crimes
O Ceará é o segundo estado do Brasil com mais registros de mortes violentas de crianças e jovens, de 0 a 19 anos, ficando atrás apenas da Bahia. De 2021 a 2023 foram contabilizados 1.396 assassinatos no Estado, conforme a pesquisa 'Panorama da Violência Letal e Sexual Contra Crianças e Adolescentes no Brasil', do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), divulgada nesta terça-feira (13).
Dos 1.396 Crimes Violentos Letais e Intencionais (CVLIs), 99 foram em decorrência de intervenção policial. Por nota, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) disse que "com intuito de reforçar seu apoio ao combate a qualquer tipo de violência contra crianças e adolescentes, mantém, por meio de suas vinculadas, estratégias de prevenção e repressão aos crimes".
Apesar do índice elevado no período analisado, é possível perceber redução dos casos com o passar dos anos, no Ceará: 552 em 2021; 455 em 2022 e 389 ocorrências no ano passado.
"Em 2021, por sua vez, o Ceará destoava dos demais, com taxa de 22,5 por 100 mil, assumindo a liderança nacional na ausência dos dados da Bahia para aquele ano, mas teve uma queda de 29,5% entre 2021 e 2023"
Secretaria da Segurança Pública
Além do trabalho de campo das polícias Civil e Militar, e da Perícia Forense do Ceará (Pefoce), a SSPDS afirma que o Governo atua em outras frentes para combater o problema, como a entrega de 35 areninhas somente em 2024 e a construção de escolas em tempo integral.
"Em 2024, a rede pública estadual de ensino passou a contar com mais 80 Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EEMTI), elevando para 512 o número de unidades com a jornada ampliada, perfazendo o maior número de ampliação anual de escolas em tempo integral já anunciadas pelo Governo do Estado.
A SSPDS disse ainda que a Polícia Civil do Estado do Ceará (PCCE) conta com a Delegacia de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente (Dceca), unidade especializada localizada na Casa da Criança e do Adolescente, e dispõe também da Divisão de Proteção ao Estudante (Dipre), ligado ao Departamento de Proteção aos Grupos Vulneráveis (DPGV), que realiza palestras educativas.
Já na Polícia Militar do Ceará existe um trabalho feito pelo Grupo de Segurança Escolar (GSE), ligado ao Comando de Prevenção e Apoio às Comunidades (Copac), que realiza ações de prevenção aos crimes sexuais nas escolas. O Copac da PMCE ainda dispõe do Grupo de Apoio às Vítimas de Violência (Gavv), que acolhe e acompanha as vítimas de violência, de forma contínua.
"Na PMCE, os trabalhos também incluem ações desenvolvidas pelo Programa Educacional de Resistência às Drogas e a Violência (Proerd), vinculado à Coordenadoria de Gestão Interna do Ensino e Instrução (Cogei)".
Brasil
Somados os três anos, "cerca de 15 mil meninas e meninos de 0 a 19 anos foram mortos no Brasil", aponta a pesquisa.
Depois de Ceará e Bahia, os locais mais violentos para crianças e adolescentes são Rio de Janeiro (com 1.261 casos em três anos) e Pernambuco (1.375 registros de 2021 a 2023), de acordo com a publicação.
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O Unicef destaca que foram desconsiderados os dados de vítimas de Mortes Violentas Intencionais de idade zero dos estados de Minas Gerais, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Espírito Santo devido às inconsistências nas bases apresentadas.
A diretora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Samira Bueno, acrescenta ainda que as mortes de crianças até os 9 anos costumam acontecer no ambiente familiar e que, no Brasil, 92% dos adolescentes assassinados são vítimas do sexo masculino.
POLÍTICAS PÚBLICAS
Conforme a pesquisa, a maioria das vítimas no Ceará e na Bahia têm de 10 a 19 anos, o que "alerta para a urgência de priorizar políticas públicas voltadas ao tema".
