Caso Alana: TJCE manda empresário a Júri, mas defesa afirma que decisão fere jurisprudência do STJ

Desembargadores do Tribunal de Justiça do Ceará determinaram que o réu seja julgado pelo Tribunal Popular do Júri, mas a defesa do empresário vai recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde espera reformar a decisão.

Escrito por Redação ,
Estudante Alana
Legenda: A estudante morreu após ser atingida por um disparo fatal, no dia 21 de março de 2021
Foto: Arquivo Pessoal

O Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) negou um recurso da defesa de David Brito de Farias e manteve a decisão da Primeira Instância de levar o empresário a júri popular pelo homicídio com dolo eventual (quando a pessoa não tem intenção de causar o resultado morte, contudo assume o risco de produzi-lo) da estudante Alana Beatriz Nascimento de Oliveira, em sessão realizada na tarde desta quarta-feira (22). A jovem foi morta dentro da residência do réu, em Fortaleza, no dia 21 de março de 2021. 

Os integrantes da 2ª Câmara Criminal do TJCE, desembargador Sergio Parente e desembargadora Ilna de Castro, acompanharam o relator do caso, Benedito Helder Ibiapina, para rejeitarem o Recurso em Sentido Estrito, interposto pela defesa do réu no dia 3 de maio último.

O advogado Leandro Vasques realizou sustentação oral durante a sessão. Ele representa a defesa de David de Farias, juntamente com o advogado Holanda Segundo. Após a decisão, Vasques afirmou que "lamentavelmente, a 2ª Câmara Criminal do TJCE preferiu o caminho cômodo da invocação do brocardo “in dubio pro societate”, em uma resistência incompreensível em aplicar a mais atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que repele a utilização desse argumento, absolutamente incompatível com a Constituição".

Segundo Vasques, David não quis ceifar a vida da vítima. "Houve uma fatalidade, reconhecida por experts e peritos que prestaram depoimentos, tratando que o disparo foi involuntário".

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O procurador de Justiça Bruno Costa se posicionou contra os pedidos da defesa do acusado e a favor de manter a pronúncia pelo crime de homicídio por dolo eventual - quando se assume o risco de matar. O desembargador Benedito Helder Ibiapina, por sua vez, entendeu que o Recurso em Sentido Estrito não deveria prosperar e manteve a decisão de 1ª Instância, que determinou que o réu seja julgado pelo Tribunal Popular do Júri, inalterada. 

A assistência da acusação, feita pelo advogado Daniel Queiroz, não fez sustentação oral na sessão. Ele afirmou que a "decisão de hoje, proferida pelo colegiado de Desembargadores que compõem 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Ceará, reafirmou a justa decisão proferida pelo juízo de primeira instância, mantendo a pronúncia do Réu, que deverá ser submetido ao Conselho de Sentença, em breve.”

Dessa forma, não havendo comprovação inequívoca quanto à ausência da intenção de matar, não há como acolher a pretensão recursal de desclassificação para o delito de homicídio culposo. Cabe esclarecer, entretanto, que não existe óbice para que tal matéria possa ser melhor analisada pelo Conselho de Sentença que, porventura, poderá resolver pelo seu acolhimento ou não, bem como, após análise apurada da 'quaestio', atender ao pedido da defesa pela desclassificação do crime em comento."
Benedito Helder Ibiapina
Desembargador, em decisão

A defesa de David Brito de Farias, representada pelos advogados Leandro Vasques e Holanda Segundo, prometeu recorrer da decisão ao Superior Tribunal de Justiça: "Respeitamos a decisão do TJCE, mas tão logo seja publicada, oporemos embargos e dela recorremos ao Superior Tribunal de Justiça, acreditando na desclassificação do suposto crime para a sua modalidade culposa. Os embargos de declaração possuem efeito suspensivo e, portanto, não há nenhuma previsão de submissão do réu a Júri, pois confiamos também que o STJ, em Brasília, poderá reformar a decisão do TJCE".

vasques
Legenda: O advogado Leandro Vasques realizou sustentação oral durante a sessão. Ele representa a defesa de David de Farias, juntamente com o advogado Holanda Segundo

Em notícia publicada no site do STJ, em outubro deste ano, a Quinta Turma da Corte Superior decidiu que, "havendo dúvida sobre a submissão do réu ao tribunal do júri, é possível aplicar o preceito in dubio pro societate em relação à materialidade do crime e aos indícios de autoria; tal preceito, porém, não deve prevalecer quanto ao elemento subjetivo – ou seja, à definição sobre a conduta do réu ter sido dolosa ou culposa".

