Caso Jamile: processo tem reviravolta e Ministério Público denuncia advogado por feminicídio

Vinte meses após a morte de Jamile de Oliveira Correia, o MPCE acusou Aldemir Pessoa Júnior de ter matado a então namorada. O disparo aconteceu dentro do closet da vítima

Escrito por Emanoela Campelo de Melo , emanoela.campelo@svm.com.br
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Legenda: À época do fato, amigos da empresária disseram que Jamile e Aldemir brigavam constantemente

O processo que apura a morte da empresária Jamile de Oliveira Correia passou por uma reviravolta. Na última sexta-feira (30), quase 20 meses após o fato, o Ministério Público do Ceará (MPCE) denunciou o advogado Aldemir Pessoa Júnior pelos crimes de feminicídio, lesão corporal, fraude processual e porte ilegal de arma de fogo.

A denúncia ocorre após o caso passar por diversas varas do Poder Judiciário do Ceará, ir ao 2º Grau do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), retornar à 1ª instância e até mesmo motivar divergência de pareceres entre integrantes do MPCE. Agora, para os representantes do órgão acusatório que atuam no âmibito da 4ª Vara do Júri, Jamile foi assassinada com um tiro pelo então namorado Aldemir. O fato aconteceu no closet do apartamento da vítima, no bairro Meireles, em Fortaleza.

Conforme a denúncia, o homicídio é qualificado por ter ficado configurado o feminicídio e ainda ter acontecido na presença do filho da vítima (art. 121, §2º, inciso VI, na forma do §2º-A, inciso I, §7º, inciso III, art. 18, inciso I), "restando adequado a causa de aumento de pena". A acusação de lesão corporal é devido, segundo ao MP, Aldemir ter agredido a namorada horas antes do disparo fatal.

Sobre a acusação de fraude processual, o órgão apontou que Aldemir tentou atrapalhar a investigação inovando "artificiosamente, em elementos probatórios e informativos". Um dos fatos recordados na denúncia foi o momento que o acusado deu ordens ao porteiro do prédio residencial para que o porteiro limpasse as manchas de sangue e que a diarista limpasse todo o apartamento.

O MP ainda ressaltou que Aldemir portou armas de fogo dentro e fora de casa, tendo guardado as pistolas na casa de uma terceira pessoa, e conduzido as armas consigo em "diversos momentos, como exemplo durante o socorro da vítima ao hospital".

Procurado pela reportagem, o advogado Flávio Jacinto, assistente de acusação, disse ainda não ter conhecimento sobre o teor da denúncia, e que deve se manifestar em breve. Já os advogados de defesa não atenderam as ligações até o fechamento desta matéria.

Investigação

Jamile foi levada pelo namorado e pelo filho ao Instituto Doutor José Frota (IJF), mas não resistiu aos ferimentos. Nas horas seguintes a morte da empresária, o caso foi tratado como um suicídio. Até aquele momento, Aldemir sustentava a versão que Jamile tinha atirado em si mesma ao pegar a arma de fogo dele instantes após uam discussão do casal.

Diante da violência protagonizada por Aldemir, a vítima portou-se quieta no closet, com a segunda arma do denunciado em punho, oportunidade em que foi vítima de mais uma agressão, momento em que Aldemir Pessoa (advogado experiente no manuseio de arma de fogo e praticante de tiro desportivo), com seu porte alto e forte, em um rápido ataque, puxou os cabelos de Jamile com uma mão, iniciando, com a vítima, uma disputa, circunstância em que o disparo foi efetuado , acertando Jamile na região precordial, de cima para baixo, e da esquerda para direita, conforme laudo cadavérico"
Ministério Público do Ceará

Quando o fato chegou ao conhecimento da Polícia Civil do Ceará, por meio do 2º Distrito Policial (Aldeota), o caso teve a sua primeira reviravolta. A tese do feminicídio passou a ser considerada pelos investigadores comandados pela delegada Socorro Portela, e o adjunto da distrital Felipe Porto, No segundo depoimento prestado pelo adolescente ele contradisse o que havia relatado de início.

As primeiras imagens da vítima sendo socorrida intrigaram a família de Jamile. Nas cenas gravadas pelas câmeras de segurança do prédio da empresária o adolescente está visivelmente desesperado, enquanto "chegando ao elevador, o acusado pegou o corpo da vítima por um braço e uma perna, tornando-a ao chão, não mostrando qualquer preocupação com situação", de acordo com o MP.

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Legenda: O adolescente filha da vítima participou da reprodução simulada dos fatos
Foto: Camila Lima

Perícias

Na versão de Aldemir, ele não assassinou a namorada, e sim, ela efetuou o disparo contra si. Em setembro de 2019, um dos laudos da Perícia Forense do Estado do Ceará (Pefoce) com análise das amostras de DNA encontradas na arma de fogo de onde veio o disparo que matou a empresária cearense Jamile de Oliveira Correia desconstruiu a versão do advogado.

O resultado da perícia apontou que o DNA da empresária só foi encontrado na extremidade do cano da pistola calibre 380. De acordo com o laudo, no restante da arma foram encontrados material genético de Aldemir e do policial civil responsável por apreender o objeto parte da investigação.

No fim de setembro aconteceu a reprodução simulada dos fatos. O adolescente filho de Jamile participou da reconstituição, mas Aldemir não. Para o Ministério Público, "levando-se em consideração tudo apresentado na presente peça processual, bem como o comportamento do réu durante toda a investigação, a dúvida que resta é se, quando do novo ataque proferido por Aldemir, dentro do closet, ele agiu com dolo direto ou eventual em gerar a morte da vítima, não restando dúvida, pois, da existência do dolo". 

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