Rui Aguiar, chefe do escritório do Unicef no Ceará, diz que desde 2017 "muitas políticas públicas foram criadas", mas que, na prática, ainda esbarram na ausência da responsabilização do agressor junto à retaguarda dos programas sociais e comunitários.
"Não são violências relacionadas só aos crimes organizados, mas também à violência doméstica. É preciso que a prevenção aconteça a partir de programas sociais de atenção básica. Hoje o principal desafio está na escuta das vítimas. Unicef está acompanhando a implementação da lei da escuta para não revitimizar"
CRIMES SEXUAIS
O relatório também chama a atenção para casos de violência sexual contra crianças e adolescentes. Nos últimos três anos, 165 mil ocorrências foram reportadas às autoridades no Brasil.
Em 2023, o número chegou ao equivalente a uma criança ou adolescente vítima de estupro a cada 8 minutos.
No Ceará, de 2021 a 2023, foram 4.609 crimes de estupro contabilizados para a faixa-etária de 0 a 19 anos. O Estado fica atrás de Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Paraná, Pará, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo.
Neste tipo de crime predominam as vítimas do sexo feminino. O número pode ser ainda maior. Rui Aguiar alerta ainda para a possibilidade de subnotificação nos registros.
Sobre os agressores, consta na pesquisa que "são pessoas conhecidas as maiores responsáveis pelos crimes de estupro, mesmo entre adolescentes".
A Secretaria da Segurança Pública informou que a Pefoce conta com o Núcleo de Atendimento Especial à Mulher, Criança e Adolescente (Namca), destinado às vítimas de crimes sexuais, "com espaço humanizado para o acolhimento durante a realização de exames pertinentes ao delito, e o do Núcleo de Atendimento à Vítima (NAV), sendo que o último é instalado na Casa da Criança e do Adolescente, em Fortaleza. O local atende crianças e adolescentes vítimas de violência sexual e realiza as demais perícias médicas e coletas necessárias para as investigações".
A SSPDS afirmou ainda que, em maio deste ano, as Forças de Segurança do Ceará participaram da operação “Caminhos Seguros". Durante a ofensiva, coordenada em âmbito nacional, pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), foram realizadas 108 capturas em todo o Estado, relacionadas aos crimes de abuso e exploração sexual contra crianças e adolescentes.
"Se já é preocupante que a violência sexual contra crianças e adolescentes seja um crime majoritariamente doméstico, quando observamos que a imensa maioria dos autores são pessoas conhecidas, o quadro se agrava ainda mais. Entre as crianças de até 9 anos – assim como ocorre com as mortes violentas –, são autores conhecidos os principais algozes da violência sexual. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2024) mostrou que familiares como avôs, padrastos, tios e outras pessoas do relacionamento destas crianças, majoritariamente do sexo masculino, são os principais agressores"
Conforme o Unicef e o Fórum, "há medidas fundamentais que precisam ser priorizadas no país, com foco em prevenir atos de violência letal e sexual contra crianças e adolescentes, e em dar respostas a esses crimes. Essas respostas pressupõem um olhar específico para diferentes formas de violência, assim como da relação entre elas, considerando marcadores de idade, raça e gênero, e outros que os registros sequer nos permitem aprofundar no momento, como a presença de deficiência".