Relembre o Caso Alana

David Brito de Farias realizou uma festa para assistir uma 'live' musical, na sua residência, na noite de 20 de março de 2021, e convidou amigos, que por sua vez levaram outras pessoas - inclusive Alana Beatriz Nascimento de Oliveira.

De acordo com testemunhas, David e Alana ficaram juntos naquela noite e a jovem dormiu na residência. No dia seguinte, depois que a maioria dos convidados deixou o local, um tiro foi disparado e atingiu Alana na testa. A jovem morreu no local.

A Perícia Forense (Pefoce) concluiu que o disparo foi involuntário e realizado de baixo para cima. Conforme a defesa, David se abaixou para desarmar a pistola e a arma disparou.  

Vídeos obtidos pelo Diário do Nordeste mostraram uma intensa movimentação na casa, após o tiro ser efetuado. As imagens mostram o empresário deixando o local e um espaço de tempo de ao menos 1h10min sem a jovem ser socorrida.

A defesa do réu destaca ainda que não houve falta de socorro, porque a morte de Alana foi imediata e David deixou a residência pensando em tirar a própria vida. "Tudo filmado e registrado nas câmeras e dentro do processo. Inclusive, registros de ligação para o Samu por diversas vezes e a única demora, de 40 minutos, se deu pela não disponibilidade de ambulância, que foi providenciada depois", alegou.

David de Farias foi denunciado pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) e virou réu na Justiça por homicídio por dolo eventual (quando a pessoa não tem intenção de causar o resultado morte, contudo assume o risco de produzi-lo). A defesa, por sua vez, sustenta que o cliente seja julgado por homicídio culposo e garante que o tiro foi efetuado de forma involuntária, como atestou a Pefoce.

Confira a nota da defesa do réu na íntegra:

"Respeitamos a decisão do TJCE, mas tão logo seja publicada, oporemos embargos e dela recorremos ao Superior Tribunal de Justiça, acreditando na desclassificação do suposto crime para a sua modalidade culposa.

Os embargos de declaração possuem efeito suspensivo e, portanto não há nenhuma previsão de submissão do réu a Juri, pois confiamos também que o STJ, em Brasília, poderá reformar a decisão do TJCE.

Lamentavelmente, a 2ª Câmara Criminal do TJCE preferiu o caminho cômodo da invocação do brocardo “in dubio pro societate”, em uma resistência incompreensível em aplicar a mais atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que repele a utilização desse argumento, absolutamente incompatível com a Constituição.

Davi não quis ceifar a vida da vítima. Houve uma fatalidade, reconhecida por experts e peritos que prestaram depoimentos, tratando que o disparo foi involuntário.

Neste caso, em específico, que motivo teria o empresário David em tirar propositadamente a vida da jovem Alana, que havia conhecido naquela mesma noite? Eis uma pergunta que permanece sem resposta e não enfrentada pela decisão que o envia a Juri.

O empresário Davi não possui nenhum histórico de agressividade, um passado sem nódoa e não mantinha nenhum relacionamento com a vítima que, inclusive, a tinha conhecido naquela noite, horas antes, inexistindo qualquer animosidade, rusga ou desentendimento entre eles. 

Sabemos que é difícil aceitar, mas estamos diante de um trágico acidente por imperícia no manuseio de uma arma que havia sido adquirida pelo acusado Davi há 8 dias do fato e que nunca havia feito uso da mesma. E registre-se que o Sr Davi não era atirador, como levianamente se quis sugerir. Ele apenas tinha feito um curso que a legislação brasileira exige para poder adquirir uma arma, um curso que qualquer um de nós precisa se submeter se acaso desejar comprar uma arma de fogo. O Sr Davi não era praticante de tiro. 
Está claro como a luz solar que estamos diante de um acidente com a arma. Frise-se, o acusado não possuía razões para ceifar a vida da jovem Alana e lamenta profundamente o evento.

Buscaremos uma apreciação justa e equilibrada dos fatos pelo STJ e confiamos que haverá reforma da decisão do Tribunal de Justiça do Ceará." - Advogados Leandro Vasques e Holanda Segundo. 

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