Doença pouco conhecida ameaça rebanho bovino no Ceará
Especialistas avaliam que o maior desafio para combater a tripanossomose é o diagnóstico correto da doença, ainda desconhecida entre produtores. De acordo com veterinários, o causador da doença não ameaça a saúde humana
O risco é silencioso e real, apontam especialistas em bovinocultura. O Trypanossoma vivax, um protozoário responsável pela tripanossomose, enfermidade que afeta as células vermelhas do sangue, provocando anemia e outros sintomas, vem gerando diversos prejuízos em rebanhos no Ceará.
"Animais estão morrendo e muitos proprietários desconhecem a verdadeira causa. Essa doença já matou milhares no Brasil e dizimou rebanhos inteiros na África", aponta o médico veterinário Kolowiskys Dantas, preocupado com o avanço da doença. Ele é o secretário de Desenvolvimento Agropecuário de Quixeramobim, onde está concentrada a maior bacia leiteira do Ceará.
Os levantamentos, iniciados há 10 meses, pelo médico veterinário Manoel Carneiro, revelam prevalência de 73% de rebanhos que já tiveram contato com a tripanossomose. Os exames, realizados no laboratório das Faculdades Associadas de Uberaba (Fazu), em Minas Gerais, apontaram 38% dos animais avaliados como soropositivos. Ele alerta que em todas as regiões do Estado foram observados desafios com essa enfermidade. No Ceará, de acordo com a Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Ceará (Adagri), ainda não há um levamento específico sobre mortes causadas pelo protozoário.
Cuidados
O maior entrave para frear a doença, conforme Manoel Carneiro, é a desinformação dos produtores e técnicos rurais. "O diagnóstico correto não é realizado e a fazenda acaba convivendo com o problema por anos, somando diversos prejuízos associados à mortalidade, como a redução do desempenho produtivo, reprodutivo e comorbidades associadas ao baixo desempenho do sistema imunológico do animal afetado", observa .
Diversos fatores epidemiológicos favorecem a introdução e disseminação da tripanossomose no rebanho. Dentre eles estão a compra indiscriminada de animais sem um controle sanitário adequado, a presença dos vetores da doença - moscas hematófagas - e ainda o uso de agulhas e seringas compartilhadas entre animais.
Dedicado à pecuária leiteira há 30 anos, o produtor Francisco Moura Teixeira enfrenta a tripanossomose bovina na sua propriedade.
"Comecei a perder meus animais da noite para o dia", diz. Em menos de um mês, 14 vacas leiteiras morreram. A causa das mortes até então não tinham sido detectadas até que Manoel Carneiro solicitou o encaminhamento de amostras de sangue de outros animais do rebanho para exame no laboratório mineiro. "Para mim foi uma surpresa. Eu nunca tinha ouvido falar nessa doença. Os animais iam continuar morrendo e a dúvida do diagnóstico real continuaria. Trata-se de um problema tão grave que minhas vacas não estão mais reproduzindo", relata.
Essa também é a realidade enfrentada por muitos produtores de Quixeramobim. A perda de animais está aumentando na maioria das propriedades, assegura o secretário de Desenvolvimento Agrário do Município.
"Já iniciamos uma campanha alertando sobre a necessidade do tratamento coletivo", pontua. A Secretaria Municipal está disponibilizando uma equipe com 22 profissionais para dar assistência aos criadores, incluindo médico veterinário, dois agrônomos e técnicos rurais.
O tratamento é fácil. O proprietário do animal precisa adquirir o medicamento. O custo por animal não é superior a R$ 25 por vacina. No total, são necessárias de três a quatro doses por ano.
Controle
De acordo com o diretor de Sanidade Animal da Adagri, Amorim Sobreira, a doença não atinge seres humanos e não causa impacto econômico elevado para o Estado. "Cabe ao criador aplicar boas práticas de manejo, como evitar a utilização de seringas em mais de um animal, e na reposição do seu rebanho comprar gado de procedência", ressalta.
Representante do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Ceará (CRMV-CE), Salette Santiago, secretária-geral do órgão, adverte que é "necessário adotar medidas de biosseguridade para erradicar a ameaça.
A divulgação entre os profissionais e produtores e campanhas de educação sanitária podem ajudar", destaca Salette Santiago.