VEJA LISTA DE RECOMENDAÇÕES DO UNICEF E DO FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA:
- Não justificar nem banalizar a violência
- Controle do uso da força pelas polícias
- Controle do uso de armamento bélico por civis
- Pautar e enfrentar o racismo estrutural
- Compreender e enfrentar o fenômeno da violência doméstica contra as crianças
- Enfrentar normas restritivas e discriminatórias de gênero, com destaque para o trabalho com as famílias nos diferentes serviços e para o papel da escola
- Garantir atenção adequada aos casos de violência, no marco da Lei 13.431/2017
- Capacitar os profissionais que trabalham com crianças e adolescentes
- Ampliar o acesso de crianças e adolescentes sobre direito à proteção e canais/serviços de proteção
- Melhorar os registros, investir no monitoramento e na geração de evidências
O QUE DISSE A SSPDS SOBRE AS POLÍTICAS PÚBLICAS:
"A Polícia Civil do Estado do Ceará (PCCE), além de contar com a Delegacia de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente (Dceca), unidade especializada localizada na Casa da Criança e do Adolescente, dispõe da Divisão de Proteção ao Estudante (Dipre), ligado ao Departamento de Proteção aos Grupos Vulneráveis (DPGV), que realiza palestras educativas. Somente entre maio e junho de 2024, 41 escolas e 8.992 estudantes participaram de palestras e outras atividades, com a finalidade de fomentar discussões para a promoção de uma sociedade pacífica e solidária. Em 2023, 114 unidades escolares receberam as ações. Enquanto em Fortaleza, os registros de ocorrência e investigações são conduzidas pela Dceca, no interior do Ceará, são realizadas pelas unidades regionais e municipais"
"No âmbito da Polícia Militar do Ceará (PMCE), o Grupo de Segurança Escolar (GSE), ligado ao Comando de Prevenção e Apoio às Comunidades (Copac), realiza ações de prevenção aos crimes sexuais nas escolas. O Copac da PMCE ainda dispõe do Grupo de Apoio às Vítimas de Violência (Gavv), que acolhe e acompanha as vítimas de violência, de forma contínua. Na PMCE, os trabalhos também incluem ações desenvolvidas pelo Programa Educacional de Resistência às Drogas e a Violência (Proerd), vinculado à Coordenadoria de Gestão Interna do Ensino e Instrução (Cogei)".
"Há, ainda, um Grupo de Despacho do Copac (GD-Copac) da PMCE, na Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops) da SSPDS, que funciona desde janeiro de 2023. O serviço garante um atendimento diferenciado já na ligação para o Disque 190. Quando uma vítima ou terceiros fazem uma ligação denunciando a situação de violência contra integrantes dos grupos vulneráveis, uma cópia do registro é encaminhada para o Copac, que envia uma equipe do Gavv, um dos núcleos do policiamento especializado, para acompanhar a situação."
"A Perícia Forense do Estado do Ceará (Pefoce) conta com o Núcleo de Atendimento Especial à Mulher, Criança e Adolescente (Namca), serviço destinado às vítimas de crimes sexuais, com espaço humanizado para o acolhimento durante a realização de exames pertinentes ao delito, e o do Núcleo de Atendimento à Vítima (NAV), sendo que o último é instalado na Casa da Criança e do Adolescente, em Fortaleza. O local atende crianças e adolescentes vítimas de violência sexual e realiza as demais perícias médicas e coletas necessárias para as investigações."
"A SSPDS destaca ainda que, em maio deste ano, as Forças de Segurança do Ceará participaram da operação “Caminhos Seguros". A ofensiva foi coordenada, em âmbito nacional, pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP). No Ceará, foi coordenada pela Coordenadoria de Planejamento Operacional (Copol/SSPDS). Durante a ofensiva, foram realizadas 108 capturas em todo o Estado, relacionadas aos crimes de abuso e exploração sexual contra crianças e adolescentes."
"Em conjunto ao trabalho da segurança pública, visando ações voltadas para crianças e adolescentes, existem outras iniciativas promovidas pelo Governo do Ceará, com foco na prevenção da violência, como a entrega de 35 areninhas somente em 2024. Com as entregas, já são 375 areninhas em todo o Estado, sendo 260 construídas no Interior e 115 na Capital."
"Além disso, em 2024, a rede pública estadual de ensino passou a contar com mais 80 Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EEMTI), elevando para 512 o número de unidades com a jornada ampliada, perfazendo o maior número de ampliação anual de escolas em tempo integral já anunciadas pelo Governo do Estado. O Ceará já conta com escolas nesse modelo em 166 municípios. Com o resultado, o ensino integral vem sendo ofertado para 177.872 jovens em todo território cearense. A meta é garantir a universalização deste modelo de ensino, que é referência em todo o país, na rede pública estadual até 2026."