Entre corredores vazios, vigilante espera há mais de 600 dias por retorno de alunos ao IFCE

Eliete Vasconcelos estava acostumada à intensa movimentação do instituto, que tem 6,4 mil alunos matriculados, e agora convive com pátios e salas de aula desocupados

Escrito por Lucas Falconery , lucas.falconery@svm.com.br
Corredor vazio
Legenda: A rotatividade entre turnos e setores faz da Eliete personagem conhecida na instituição
Foto: Thiago Gadelha

Ao passar pela catraca, os corredores, antes ocupados por vozes de quem está no caminho até o diploma, estão silenciosos há mais de 600 dias no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), em Fortaleza. Lá, há seis anos Eliete Vasconcelos, 40, integra a equipe de vigilância onde agora torce pelo retorno de estudantes e professores com quem trocava conversas e mantinha laços de confiança no processo de formação profissional.

No IFCE, Campus Fortaleza, estão matriculados 6.423 estudantes neste semestre letivo e, desde 18 de março de 2020, o instituto não tem aulas presenciais.  A instituição oferece vagas no ensino médio, técnico e formações no ensino superior.

Desde de julho do ano passado, as aulas acontecem de forma virtual, mas um grupo de 26 concludentes deve voltar a frequentar o local para terminar as atividades em laboratórios.

“Eu saí de férias e a escola estava funcionando plenamente, mas quando eu retornei estava parada. Encontrei só a equipe de vigilância e foi um vazio muito grande, porque acabou aquele fluxo de gente”, lembra sobre março de 2020, quando as unidades de ensino fecharam.

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Eliete observa o pátio central vazio - bem diferente de quando a fila para o lanche ia de uma ponta à outra. Na piscina antes agitada por quem aprendia a nadar ou treinava para competições, agora há calmaria.

“Estamos na expectativa pelo retorno porque a gente sente falta. Apesar da gente trabalhar bastante quando os alunos estão aqui, é um trabalho satisfatório”, pondera.

Corredor
Legenda: Mesmo adaptada, Eliete destaca solidão da ausência dos estudantes
Foto: Thiago Gadelha

Entre as demandas da rotina anterior, a profissional da segurança também atuava como abrigo de vivências. “A gente guarda as histórias dos alunos, porque às vezes eles chegam para conversar, a gente acaba virando amigos deles”.

A vivacidade do local acontece porque “tem muito rodízio, a gente pega turmas dos três turnos, é muita gente”.

O olhar tímido de Eliete contrasta com a voz firme e a disposição para lidar com as demandas da instituição no que, nesse processo, tornou-se líder da equipe composta por 12 guardas. “Para mim é tranquilo, porque eu já conheço bem o sistema, as normas, e todo mundo é comprometido com o trabalho”, frisa.

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Da recepção aos departamentos estudantis, a vigilante forma vínculos também com os demais profissionais da educação. “Quando a gente fica um tempo em um setor, a gente meio que cria uma intimidade com os professores, estamos sempre abrindo salas e resolvendo coisas”.

Essa proximidade fica evidente quando, durante a entrevista, um membro da gestão escolar descobre sobre a reportagem enquanto passa no corredor e deixa um elogio. “Se eu tivesse 10 Elietes aqui eu não teria problema nenhum. Apesar de que ela vale por 10”.

Pátio
Legenda: Entre os intervalos, o burburinho das conversas e até músicas com violão faziam parte do cotidiano
Foto: Thiago Gadelha

Rotina ainda afetada pela pandemia

Entre a casa no bairro José Walter e a Avenida 13 de Maio, onde trabalha, são cerca de 15 km percorridos de ônibus na semana e de moto nos plantões. Eliete vive com o marido e a filha de 19 anos, estudante de Psicologia.

No cotidiano de 12h trabalhadas para 36h de intervalo, a vigilante ouve as conversas sobre engenharias, química, eletrônica, mas a área da informática é que desperta o desejo de dar continuidade à formação.

Eu deixei de estudar quando minha filha nasceu, já são praticamente 20 anos e retornar fica muito difícil, sempre fico adiando e acabo não fazendo
Eliete Vasconcelos
Líder da vigilância

Eliete atualmente acompanha a realização de fotos de formatura no Campus, mas já presenciou colações de grau e celebrações anteriores à pandemia. Durante as conclusões de curso, ela também percebe a participação da formação estudantil.

“Os alunos mesmo falam com a gente nesse sentido, a gente vira ‘tia’ de todo mundo, às vezes na rua eles reconhecem a gente e conversam. Ficamos com uma família”, reflete. Na sua análise, a instituição já está adequada para o retorno, pelo qual anseia, com segurança.

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