Um em cada três jovens cearenses não trabalha nem estuda 

Mulheres e negros são os mais afetados pela falta de estudos, segundo o IBGE. Especialistas atribuem mudança à crise econômica e a fatores sociais, como necessidade de emprego ou de realização de atividades domésticas

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@diariodonordeste.com.br
Legenda: Mais de 30% da população cearense entre 15 e 29 anos não estuda nem está ocupada
Foto: José Leomar/Diário do Nordeste

Um em cada três cearenses entre 15 e 29 anos não trabalha e nem frequenta escolas ou universidades, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) 2018, divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nessa faixa etária, 28,5% das pessoas não têm ocupação. Quando se adiciona o percentual de pessoas que trabalha, mas não estuda (33,2%), a taxa de cearenses fora de unidades de ensino chega a 61,7%.

Os índices negativos atingem principalmente mulheres e negros. A taxa de pessoas sem ocupação de trabalho ou estudo no Estado é de 34,6% entre as mulheres, e de 30% entre negros. Também aumentou o percentual desses grupos que apenas trabalham. Entre as mulheres, era de 23,7%, em 2016. No ano passado, a taxa cresceu para 26%. Já em relação a pretos e pardos, o dado passou de 32,3% para 33,7%.

O IBGE explica que cada grupo de jovens tem motivações diferentes para não seguir ampliando a qualificação. Entre os homens, a principal motivação é o trabalho ou a procura por emprego. Para as mulheres, além do trabalho, há necessidade de realizar afazeres domésticos e cuidado de pessoas.

Outras motivações importantes são o não interesse em estudar ou se qualificar – maior entre os homens e os grupos de instrução mais baixa –, segundo o Instituto, e a falta de recursos para pagar as despesas ligadas à educação.

Para Luizete Vicente, doutoranda em Comunicação e integrante do Grupo Negro Kalunga, não há como negar a influência do desemprego no Brasil, embora o Ceará não tenha grandes taxas. “Mas ele chega com mais força e rapidez para grupos minoritários: jovens, mulheres e negros”, observa a ativista. “Quando pensamos nos postos de trabalho, vemos que a qualificação é importante, mas o Estado brasileiro é muito defasado em políticas que ajudem no acesso à educação”.

Sobrecarga

A especialista lembra que os negros, mesmo tendo maior participação nas universidades – 8,8% de pretos e pardos completaram o Ensino Superior em 2018, contra 6,4%, em 2016 –, ainda precisam abandonar os estudos para buscar oportunidades de emprego. Já as mulheres, embora com vontade de estudar, precisam enfrentar jornadas que chegam a ser triplas: na escola ou universidade, no trabalho e dentro de casa. “Algumas chegam a ver na educação uma relação dolorosa, difícil, de desafio”, pontua.

No caso dos negros, Luizete recomenda que sejam criados caminhos para vencer o racismo estruturante e políticas afirmativas em todas as etapas de ensino, do fundamental ao superior, já que o gargalo começa desde cedo: no Ceará, 51,5% dos adultos negros com 25 anos ou mais – cerca de 2,1 milhões de pessoas – não têm instrução ou não concluíram o Ensino Fundamental. Entre os brancos, a mesma categoria contou 38%.

Mesmo trazendo necessidade de avanços, a Pnad Contínua também mostra que os cearenses estão cada vez mais escolarizados. A proporção de pessoas de 25 anos ou mais de idade que concluíram, pelo menos, o Ensino Médio, manteve uma trajetória de crescimento e alcançou 39%, em 2018. Porém, a população negra ainda fica abaixo dessa média, com 34,8%. 

Volta às aulas

Outro dado relevante é que a taxa de analfabetismo geral no Estado caiu de 15,2% para 13,3%, embora ainda seja alta principalmente entre negros (14,6%), homens (15%) e pessoas com mais de 60 anos de idade (36,9%). Quem não teve acesso ou deu continuidade aos estudos na idade adequada tem seu direito à educação garantido por meio da Educação de Jovens e Adultos (EJA).

De acordo com a Secretaria Estadual da Educação (Seduc), as matrículas na modalidade subiram de 64.950, em 2016, para 66.851, em 2018. No ano passado, 48.181 dos matriculados tinha de 15 a 30 anos, e outros 11.769, de 30 a 40 anos.

A orientadora da Célula de Educação de Jovens e Adultos e Ensino Médio Noturno da Seduc, Aparecida Prado, explica que a maioria das pessoas busca retomar os estudos após situações como gravidez ou trabalho. “Como elas já vêm com uma bagagem mais adulta, buscam uma inserção no mercado de trabalho. Temos o curso da EJA+Qualificação Profissional, que já tem mais de 80 turmas, para quem procura esse tipo de atendimento”, afirma, destacando que a taxa de abandono é muito pequena.
 

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