Após 40 anos, Parque do Cocó é regulamentado com 1.571 hectares
A principal área verde urbana do Ceará será transformada em unidade de proteção e terá normas específicas
O parque de fato agora é de direito. Quarenta anos após o histórico piquenique ecológico que reuniu intelectuais, estudantes e ambientalistas para protestar contra a instalação de um prédio público na atual área do Parque Adahil Barreto, no bairro São João do Tauape, o Parque do Cocó terá sua regulamentação poligonal definitiva.
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Seus 1.571 hectares, o que representa um pouco mais de 15 quilômetros quadrados, serão adequados como Unidade de Conservação de Proteção Integral segundo o Sistema Nacional (SNUC). A partir de agora, as centenas de plantas animais e ainda o próprio Rio Cocó terão, segundo o Governo do Estado, uma atenção especial dentro de normas específicas.
Presente nas lutas pela regulamentação da área verde, o então estudante e hoje secretário de Meio Ambiente, Artur Bruno, lembra que, a partir daquela ocupação, despertou-se para a necessidade de se construir um Parque Ecológico para proteger o verde da cidade e ainda fixar-se como um local de lazer.
Durante as últimas quatro décadas, governantes criaram diversos decretos, mas, sem uma regulamentação devida, a área verde foi diminuindo devido à ocupação de construtoras para elevação de prédios, assim como a diminuição por meio das queimadas que devastaram 20 hectares do Parque, segundo a Secretaria do Meio Ambiente (Sema).
Para chegar a um consenso, foi preciso a criação do Fórum Permanente pela Implantação do Parque do Cocó, que reuniu 25 representantes das mais diversas classes e poderes. Com o novo decreto, o Parque será um dos maiores da América Latina, ficando à frente do Ibirapuera, em São Paulo e o Central Park, em Nova Iorque.
Responsável por conduzir o Fórum, o procurador da República Alessander Sales, explica que a proposta a ser assinada nesse domingo foi fruto de dois anos de debates entre as 25 instituições, junto ao que já vinha sendo discutido há quatro décadas.
"Eu estou me sentindo muito feliz. Todos somaram esforços para construírem esta proposta, que ainda não é a ideal, mas é a que mais chega perto. Havia falta de diálogo, o MPF tinha uma visão como deveria ser, os empresários tinham outras, as comunidades outras. Daí entrava-se em litígio. Foi preciso definir o que cada um deveria fazer para entrarmos em um consenso", explica Sales. Do ponto de vista da área, o Parque do Cocó protege todo o Rio Cocó em Fortaleza, que tem 24 quilômetros de extensão. Para ser regulamentado, o Governo Federal fez um acordo com o Estado do Ceará para conceder o território.
"O governador Camilo Santana assinou um acordo de cooperação com a Secretaria de Patrimônio da União, em Brasília, onde a SPU terá algumas obrigações e nós teremos outras para que a cessão seja definitiva. Ela será por partes, porque nesta área tem alguns foreiros, pessoas que pagaram foro à União para explorar as salinas que existiam aqui", diz Artur.
O governo estadual também receberá o domínio das terras do Parque Adahil Barreto, que receberá uma atenção especial. "Na verdade a ideia do governador não é só regulamentar o Parque do Cocó, mas levar a urbanização. Se você deixa sem a urbanização dos seu limites, sem que a população se empodere, a tendência é que haja invasões, como acontece eventualmente hoje. O Parque Adahil Barreto é um dos espaços mais privilegiados do Cocó. Já tem uma boa estrutura. O Governo quer fazer esse espaço central nessa nova urbanização. Já que é um parque só, invés de ter um pedaço do Governo, um pedaço da Prefeitura, o objetivo é fazer um único Parque. O nosso desejo é que haja essa vontade", explica o prefeito Roberto Cláudio.
Morando próximo ao Parque do Cocó, o secretário da Sema afirma que apaixonou-se pela área. "Eu participo das lutas desde estudante. Como parlamentar, vereador, deputado estadual e federal fiz pronunciamentos e escrevi artigos. Eu entendi que era um das ações que qualquer governante teria que fazer. Quando o governador Camilo Santana me convidou para ser secretário e me deu essa missão de criar o Parque do Cocó, eu fui às nuvens porque eu defendo isto há 40 anos", relata.
Com a regulamentação, os desafios aumentam, entre eles a limpeza do Rio Cocó, que está totalmente poluído. Os 1.571 hectares sob a responsabilidade do Governo terão que ser regidos por um Plano de Manejo, documento que institui as normas do território. Logo após assinatura do decreto, já está pré-estabelecido um concurso de ideias para que especialistas proponham interferências na área. "O Cocó tem vida. Vamos cuidar antes que ele vire um Tietê", diz Artur Bruno.
Em defesa do Parque
Personagem importante na luta pela regulamentação poligonal do Parque Ecológico, o ambientalista João Saraiva lembra que o início das discussões em torno da demarcação da área verde se confunde com início das lutas em torno do desenvolvimento de uma cidade mais sustentável.
"A gente ficava atento a qualquer tipo de agressão, quando chegaram a fazer um loteamento na área do Parque, fomos para as ruas e conseguimos reverter esse quadro. Muitos diziam 'o mangue fede, temos que aterrar'", relembra Saraiva.
Para o ambientalista, a demora para a regulamentação também se deu à visão que investir em meio ambiente é gastar. "O Cocó é nosso Rio Amazonas. Se Fortaleza proporcionasse mais liberdade para rio, isto é, sem construções no seu caminho, a cidade teria menos problemas de drenagem", explica.
Responsável pela a administração do Parque do Cocó há pouco mais de dois anos, o gestor Paulo Lira, que é professor de Biologia, afirma que se sente privilegiado em receber este 'presente' para cuidar.
"Em São Paulo, as pessoas são quase empurradas para o Ibirapuera. Em Curitiba, o Parque Birigui é muito bonito. Em Fortaleza, é tradicional as pessoas pensarem somente nas praias. Mas a gente tem começado a mudar isto. No momento em que a população começa a ver que as praças e os parques têm segurança, têm opções de lazer e entretenimento, elas começam a vir. O Parque do Cocó é um bom exemplo disso", finaliza Paulo Lira.