Ex-moradores do Lord Hotel aguardam reforma há 4 anos

Revitalização foi adiada devido ao interesse manifestado pela Câmara Municipal em ocupar o local

Escrito por
Vanessa Madeira - Repórter producaodiario@svm.com.br
Legenda: O edifício, construído em 1956 e tombado como patrimônio histórico do Município em 2006, foi desapropriado pelo Estado entre 2010 e 2011, mas, até agora, não houve nenhum trabalho de revitalização
Foto: Foto: Fernanda Siebra

Já se passaram quatro anos desde que dona Francisca e dona Ivoneide pisaram, pela última vez, no Lord Hotel. Últimas moradoras a saírem do prédio, desapropriado pelo Estado entre 2000 e 2011 para uma reforma que nunca aconteceu, as aposentadas vivem, hoje, a poucos metros do local que chamaram de casa por décadas e de onde saíram a contragosto, após perder a disputa com o poder público.

Nos últimos dias, ambas têm observado com expectativa a possibilidade de ver o antigo lar revitalizado e ocupado novamente. Construído em 1956 e tombado como patrimônio histórico do Município em 2006, o edifício é um dos cotados para abrigar a Câmara Municipal de Fortaleza, que pretende mudar de endereço e se instalar no Centro. A informação foi revelada no último dia 3, pelo presidente da Casa, Salmito Filho, mas a decisão só deve ser anunciada após consultas com a população e análise de outras propostas.

"Ainda passo por lá de vez em quando, mas tem aquele ar triste sem ninguém dentro. Seria bom levar a Câmara para lá. Pode ajudar a restaurar e preservar o prédio, que sempre foi muito bonito. Vai ser como colocar uma roupa nova nele", diz Francisca Soares de Sousa. Igualmente saudosa, Ivoneide Franco Marques também apoia o projeto. "Acho uma ideia muito boa. Pelo menos iria valorizar mais aquele pedaço ali, que ficou muito abandonado", opina.

As duas deixaram o prédio em 2011, quando já nada restava da imponência e da elegância do antigo hotel transformado em prédio residencial. Mais de dez anos após o início das desapropriações, quando cerca de 40 famílias receberam indenizações para sair do edifício, que passaria por uma reforma estrutural, elas continuaram resistindo, sozinhas, à mudança.

Depois da perda da madrinha, Francisca, agora com 74 anos de idade, morava por conta própria em um dos apartamentos desde os 19 anos. Na residência logo ao lado, Ivoneide, 77, dividia, há 32 anos, a casa com o marido e quatro filhos.

A relutância em deixar o prédio foi, em parte, pelo forte apego ao local. "Foi muito ruim sair de lá. Um lugar em que morei por anos, com muitos amigos, vizinhos que eram quase como da nossa família. A gente ia ao Theatro José de Alencar, conversava com as pessoas na praça. Era bom demais", diz Francisca.

No entanto, a luta das ex-moradoras também veio da insatisfação com os valores dos ressarcimentos oferecidos pelo Estado. Na época, muitos chegaram a procurar a Justiça para negociar uma indenização que correspondesse ao prejuízo. "O dinheiro que queriam dar não comprava nem uma casinha nos bairros mais distantes. Corremos atrás para ver se aumentavam, porque não dava mais para ficar lá. Começaram a reforma com a gente lá dentro. Era muita poeira, quebradeira", lembra Ivoneide. "Acabamos recebendo um valor que ainda não era suficiente, mas era um pouco melhor", diz.

Obras

A reforma do prédio nunca foi concluída. Segundo a Secretaria de Infraestrutura do Estado (Seinfra), as obras de reforço estrutural do edifício não foram finalizadas. Uma ordem de serviço para início do trabalho seria assinada neste mês, mas foi adiada em virtude da manifestação de interesse da Câmara em ocupar o local. A Pasta informou que aguarda o envio de um projeto de ocupação pela Casa. "Só depois de conhecimento dessa proposta é que os trabalhos poderão ser retomados, visto que o projeto poderá sofrer mudanças", afirma a assessoria da Seinfra.

Enquanto torcem pela recuperação do prédio, os ex-moradores vão se adaptando às novas casas. Francisca continua vivendo no Centro, assim como Ivoneide. Restaram apenas boas recordações e a amizade, que as duas ainda mantêm, mesmo afastadas. "A casa onde eu moro hoje não é tão boa quanto o apartamento de antes. Mas já me acostumei", avalia Francisca.

Ivoneide não esconde a vontade de voltar. "Toda vez que passo por lá, morro de saudade. Eu amava demais aquele lugar. Se pudesse, voltaria. Era isso que a gente esperava na época da desapropriação, que reformassem o prédio para continuar vivendo lá. Pena que não foi o que aconteceu", lamenta.